segunda-feira, 25 de maio de 2009

UM SETOR QUE TUDO PODE

Li hoje no site Direto da Redação o seguinte artigo de Mário Augusto Jacobskind. O autor é correspondente do semanário uruguaio “Brecha”:

“A sociedade civil do continente está se aprofundando na questão da mídia e não aceita que os espaços midiáticos continuem sob o domínio absoluto de um patronato que tudo pode. No Brasil, o tema da democratização dos meios de comunicação está na ordem do dia. O patronato não aceita nem discutir e responde sempre com o argumento, confundindo liberdade de imprensa e expressão com liberdade de empresa.

Vale então o registro do que acabou de acontecer na Bolívia, até porque este tipo de informação dificilmente é divulgado nos espaços midiáticos conservadores. Por lá, o presidente Evo Morales aprovou decreto reservando espaços dos meios de comunicação para a livre opinião dos jornalistas e outros trabalhadores ligados a sindicatos de imprensa. O porta-voz da Presidência, Iván Canelas, revelou que todas as opiniões serão assinadas e os meios impressos deverão fornecer o mesmo espaço que se destina aos editoriais. No caso de rádios e televisões, serão disponibilizados três minutos para uso diário.

Alguém deve estar perguntando: mas quem garante que os profissionais de imprensa que emitirem opinião contrária ao da empresa não serão vítimas de represália? Prevendo essa possibilidade, o decreto proíbe qualquer ação repressiva contra quem expôs ponto de vista divergente ao da empresa onde trabalha.

Não será surpresa se o decreto for criticado pela Sociedade Interamericana de Imprensa, que certamente dirá que a liberdade de imprensa corre perigo na Bolívia. O patronato do setor tenta ignorar um fato concreto: proprietário de veículo de comunicação é diferente de um dono de fábrica de salsichas ou algo do gênero. Antes de o lucro contemplar os seus bolsos, os proprietários de jornais, televisões e rádios têm a obrigação de respeitar a opinião pública e aceitar a pluralidade. Não podem agir como se notícias fossem apenas mercadorias e está acabado.

O Equador é outro país em que a mídia está em debate. No Fórum Equatoriano da Comunicação diversas organizações sociais analisam a proposta de uma nova Lei de Comunicação, que será apreciada pela Assembléia Nacional, que terá até outubro próximo para aprovar uma nova legislação do setor.

O Fórum propõe, entre outras coisas, a divisão eqüitativa dos espaços midiáticos: 33% para os setores público, privado e comunitário. Não se surpreendam, portanto, se em breve a SIP, em parceria com a Organização dos Estados Americanos (OEA) voltar às baterias contra o Equador.

A Argentina também está discutindo uma nova legislação na área midiática. O governo de Cristina Kirchner, que recém enviou projeto para a discussão do tema no Congresso, vem sofrendo duras críticas dos setores conservadores, que se repetem nos diversos meios de comunicação do continente. Ou seja, mesma pauta, mesmos pontos de vista, mesmo tudo, para evitar questionamentos e impedir que a democracia avance nos espaços midiáticos.

No Brasil, o patronato está se armando para evitar que em dezembro próximo, quando será realizada a Conferência Nacional de Comunicação, haja um avanço no processo de democratização dos meios de comunicação.

Como por aqui a mídia hegemônica tudo pode, sem questionamentos, acabou de acontecer um fato lamentável, para variar envolvendo a Rede Globo. Num dos capítulos do seriado Força Tarefa foi abordado o tema milícia, tendo como cenário a comunidade de Rio das Pedras, controlada por paramilitares (milicianos) e teve como ator coadjuvante José Roberto Moreth, mais conhecido como Beto Bomba, no papel de corregedor. O “ator” da Globo, que também preside a Associação de Moradores de Rio das Pedras, foi apontado pelo relator da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, Deputado Marcelo Freixo, como uma das 225 pessoas envolvidas com as milícias. Beto Bomba está sendo investigado pelo Ministério Público e é acusado de homicídio e extorsão. A Globo ainda por cima desrespeitou a legislação que exige o registro profissional de ator.

Será que os responsáveis pelo seriado não sabiam disso? Ou será que como acreditam que a Rede Globo tudo pode, nada acontece, não tem problema algum transformar um marginal como Beto Bomba em ator.

Não é de hoje que a teledramaturgia da Rede Globo faz das suas. Na novela Duas Caras, escrita por Aguinaldo Silva, teve um personagem, Juvenal Portela, interpretado por Antonio Fagundes, que era miliciano. Aguinaldo possivelmente também se inspirou em Rio das Pedras, que na ficção era a Portelinha.

Por estas e muitas outras, os espaços midiáticos não podem agir como bem entendem, visando apenas a corrida desenfreada pelo ibope. E questionar isso não é censura, como muitas vezes acusam os barões da mídia e seus áulicos.”

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