terça-feira, 29 de março de 2011

Cláudio Lembo: “OCIDENTE INTERVÉM NO MUNDO ÁRABE POR PETRÓLEO”


“A comparação das atuais revoltas no Oriente Médio e no Norte da África com revoluções ocidentais é vista com reservas pelo ex-governador paulista Cláudio Lembo. "Este anseio de autoafirmação desembocará, em níveis diversos, em uma fonte: a religiosa", analisa.

A SARI'A - O CAMINHO

Cláudio Lembo, de São Paulo, no Terra Magazine

"Os meios de comunicação, nos países ocidentais, oferecem uma visão distorcida dos acontecimentos que vêm se desenvolvendo no mundo muçulmano.

Os países do Islam -árabes ou de outras etnias- são considerados despidos de História e repletos de tribos pouco afeitas ao convívio com a Europa e Estados Unidos.

É meia verdade. Todos os países muçulmanos, particularmente os situados na Península Arábica, sempre mantiveram fortes vínculos com o Ocidente.

Estes vínculos mostraram-se, em passado recente, com nítido corte colonialista, onde as intrigas diplomáticas e os tratados secretos contrários aos interesses árabes eram constantes.

É sempre oportuno registrar o tratado secreto entre franceses e ingleses -Tratado Sykes-Picot- que escondia uma ação contra a eventualidade de surgimento de uma nação árabe comum.

Publicamente, ambos os países, França e Inglaterra, apoiavam o surgimento de um mundo árabe unido e, concomitantemente, mediante ações subreptícias apoiavam revoltas locais contra esse objetivo.

Imagem desta insídia é Thomas Eward Lawrence -Lawrence da Arábia. Esta figura de herói romântico, com aparente apoio dos ingleses, lutou pela unidade árabe.

No entanto, à sua revelia, a fragilização da luta comum era boicotada por seus conacionais ingleses. Lawrence, ao conhecer a traição, deixou a vida militar e não aceitou condecoração concedida pela Rainha de seu país.

É apenas um episódio. Ele se repete em outro contexto com Sadam Hussein, antes um aliado dos interesses norte-americanos e depois sentenciado à morte no decorrer da ocupação do Iraque.

Inumeráveis são os fatos próprios da vida política dos países árabes e dos muçulmanos em geral. É bom recordar que Mustafá Kemal, o reformador da Turquia, por isso chamado Atarurk, o Pai dos Turcos, tornou-se, após suas intervenções, um duro ditador.

Essas considerações possuem um único objetivo. Trazer à reflexão elementos capazes de permitir a compreensão dos episódios políticos atualmente em curso no mundo árabe.

Há certamente mal estar contra ditaduras envelhecidas e grupos de aproveitadores da administração pública. Esses podem ser oriundos de antigas famílias aristocráticas ou de movimentos político-militares com traços modernizantes.

A diferença é de roupagem. Todos, com louváveis exceções, são operados pelos interesses dos países centrais e especialmente das empreses petrolíferas.

Daí se imaginar que as revoltas em desenvolvimento se assemelham, como querem alguns europeus, com a Revolução Francesa, é excesso de imaginação.

As lutas populares em 1789 foram precedidas de muito conflito de ideias e forte combate à religião dominante na França, o catolicismo. Existia um componente nacionalista simbolizado na luta contra a Áustria.

No mundo árabe, em termos de sociedade, o grande motor da História é o desapreço aos países colonizadores e suas práticas. Este anseio de autoafirmação desembocará, em níveis diversos, em uma fonte: a religiosa.

É ingênuo esperar-se uma modernização -ao estilo ocidental- em todos os países em ebulição. O Ocidente perdeu a religião. O Islam tem na religião os elementos de sobrevivência. Há um conflito de modos de vida entre as duas realidades sociais.”

FONTE: escrito por Cláudio Lembo, de São Paulo, no portal “Terra Magazine”. O autor é advogado e professor universitário. Foi vice-governador do Estado de São Paulo de 2003 a março de 2006, quando assumiu como governador (http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI5031837-EI8421,00-A+Saria+O+caminho.html)

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