“O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Embraer estão tomando medidas para fortalecer a cadeia de fornecedores da indústria aeronáutica, afetada pela crise econômica. A Embraer tem ações de curto prazo para ajudar os fornecedores a administrar eventuais dificuldades. Já o banco atua com um horizonte de mais longo prazo. A instituição quer ampliar o Pró-Aeronáutica, programa criado em 2007, com R$ 100 milhões, para apoiar investimentos de fornecedores da indústria até 2010. O objetivo é estimular a criação de novas empresas e ajudar as existentes a se capacitarem para inovar e fornecer peças e componentes para outros fabricantes de aeronaves além da Embraer.
Até o fim do ano, o Pró-Aeronáutica passará a financiar exportações de fornecedores do setor, além de continuar a apoiar investimentos para modernizar ou ampliar o parque produtivo. É tentativa de tornar os fornecedores aeronáuticos menos dependentes da Embraer. Em recente debate sobre inovação, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, disse que o banco está aumentando seu apoio aos fornecedores da Embraer porque está preocupado com a queda das encomendas da empresa.
Coutinho disse que a inovação é uma das prioridades do banco, que trabalha para reforçar o desenvolvimento de pesquisas de produtos nas cadeias industriais, como na aeronáutica. Ele reconhece que o país ainda não dispõe de grandes cadeias tecnológicas. "Esse é um desafio que exigirá anos de trabalho, não vamos chegar lá de um dia para o outro, mas precisamos dar a partida para reduzir a dependência externa."
O setor aeroespacial brasileiro, incluindo a Embraer e fornecedores, empregou 27,1 mil pessoas e faturou US$ 7,5 bilhões no ano passado, segundo dados da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB). As exportações somaram US$ 6,7 bilhões e a contribuição do segmento para o Produto Interno Bruto (PIB) foi de 2%, diz a AIAB. A entidade estima que outras pequenas e médias empresas fornecedoras de serviços aeronáuticos, não ligadas à associação, empreguem mais 4 mil pessoas.
No ano passado, 77 empresas brasileiras fornecedoras da Embraer faturaram R$ 394 milhões com a venda de mais de 26 mil itens, segundo dados apresentados em um seminário restrito realizado este mês na sede do BNDES, no Rio, que discutiu a cadeia produtiva aeronáutica. O Valor apurou que no evento o vice-presidente-executivo financeiro da Embraer, Luiz Carlos Siqueira Aguiar, listou medidas de apoio da empresa aos seus fornecedores. Entre elas, estão a antecipação de compras e pagamentos e a possibilidade de recebimento de encomendas antes do prazo previsto. Também citou a opção de a empresa postergar a redução de seus estoques como forma de manter o fluxo de compras.
A Embraer foi procurada desde terça-feira. Em um primeiro momento, a empresa informou, por intermédio da assessoria, que não procedia a informação de antecipação de compras. Ontem, com mais detalhes, o Valor voltou a procurar a companhia, que não se manifestou até o fechamento desta edição. No seminário do qual Aguiar participou, foi apresentado o livro "Cadeia Produtiva Aeronáutica Brasileira: Oportunidades e Desafios", produzido pelo BNDES sob coordenação técnica do economista André Furtado (filho do também economista Celso Furtado), da Unicamp.
O livro consiste de três estudos: o impacto sócio-econômico do programa Embraer, prospecção do setor aeronáutico brasileiro e mapeamento das cadeias produtivas da aeronáutica. No encontro, discutiu-se a incidência de impostos sobre o setor, algo que pesa contra o Brasil. Uma fonte exemplificou o problema: "Os fornecedores de primeira ordem da Embraer são isentos de impostos estaduais mas os fornecedores dos fornecedores são tributados mesmo que o produto final se destine à exportação. Em outros países, o sistema dá mais incentivos aos menores fornecedores da cadeia."
Walter Bartels, diretor-presidente da AIAB, disse que a entidade vem defendendo a isonomia tributária da indústria aeronáutica e de defesa no país em relação aos concorrentes externos como forma de melhorar o ambiente de competição. A medida ajudaria as pequenas e médias empresas a agregar valor às suas atividades e assim poderem fornecer para outras montadoras além da Embraer e Helibrás, diz Bartels.
Hoje as pequenas e médias empresas que fornecem à Embraer prestam mais serviços de industrialização do que a venda de produtos completos. A questão tributária faz com que muitos itens sejam mais baratos no exterior do que no Brasil, onde o imposto de importação na área aeronáutica é zero. No mundo inteiro há isenção de imposto na importação para o setor, mas no Brasil seria preciso reduzir impostos. Segundo Bartels, o governo reconheceu a necessidade da isonomia tributária na nova política industrial, que inclui a indústria aeronáutica e de defesa, e também na Estratégia Nacional de Defesa (END), mas não houve efeitos práticos até agora.
Outro ponto importante na discussão sobre o fortalecimento da cadeia produtiva aeronáutica é a escala. Em alguns segmentos, faria sentido ter uma consolidação de várias empresas em uma só. Um dos exemplos bem sucedidos é o da Graúna Aerospace, de Caçapava (SP), resultado da fusão entre Graúna Usinagem, SPU Comércio e Indústria de Peças e Bronezana. A empresa é fornecedora da Embraer e assinou contrato com a Pratt & Whitney Canadá para fabricar partes de motores. "A consolidação faz com que as empresas tenham outras oportunidades em escala global", disse um executivo do setor.
Bartels disse que o Pró-Aeronáutica foi montado pelo BNDES para oferecer financiamento de longo prazo às empresas do setor interessadas em investir na ampliação ou modernização de suas instalações. Por meio do programa, o BNDES também pode adquirir participação acionária em companhias da indústria aeroespacial, disse Bartels. Até hoje, o programa não atraiu muitas empresas. Agora, além de focar em investimentos produtivos, o programa deverá passar a financiar exportações.
A proposta está em fase de elaboração no BNDES Exim, o braço de exportações do banco, e deve ser submetida à aprovação da diretoria da instituição para tornar-se operacional até o fim de 2009. De janeiro a junho deste ano, o BNDES desembolsou US$ 350 milhões para financiar 15 aeronaves da Embraer, sendo 3 para a Republic Airways, 6 para Jet Blue, ambas americanas; 5 para a Regional, subsidiária da Air France, e 1 para a Taca, de El Salvador.
Além disso, o banco aprovou e contratou financiamento de 11 aeronaves Embraer modelos 170 e 190, no valor de US$ 270 milhões, para entrega à British Airways até março de 2011. Os desembolsos dessa operação devem começar em setembro, quando está prevista a entrega da primeira aeronave. No segundo semestre, o banco tem a perspectiva de financiar mais 21 aeronaves da empresa.”
FONTE: reportagem de Francisco Góes, Chico Santos e Vera Saavedra Durão, do jornal Valor Econômico, publicada em 23/07/2009.
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