GEISEL É ACUSADO DE MUITAS COISAS, MAS PROCURAVA DEFENDER O ESTADO BRASILEIRO E NÃO PODE SER ACUSADO DE ANTINACIONAL COMO FHC
"De ernesto.geisel@edu para lula@gov
Defenda o Estado da ação dos sacripantas das privatizações, crie a e statal da banda larga
SENHOR PRESIDENTE,
Antes de mais nada, agradeço seus gentis comentários sobre meu governo e faço-lhe uma revelação: em 1994 votei no senhor. Há por aí pelo menos uma pessoa a quem eu contei isso.
Escrevo-lhe para pedir que enfrente as operadoras de telefonia nessa história da banda larga da internet. Crie uma estatal, não se intimide. Informe a todos os sacripantas das privatizações que cabe ao presidente da República a defesa dos interesses do Estado. O seu cargo é estatal. Seu antecessor privatizou-o e, pelo que me contou o Tancredo Neves (que não gosta dele), carrega índices constrangedores de rejeição popular.
A rede de banda larga do Estado de São Paulo tem mais conexões que o Norte, Nordeste e Centro-Oeste somados. Algo de errado está acontecendo. Os empresários preferem trabalhar no mercado paulista, onde está o dinheiro, desprezando as regiões mais pobres. Não podemos condená-los, mas daí a fazermos o que lhes convém, vai distância enorme.
Durante o governo do marechal Castello Branco eu coordenava a política de telecomunicações do país e queria que esse serviço ficasse sob o guante de uma empresa estatal. O Roberto Campos era ministro do Planejamento e queria privatizar tudo. O Castello não quis discutir a venda da Petrobras, mas disse que gostaria de ver as telecomunicações nas mãos da iniciativa privada. Pediu ao Campos que atraísse capitais para o negócio. Como eram ingênuos...
O Campos foi ao mercado e aprendeu que a plutocracia só se interessaria se a viúva do Duque de Caxias entrasse com os capitais. Eu só consegui estatizar as telecomunicações porque tive a ajuda de um empresariado que defendia um mercado no qual a iniciativa é privada, mas os recursos são públicos, de preferência do BNDES.
Presidente, fuja do monopólio, mas crie um competidor estatal para a banda larga. Se ficarmos na parolagem privatista, voltaremos ao tempo da minha juventude, quando vendia-se manteiga europeia nos armazéns de Bento Gonçalves. Não digam que isso é conversa de velho. Aos 80 anos eu vi os supermercados de Ipanema vendendo verduras belgas.
Respeitosamente,
Ernesto Geisel"
FONTE: artigo de Elio Gaspari publicado hoje (29/11) na Folha de São Paulo [exceto o subtítulo, colocado por este blog]
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