terça-feira, 23 de junho de 2009

THIERRY MEYSSAN: A CIA E O LABORATÓRIO IRANIANO

“A notícia de uma possível fraude eleitoral espalhou-se em Teerã como um rastilho de pólvora e levou à rua os partidários do aiatolá Rafsanjani contra os do aiatolá Khamenei.

Este caos é provocado à socapa pela CIA, que semeia a confusão inundando os iranianos de mensagens SMS contraditórias. Aqui esta o relato desta experiência de guerra psicológica.

Em março de 2000 a secretária de Estado Madeleine Albright admitiu que a administração Eisenhower havia organizado uma mudança de regime no Irã, em 1953, e que este acontecimento histórico explica a hostilidade atual dos iranianos face aos Estados Unidos.

Na semana passada, aquando do seu discurso no Cairo dirigido aos muçulmanos, o presidente Obama reconheceu oficialmente que "em plena Guerra Fria os Estados Unidos desempenharam um papel na derrubada de um governo iraniano eleito democraticamente".

Na época, o Irã era controlado por uma monarquia de opereta dirigida pelo xá Mohammad Reza Pahlavi. Ele fora colocado no trono pelos britânicos, que haviam forçado o seu pai, o oficial cossaco pro-nazi Reza Pahlavi, a demitir-se. Contudo, o xá teve de ajustar-se a um primeiro-ministro nacionalista, Mohammad Mossadegh. Este, com a ajuda do aiatola Abou al-Qassem Kachani, nacionaliza os recursos petrolíferos. Furiosos, os britânicos convencem os Estados Unidos de que é preciso travar a deriva iraniana antes que o país afunde no comunismo.

A CIA põe então em ação a Operação Ajax visando derrubar Mossadegh, com a ajuda do xá, e substituí-lo pelo general nazi Fazlollah Zahedi, até então detido pelos britânicos. Ele instalará o regime de terror mais cruel daquela época, ao passo que o xá servirá de cobertura para as suas exacções posando para as revistas populares ocidentais.

A operação Ajax foi dirigida pelo arqueólogo Donald Wilber, pelo historiador Kermit Roosevelt (neto do presidente Theodore Roosevelt) e pelo general Norman Schwartzkopf (cujo filho homônimo comandou a operação Tempestade do Deserto). Ela permanece um modelo de subversão.

A CIA imagina um cenário que dá a impressão de um levantamento popular quando se trata de uma operação secreta. O auge do espectáculo foi uma manifestação em Teerã com 8.000 figurantes pagos pela Agência a fim de fornecer fotos convincentes à imprensa ocidental.

A história repetir-se-ia? Washington renunciou a atacar militarmente o Irã e dissuadiu Israel de tomar uma tal iniciativa. Para chegar a "mudar o regime", a administração Obama prefere jogar a carta — menos perigosa, mas mais aleatória — da ação secreta.

Após a eleição presidencial iraniana, vastas manifestações opuseram nas ruas de Teerã os partidários do presidente Mahmoud Ahmadinejad e do guia Ali Khamenei, de um lado, aos partidários do candidato perdedor Mir-Hossein Mussavi e do ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani do outro.

Elas traduziam uma profunda clivagem na sociedade iraniana entre um proletariado nacionalista e uma burguesia que lamenta ser mantida afastada da globalização econômica. Agindo debaixo do pano, Washington tenta pesar nos acontecimentos para remover o presidente eleito.

Mais uma vez, o Irã é um campo de experimentação de métodos inovadores de subversão. A CIA apoia-se numa arma nova: o domínio dos celulares.

Desde a generalização dos celulares, os serviços secretos anglo-saxões multiplicaram as suas capacidades de intercepção. Enquanto a escuta dos telefones por fio precisa da colocação de ganchos de derivação, portanto de agentes no local, a escuta dos portáteis pode ser feita à distância graças à rede Echelon.

Contudo, este sistema não permite intercepção das comunicações telefônicas via Skype, daí o êxito dos telefones Skype nas zonas de conflito.

A National Security Agency (NSA) acaba de fazer diligências junto aos fornecedores de acesso Internet do mundo inteiro para obter a sua colaboração. Aqueles que aceitaram foram muito bem pagos.

Nos países que ocupam — Iraque, Afeganistão e Paquistão —, os anglo-saxões interceptam a totalidade das conversações telefônicas quer seja emitidas por celulares ou por aparelhos com fio. A finalidade não é dispor de transcrições de tal ou tal conversação, mas identificar as "redes sociais".

Por outras palavras, os telefones são espiões que permitem saber com quem uma dada pessoa está em relação. Partindo daí, pode-se esperar identificar as redes de resistência. Num segundo tempo, os telefones permitem localizar os alvos identificados — e "neutralizá-los".

Eis porque, em fevereiro de 2008, os rebeldes afegãos ordenam às diversas operadoras para cessarem a sua atividade a cada dia das 17 horas às 3 da manhã, de maneira a impedir os anglo-saxões de seguirem os seus deslocamentos. As antenas daqueles que contrariaram esta ordem foram destruídas.

