Li no site “Terra Magazine” o seguinte texto de Antonio Corrêa de Lacerda. É professor-doutor do departamento de economia da PUC-SP e autor, entre outros livros, de "Globalização e Investimento Estrangeiro no Brasil" (Saraiva). Foi presidente do Cofecon e da SOBEET. No seu artigo a seguir transcrito, agradece o apoio do economista Alexandre da Silva de Oliveira na pesquisa dos dados:
“Na coluna anterior, Como a crise afeta o Brasil (18/09/08), discuti a importância das decisões da política econômica local. Nesta semana, o agravamento da crise oriunda do mercado sub-prime norte americano acirrou o debate sobre os possíveis impactos para a economia brasileira. A economia cada vez mais globalizada o efeito contágio entre os mercados se amplia. Além disso, na nossa experiência histórica, sempre que havia uma turbulência internacional, isso diretamente implicava instabilidade e um freio no crescimento do Brasil, com a assim chamada restrição externa ao crescimento.
No entanto, houve, nos últimos anos, uma expressiva melhora nas condições macroeconômicas. A economia brasileira está melhor preparada para enfrentar os desafios oriundos da turbulência global. Apesar disso, alguns impactos serão inevitáveis.
Vale uma primeira consideração a respeito da profundidade e extensão dessa crise. Ninguém sabe ao certo até que ponto a turbulência pode chegar, porque isso depende de vários fatores: qual o sucesso das medidas adotadas pelos governos e bancos centrais, como reagem empresários, consumidores e investidores, entre outras variáveis.
A economia não vive só de fatores concretos e objetivos, mas também de aspectos subjetivos e comportamentais - as expectativas.
A economia norte-americana goza do privilégio de ser emissora exclusiva do dólar, ainda a moeda de referência internacional que concentra cerca de 75% de todas as transações mundiais e em torno de 65% das reservas cambiais dos bancos centrais dos demais países, estimadas em US$ 7 trilhões. A despeito da crise, o dólar e os títulos emitidos pelo tesouro norte-americano seguem exercendo o papel de refúgio para as aplicações, até mesmo pela falta de alternativas. Isso significa um importante trunfo para a recuperação da crise norte-americana.
Outro fator importante é extraordinária capacidade de inovação das empresas e do mercado financeiro daquele país, o que também poderá amenizar e encurtar a instabilidade, dependendo ainda dos fatores já apontados.
O governo norte americano anunciou, no último fim de semana, o envio ao Congresso de um pacote equivalente a US$ 700 bilhões que seria responsável por adquirir créditos podres do mercado imobiliário. O objetivo é limpar os empréstimos de alto risco que não têm sido pagos por cerca de cinco milhões de mutuários norte-americanos e propiciar maior liquidez aos mercados financeiros.
No entanto, até lá, deve mesmo prevalecer a volatilidade dos mercados, o encurtamento e encarecimento do crédito e suas conseqüências sobre bancos e empresas, afetando a economia real. O crescimento dos países emergentes, embora em ritmo menor do que os anos recentes, deve também contribuir para amenizar os impactos negativos advindos das economias centrais.
O BRASIL DIANTE DA CRISE
Para o Brasil, a grande mudança estrutural veio da substancial diminuição da dependência do petróleo. Isso se deveu a um bem sucedido programa de ampliação da produção de petróleo, assim como a mudança na matriz energética, com a incorporação do etanol e outras energias renováveis. Nossa dependência de importação de petróleo, que era de 90% do consumo interno nos dois choques da década de 1970, foi reduzida a apenas 5% nos tempos atuais.
Outra mudança veio da diversificação dos destinos de exportações. O Brasil ainda exporta pouco para o seu porte e depende excessivamente de commodities. No entanto, um fator positivo é que houve uma significativa diversificação de destinos das exportações. Apenas 15% se destinam aos EUA, enquanto 25% vão para Europa, 20% América Latina e 15% para Ásia, destacando os principais. Bem ao contrário do México, que dirige 90% das vendas externas para o mercado norte-americano.
Há ainda mudanças estruturais da economia brasileira que passam por fundamentos macroeconômicos mais sólidos, em comparação a períodos recentes de crises. O crescimento do PIB se acelerou nos anos recentes atingindo o nível de 6,0% a.a. (primeiro semestre de 2008), ante o crescimento mais modesto de 2,5% (1998-2002), o que proporcionou a redução do desemprego de 12,5% para 8,5%, calcado no aumento dos investimentos de 17% para 19%.
Houve ainda, no mesmo período, uma melhora nas condições externas, com a reversão do déficit na balança comercial, de US$ 7 bilhões, para um superávit de US$ 29,8 bilhões, um aumento do nível de reservas internacionais, de US$ 45 bilhões para US$ 205,1 bilhões, e a redução da dívida externa (pública e privada) de 29% para 14% do PIB.
A melhora destes indicadores significa maior estabilidade macroeconômica e a redução da vulnerabilidade externa do país. Isso não nos torna imunes às crise, mas o Brasil está melhor preparado para enfrentar os efeitos dos desdobramentos da crise no mercado de subprime norte-americano.
Os impactos previstos para o Brasil incluem a depreciação relativa e controlada do real, o encarecimento e restrição de crédito externo, o que afetará potencialmente a capacidade de financiamento das empresas brasileira. Nas contas externas haverá uma diminuição potencial das exportações, decorrente desaceleração do crescimento, ou mesmo recessão, em alguns mercados, além da queda dos preços das commodities, que perfazem cerca de 60% das nossas exportações.
Controlar a inflação vai ficar mais fácil, por outro lado, e o crescimento não será interrompido, porém desacelerado (PIB de 5,0% em 2008 e 4% em 2009). Nas finanças, o efeito da crise se dará, como já ocorre, no mercado de capitais, com a reprecificação de ativos e nos fluxos de capitais.
A qualidade da gestão e a calibragem da política macroeconômica também serão determinantes, especialmente agora, diante dos desafios e incertezas advindas do quadro internacional”
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