quarta-feira, 26 de maio de 2010

PROTAGONISMO DO BRASIL NO FRONT EXTERNO

“Como era de se esperar, os esforços do Brasil e da Turquia encontraram na imprensa brasileira uma espécie de filial da imprensa norte-americana em seu interesse de diminuir os esforços de paz e trabalhar pelo esforço de guerra que, certamente, começa a tomar corpo com as novas sanções ao Irã.

Washington Araújo

É impressionante a capacidade de nossa “grande imprensa” de minimizar o papel que o Brasil passou a desempenhar no front externo. Até entendo. Dezenas de anos atrelado à visão e a políticas emanadas ou dos Estados Unidos ou de países europeus fizeram com que nossa imprensa considerasse de todo impossível que o Brasil tenha luz própria, pense com sua própria cabeça, veja com seus próprios olhos o que ocorre no mundo, cada vez mais dicotômico e maniqueísta.

Dia 17 de maio de 2010 é anunciado em Teerã o acordo celebrado entre o Irã, o Brasil e a Turquia visando desatar o nó cego em que a questão nuclear envolvendo o Irã se transformou. A arrogância, a prepotência e o sentimento de serem “donos da bola” minaram por completo o necessário ambiente para o diálogo, para o entendimento entre Estados Unidos e o Irã. O Brasil tratou de afastar os fios desencapados, o que por si só já valeria duradouros louvores, fosse afastada a má vontade da grande imprensa com a percepção de um Brasil independente e atuante e que não parece querer se sujeitar a “protagonismo secundário” na cena externa.

Agora mesmo vemos a ausência de intenções sinceras pelos países-membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas ao tratar do acordo conseguido pelo Brasil e pela Turquia junto ao Irã na questão do domínio de tecnologia nuclear. Quem decide as coisas dentro das Nações Unidas? Quem amarra o sino no pescoço do gato?

Na Assembléia Geral estão todos, mas estes só formulam recomendações, emitem opiniões como se estivessem em clube recreativo das nações. Quem toma decisões mesmo é o Conselho de Segurança, onde cinco países têm direito a veto. É a lógica dos vencedores da Segunda Guerra Mundial ainda comemorando, inebriados, o ocaso dos nazistas na Alemanha e observando partículas de poeira nuclear que varreram as populações das cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki.

Pois bem, esses cinco países que prezam pela paz no mundo e se autodesignam tutores da segurança internacional são os cinco principais produtores de armas. Ou seja: os que lucram com a tragédia humana são também os defensores angelicais da paz mundial. E enquanto não se mudar essa estrutura de poder não poderá haver nem justiça nem democracia no mundo.

Tampouco haverá paz, pois se as guerras necessitam de armas, as armas também necessitam de guerras. E não se fazem guerras com povos amigos: há que se escalar o inimigo, a bola da vez. Para isso, que se rasguem todos os tratados de relações internacionais, de diplomacia, de ética a permear a convivência entre as nações.

Mas, como era de se esperar, os esforços do Brasil e da Turquia encontraram na imprensa brasileira uma espécie de filial da imprensa norte-americana em seu interesse de diminuir os esforços de paz e trabalhar pelo esforço de guerra que, certamente, começa a tomar corpo com as novas sanções ao Irã.

E antes que os apressadinhos de costume entendam que estou defendendo o Irã declaro, logo de início, que bem ao contrário, continuo com o pé atrás quando se trata de avalizar a palavra dada pelos que falam em nome do governo iraniano. Naquele país de riquíssima história, um dos berços da humanidade, encontra-se um imenso déficit de respeito ao mais importante dos anseios humanos – o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana. Os bahá´ís que o digam, idem os cristãos, os curdos, as mulheres, os homossexuais, os jornalistas. A lista dos que têm seus direitos humanos violados sistematicamente no Irã é realmente de encher os olhos de dor e tristeza.

Feita esta advertência, voltemos ao curso do texto: ganha uma assinatura de Veja quem apostar que não demora muito a ficarmos sabendo que o Irã possui imensos depósitos de armas químicas para destruição em massa. O resto do filme é já conhecido por todos. Passou no Afeganistão, passa no Iraque e deseja ser exibido em 3D no Irã.

Estarei errado ao entender que nosso mundo é escandalosamente injusto?”

FONTE: escrito por Washington Araújo, jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela UNB; tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil, Argentina, Espanha, México. Tem o blog http://www.cidadaodomundo.org. Artigo publicado no site “Carta Maior”.

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