sexta-feira, 14 de novembro de 2008

POR QUE O BRASIL VAI SUPERAR A CRISE

O blog “Óleo do Diabo”, do jornalista, escritor, editor e blogueiro Miguel do Rosário, ontem publicou o seguinte interessante texto:

“Até pouco tempo, eu trabalhava num site americano e ganhava 1.800 dólares por mês para escrever matérias em português e inglês. Sem muita paciência para ficar entrevistando as mesmas pessoas e ouvindo as mesmas ladainhas, desenvolvi o hábito de pesquisar e editar estatísticas. Fuçava sites oficiais do mundo inteiro, destrinchava-os, catava os números que precisava, diagramava em tabela do EXCEL e escrevia notinhas explicativas e análises sobre o que encontrava. A assinatura do site custava entre 2 e 3 mil dólares ao ano.

Pedi demissão, por motivos pessoais e profissionais que não vêm ao caso, e agora forneço o mesmo material, gratuitamente, para meus queridos leitores do blog. Os números que uso no artigo de hoje são atualizadíssimos. Foram, na verdade, atualizados hoje mesmo (12 de novembro) pelos técnicos da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX), órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

Os números referem-se ao acumulado de 12 meses de novembro do ano passado a outubro deste ano (Nov/Out), junto aos mesmos períodos comparativos de 2006/07 e 2001/02.

Publico duas tabelas [ver no Óleo do Diabo], a primeira com os principais destinos das exportações brasileiras, por bloco econômico; a segunda com uma lista dos principais produtos exportados pelo Brasil, para todo o mundo.

A primeira tabela mostra que o grupo intitulado Países em Desenvolvimento, que não inclui os países ricos, já é o principal destino das exportações brasileiras. Esse bloco, formado por nações latino-americanas, asiáticas, africanas e do leste europeu, importou US$ 99 bilhões do Brasil nos últimos 12 meses, o que significou aumento de 30% sobre o ano anterior, e de 348% sobre o mesmo período de 2001/02.

Ou seja, não é correto afirmar que as exportações brasileiras cresceram nos últimos anos, e sim que, literalmente, explodiram, e sobretudo para os mercados emergentes, de maneira que acho prematuro dizer que a crise financeira mundial irá afetar a economia brasileira. Pode haver retração de nossas vendas externas, e daí? Que representaria um pequeno recuo comparado a um aumento de 348%?

Para os analistas neoliberais, que ainda dominam a grande mídia, somente o crescimento constante do mundo pode trazer desenvolvimento. Eles não concebem que a distribuição mundial de renda é tão disparatada que, em verdade, o que o mundo precisa para se desenvolver é de mais distribuição e não exatamente crescimento.

Quando Miriam Leitão diz que o Brasil cresceu menos que a média mundial, ela omite que o Nordeste, a região mais pobre do país, cresceu a taxas anuais superiores a 10% nos últimos anos, e que as classes mais baixas também registraram crescimento muito acima da média nacional. Isso é que é importante e somente uma distribuição de renda mais justa pode trazer equilíbrio e estabilidade à economia global. Enquanto economistas, mandatários e jornalistas do mundo inteiro tecem elogios à maneira responsável e sustentável com que o Brasil conduziu sua política econômica nos últimos anos, não apenas procurando o crescimento, mas a distribuição de renda, o controle da inflação e a redução da vulnerabilidade externa, Miriam Leitão prossegue repetindo que o Brasil "perdeu" o bonde da história.

Provavelmente, ela tem saudades dos tempos em que nos humilhávamos perante autoridades do FMI.

Voltando à tabela, confiram que América Latina e Caribe importaram mais que os Estados Unidos e importaram mais que a União Européia.

Trata-se de uma reviravolta na política comercial brasileira. Em 2001/02, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso, as coisas eram bem diferentes. Éramos muito mais dependentes de poucos mercados. A União Européia respondia por 25,6% das exportações brasileiras, os EUA, por 26%. A União Européia não conta, porque de 2001 para cá, ganhou dezenas de novos membros – e mesmo assim a sua participação nas exportações brasileiras caiu para 23,9% em 2008 – sem que isso tenha afetado o desempenho do Brasil neste mercado, visto que nossas vendas para Europa cresceram 214% no período.

