Dragão da inflação abatido
ECONOMISTAS ERRARAM DE NOVO
Por paulo Moreira Leite, em seu blog na “Época”
“Depois de ler os últimos números da inflação, acho que temos o direito de dar uma nova versão para uma velha frase.
"Errar é humano. Errar duas vezes é burrice. Errar três vezes é coisa de economista".
Parte de nossos economistas —alguns muito prestigiados— deveria fazer autocrítica pública em função de seus prognósticos mais recentes.
Muitos profissionais ligados à oposição ou que têm visão de política econômica contrária a do governo Dilma, e que estão no rádio, na TV e nos jornais, formaram coro nas últimas semanas para colocar o país em estado de alerta vermelho em função de "fantasma inflacionário".
O teto da meta da inflação é de 6,50%. Chegou-se a 6,51%, ou seja, apenas um milésimo (isso mesmo: 0,01%!) acima do teto, mas foi suficiente para se fazer escândalo.
Dizia-se que a alta de preços estava fora de controle e que era preciso dar uma pancada forte nos juros —eufemismo para encaminhar o país para uma recessão.
Logo, surgiram vozes para anunciar —com ares implacáveis— propostas de arrocho salarial. O argumento é que os preços não subiam por causa da expansão do crédito, apenas. Não. Era preciso ir mais fundo e encarar a dolorosa realidade de que os salários ficaram altos demais e pressionam os preços.
O raciocínio é assim: desemprego baixo impede as empresas de pagarem salários baixos, pois os trabalhadores —esses espertinhos— têm a chance de procurar ganhar um pouco mais em outro lugar. Com a pancada nos juros e a volta do desemprego alto, tudo poderia retornar “a seu lugar”, como antes.
Num ambiente que lembrava pré-Grécia, pré-Irlanda, pré-Portugal e outros países europeus que encaram a ruinosa política de austeridade do Banco Central Europeu, as chamadas medidas macroprudenciais do Banco Central, -elaboradas com a intenção de controlar a inflação sem produzir estragos desnecessários, numa operação delicada, difícil, com um certo risco-, eram tratadas com ironia e sarcasmo.
Contos da carochinha, assoprava-se. Não havia como escapar da herança maldita deixada por Lula, gritava-se.
Menos de um mês depois, a realidade é outra. Em queda, a inflação está em torno de 5,5%. O crescimento foi afetado, sim. Ficará em 4,5%, quem sabe 4%. Não é, com certeza, aquilo que o país necessita.
Mas é número que demonstra que aquelas medidas tão criticadas podem dar resultado. Podem ocorrer novas surpresas e dificuldades. Mas o saldo é favorável, pelo menos até agora.
Surpresa? Nem tanto. Se você fizer pesquisa rápida nos jornais, verá que nossos economistas erraram sempre —a atividade de prever o amanhã é sempre complicada— mas erraram mais em anos recentes. Anunciaram o caos em 2003. Disseram que o país teria desempenho sofrível em 2004 e “grande frustração” a partir de 2005. Eles chegaram a denunciar Lula e Guido Mantega como irresponsáveis por ampliar o crédito e estimular o consumo depois da crise mundial de 2008, pois o desemprego em massa era fatalidade e os assalariados não podiam abrir mão de sua poupança para enfrentar dias de amargura. (Rsrsrsrsrsrsrs…)
Mas confesso que nada me produz tantas cócegas quanto as reflexões sobre a nossa legislação trabalhista. Nossos economistas passaram as duas últimas décadas repetindo um mantra: sem o fim da CLT não seria possível criar novos empregos. O país estava engessado, o empresário não tinha estímulos para contratar, as leis trabalhistas só protegiam uma casta. A verdade está ai. Em determinados lugares, vive-se aquilo que se chama de pleno emprego. Em outros, a oferta de postos de trabalho atinge patamar recorde. A CLT não saiu do lugar. Pelo país inteiro, milhões de trabalhadores, que há anos eram mantidos na condição dolorosa de comparecer ao batente sem nenhuma garantia, agora têm décimo-terceiro, férias, descanso remunerado.
Essa situação não chega a ser novidade para alunos aplicados no estudo das surpresas e sutilezas da economia. Desde que John Maynard Keynes escreveu sua “Teoria Geral do Emprego” sabe-se que as empresas contratam trabalhadores porque precisam, e pagam por eles os salários que necessitam pagar. Como regra geral, contratações e demissões são produtos do ambiente geral da economia e apenas confirmam a verdade de que a experiência real desafia a visão de senso comum. Os trabalhadores americanos conquistaram suas principais garantias na década de 30, quando o país estava mobilizado para vencer o desemprego e encerrar a Depressão provocada pela crise de 29.
Embora o pedantismo econômico e a linguagem tecnocrática tenham saído de moda, é sempre conveniente garantir rigor e cuidado numa análise. Estamos falando de 190 milhões de pessoas, de uma economia que pretende se tornar uma das maiores do mundo.
(Agradeço o alerta de comentaristas do blogue e do twitter para esclarecer que não considero que todos os economistas do país se comportam dessa maneira. Seria errado pensar assim. Muitos pensam de outro modo. Outros não se dedicam a análises da conjuntura econômica nem procuram apontar tendências)”
PS do "Viomundo": Os erros dos economistas, muitas vezes, não são erros. Eles partem do pressuposto de que tudo o que o governo faz, faz errado. Ou seja, passamos da “crise da hiperinflação” para a “crise do baixo crescimento econômico”, um horror, pior que o Chile!, eles dirão.”
FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, em seu blog na “Época”. Transcrito no portal “Viomundo”, de Luiz Carlos Azenha (http://www.viomundo.com.br/politica/errar-tres-vezes-e-coisa-de-economista.html) [imagem do Google adicionada por este blog].
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