Inversamente, – exceto uma central telefônica atingida por erro –, as forças israelenses trataram de não bombardear as antenas de celulares em Gaza, aquando a operação Chumbo endurecido, em dezembro de 2008/janeiro de 2009. Trata-se de uma mudança completa de estratégia da parte dos ocidentais. Desde a guerra do Golfo prevalecia a "teoria dos cinco círculos" do coronel John A. Warden: o bombardeio das infraestruturas telefônicas era considerado como um objetivo estratégico tanto para mergulhar a população na confusão como para cortar as comunicações entre os centros de comando e os combatentes.

Doravante, é ao contrário: é preciso proteger as infraestruturas de telecomunicações. Durante os bombardeios de Gaza, a operadora Jawwal ofereceu crédito aos seus assinantes, oficialmente para ajudá-los, de fato no interesse dos israelenses.

Dando mais um passo, os serviços secretos anglo-saxões e israelenses desenvolveram métodos de guerra psicológica baseados na utilização extensa dos celulares. Em julho de 2008, após a troca de prisioneiros e feridos entre Israel e o Hezbolá, robôs lançaram dezenas de milhares de mensagens para celulares libaneses. Um voz em árabe advertia contra toda participação na Resistência e difamava o Hezbolá. O ministro libanês das telecomunicações, Jibran Bassil, apresentou uma queixa à ONU contra esta flagrante violação da soberania do país.

Com base no mesmo modelo, dezenas de milhares de libaneses e sírios receberam uma chamada automática em outubro de 2008 propondo-lhes 10 milhões de dólares contra toda informação que permitisse localizar e entregar soldados israelenses prisioneiros. As pessoas interessadas em colaborar eram convidadas a ligar para um número no Reino Unido.

Este método acaba de ser empregado no Irã para intoxicar a população difundindo notícias chocantes, e para canalizar o descontentamento que elas provocam.

Em primeiro lugar, trata-se de difundir por SMS durante a noite dos tumultos a notícia segundo a qual o Conselho dos Guardiões da Constituição (o equivalente ao Tribunal Constitucional) havia informado Mir-Hossein Mussavi da sua vitória. A partir daí, o anúncio, várias horas mais tarde, dos resultados oficiais — a reeleição de Mahmoud Ahmadinejad com 65% dos votos expressos — parecia uma fraude gigantesca. Entretanto, três dias antes, Mussavi e os seus amigos consideravam a vitória maciça de Ahmadinejad como certa e esforçavam-se por explicá-la pelos desequilíbrios na campanha eleitoral. Assim, o ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani pormenorizava as suas queixas numa carta aberta.

Os institutos de pesquisas dos EUA no Irã prognosticavam um avanço de 20 pontos percentuais de Ahmadinejad sobre Mussavi. Em momento algum a vitória Mussavi pareceu possível, mesmo sendo provável que fraudes tenham acentuado a margem entre os dois candidatos.

Num segundo tempo, foram seleccionados cidadãos, ou deram-se a conhecer na Internet, para conversar no Facebook ou assinar mensagens do Twitter. Eles receberam então, sempre por SMS, informações — verdadeiras ou falsas — sobre a evolução da crise política e as manifestações em curso. Eram mensagens anônimas que difundiam notícias de fuzilamentos e numerosos mortos; notícias até hoje não confirmadas. Por um infeliz azar de calendário, a sociedade Twitter devia suspender o seu serviço durante uma noite, o tempo necessário para a manutenção das suas instalações. Mas o Departamento de Estado dos Estados Unidos interveio para lhe pedir que adiasse esta operação. Segundo o New York Times, estas operações contribuem para semear a desconfiança na população [13] .

Simultaneamente, num esforço novo, a CIA mobiliza os militantes anti-iranianos nos EUA e no Reino Unidos para aumentar a desordem. Um "Guia Prático da Revolução" no Irã foi-lhes distribuído. Ele inclui vários conselhos práticos, tais como:
Acertar as contas Twitter no fuso horário de Teerã;

Centralizar as mensagens nas contas Twitter @stopAhmadi, #iranelection et #gr88;

Não atacar os sites oficiais do Estado iraniano. "Deixem isso para o exército dos EUA" (sic).

Uma vez aplicados, estes conselhos impedem toda autenticação das mensagens Twitter. Já não se pode saber se eles são enviados por testemunhas das manifestações em Teerã ou por agentes da CIA em Langley, e não se pode mais distinguir o verdadeiro do falso. O objetivo é criar cada vez mais confusão e levar os iranianos a lutarem entre si.

Os estados-maiores, por toda a parte do mundo, seguem com atenção os acontecimentos em Teerã. Cada um deles tenta avaliar a eficácia deste novo método de subversão no laboratório iraniano. É evidente que o processo de desestabilização funcionou. Mas não é seguro que a CIA possa canalizar os manifestantes para que eles façam por si mesmos aquilo que o Pentágono recusou fazer e que eles não têm qualquer vontade de fazer: mudar o regime, acabar com a revolução islâmica.”

FONTE: site “vermelho”, em 22/06/2009, que postou texto de Thierry Meyssan, escrito para o site “Rede Voltaire”.

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