O exemplo dos EUA é mais ilustrativo. Em 2001/02 (nov/out), os Estados Unidos importaram US$ 15,32 bilhões em produtos brasileiros, que correspondeu a 26% de nossas exportações. Em 2007/08, apesar de ampliar suas compras em 84%, os EUA responderam por apenas 14% de nossa balança comercial.

Enquanto isso, o bloco América Latina e Caribe, que respondia por 19% em 2001, elevou sua participação para 25,8% em 2008.

Outro caso interessante. As exportações brasileiras para África cresceram 332% de 2001 a 2008. Eis aí uma boa resposta para aqueles que menosprezavam as investidas do governo brasileiro ao continente negro.

A mesma situação vale para o Mercosul, sistematicamente subestimado por nossos analistas econômicos neo-liberais. Nesses últimos 7 anos, as exportações brasileiras para os países do Mercosul cresceram 537%, alcançando US$ 22,07 bilhões. Nesse ritmo, nossos humildes vizinhos serão mais importantes, para nossas contas externas, que os EUA, em dois ou três anos, quiçá a partir do ano que vem. Fico pensando: estará Dona Miriam Leitão acompanhando esses dados? Que dirá ela quando o Mercosul for mais importante que os EUA para nossa balança comercial? Que editoriais serão escritos nos jornalões?

Há um fator que valoriza ainda mais o comércio intramercosul. Nossos vizinhos compram produtos mais caros, de maior valor agregado, do que as nações ricas. Em 2008, o Mercosul pagou um preço médio de US$ 13.147 por tonelada por produtos brasileiros, enquanto que os EUA, país mais rico do mundo, pagou US$ 9.825, e a União Européia, somente US$ 3.453! Ou seja, nossos hermanos estão comprando mais e adquirindo produtos mais caros, de maneira que a aposta feita no Mercosul pelo governo Lula foi acertada. Tivéssemos seguido a política neoliberal tucana e ingressado na ALCA, estaríamos - além de fodidos – tremendamente mal pagos.

Após o crash da bolsa de NY, em 1929, o Brasil sofreu terrivelmente, porque tínhamos uma economia inteiramente voltada à exportação de um único produto, o café, e para um único mercado, os Estados Unidos. A crise, contudo, foi extraordinariamente positiva para nós, do ponto-de-vista histórico, porque nos obrigou a superar a monocultura e a investir na industrialização e no consumo interno. A crise de 29, portanto, implicou numa reviravolta ideológica na política brasileira.

A crise financeira atual, igualmente está implicando numa reviravolta ideológica.

Mas no Brasil, ao que parece, elite e mídia ainda não entenderam o que está acontecendo. Hoje, no jornal O Globo, o mega-empresário Jorge Gerdau, quer dar lição de economia ao governo, afirmando que ele precisa conter gastos. É um conselho que vai na contra-mão de tudo que vem sendo falado em outros países. EUA e Europa não só deixaram de conter gastos, como reduziram juros e “doaram” trilhões de dólares para o setor financeiro. Aumentaram os gastos do Estado. Gerdau diz que o governo deveria reduzir gastos de funcionalismo e manter os investimentos. Claro, quer o governo dando dinheiro para empreiteiras grandes companhias e, ao mesmo tempo, desempregando milhares de pessoas. Gerdau prega o quê?

Quer que o governo, em meio a uma crise financeira internacional, promova demissões em massa do setor público?! É uma proposta criminosa! E nada mais é do que a mídia vem propondo, diariamente! A mídia brasileira quer sangue! Este é o tipo de notícia que soaria como música para os ouvidos de nossa elite egoísta: anúncios de demissão em massa! Não dá para acreditar! Um milionário paulista, enquanto toma champagne com seus amigos e manda seus empregados aprontarem o helicóptero para passar o final de semana em sua ilha particular, sugere ao governo que demita pais de família que não tem outra fonte de renda que não aquele caraminguá mixuruca de funcionário público?

A elite não é só egoísta, é burra, porque a saída súbita de um enorme contingente do mercado formal de trabalho geraria ainda mais pânico nos mercados, queda no consumo, recessão econômica.

Resultado: o governo teria que GASTAR mais para ajudar empresas e bancos. Roosevelt conseguiu tirar o país da recessão dos anos 30 depois que criou enormes frentes de trabalho, ou seja, depois que ampliou os gastos do Estado”.

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