SOBRE GRAMPOS
DO JORNALISMO DOS ANOS 90
“FITAS. Não acredite no jornalista que, ao mencionar determinadas gravações, use adjetivos tonitruantes para qualificá-las (“explosivas”, “impactantes”), mas não mostre nem a cobra nem o pau. Só acredite nos trechos entre aspas, e só acredite naquilo que você está lendo. Se o trecho mencionado não significar nada para você, é porque não tem significado algum mesmo.
Qualquer conclusão que a matéria apresente, que não for aquela que você pode tirar objetivamente da frase entre aspas, é cascata. Se os trechos do “grampo” que foram publicados não tiverem importância, é porque o que não foi publicado tem menos importância ainda.”
COMENTÁRIO
Duas jogadas manjadas desse jornalismo-espetáculo:
1.Transformar algo banal - eticamente condenável, mas inserido nas práticas e costumes gerais - em algo criminoso, meramente porque se gravou uma conversa igualmente banal.
Esses diálogos do Sarney com parentes é de um ridículo atroz. Configura práticas nas quais incorre toda a classe política (de Sarney a FHC).
2.Todo dia vir com uma manchete tipo “agora vai”, “agora não tem jeito”.
3.Abaixo, a manchete do Estadão e a da Folha:
Suponha a seguinte conversa entre FHC e Heráclito Fortes (que nomeou sua filha funcionária-fantasma):
FHC - Caro Heraclito, preciso de um favor seu.
HF - Diga, meu presidente.
FHC - Minha filha quer ficar em Brasília e precisa de algum lugar aí para garantir seu salário. Poderia arranjar uma vaga para ela:
HF - Algum lugar específico?
FHC - Não. Pode ser até como assessora pessoal sua, sem o compromisso de vir diariamente ao Senado para não expô-la.
HF - Pois não, senhor presidente, aqui o senhor manda.
É um diálogo imaginário, porém verossímil. Se a conversa não foi assim, foi parecida. A única diferença do Sarney, é que não foi gravada - e a mídia quer o pescoço do Sarney, não a moralização dos costumes. Mas tentar incriminar FHC por isso é algo tão ridículo quanto essa criminalização da boquinha - à qual recorre o mundo político em massa.
Em vez de atacar a boquinha e discutir formas de eliminá-la, usa-se o vício para objetivos escusos: derrubar o presidente do Senado e transformar a casa em fator de instabilidade política.”
FONTE: texto publicado em 23/07/2009 no blog do jornalista Luis Nassif.
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