quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

OS NOVOS PROBLEMAS DE CRISTINA KIRCHNER EM SEU 2º MANDATO


“Logo nos primeiros dias do segundo mandato de Cristina Kirchner, explodiu crise profunda entre o governo e o líder da mais poderosa central sindical, a CGT. Daniel Moyano, certo de ter um poder que nem todos acham que ele tem, se lançou num ataque feroz que o deixou à beira da ruptura total com o governo. E Cristina Kirchner, certa de ter um poder que tudo indica que tem, resolveu enfrentar a parada. É um começo de mandato bastante tumultuado.

O artigo é de Eric Nepomuceno.

Escudada por pouco mais de 54% dos votos depositados nas urnas em outubro, Cristina Fernández de Kirchner deu início ao seu segundo mandato no sábado, 10 de dezembro, sabendo que, ao longo dos próximos quatro anos, enfrentará turbulências fortes. Qualquer observador otimista dirá que, dificilmente, a economia argentina conseguirá manter o robusto crescimento médio de 7,5% registrados nos últimos sete anos. Um observador realista dirá que é praticamente impossível.

Medidas impopulares terão, necessariamente, de ser tomadas. Nada comparável, é claro, ao descalabro social que se registra na Europa, mas parte da frouxidão que a bonança econômica dos últimos anos permitiu na Argentina terá de ser contida. A primeira dessas medidas já foi anunciada e começou a ser posta em prática: o fim dos subsídios generalizados para o consumo de energia elétrica, de gás, e também do transporte público.

Esses subsídios consumiram, até agora, cerca de 4% do PIB argentino. Cristina chegou à conclusão de que não há como manter essa situação.

Mas existem outros problemas, e não são poucos. Durante os próximos dez anos, por exemplo, a Argentina terá de amortizar dez bilhões de dólares anuais de sua complexa dívida externa. E dólar passou a ser artigo escasso nessas comarcas.

O Tesouro nacional terá de dar provas de capacidade para honrar compromissos. Um dos focos de debate, dentro e fora do governo, se refere à conveniência de sair outra vez, depois de oito anos, buscando dólares no mercado internacional. Até agora, as exportações, principalmente soja e carne, foram suficientes para pagar dívidas e fazer o país crescer. Pairam nuvens de dúvidas quando se discute se isso continuará acontecendo, principalmente diante da perspectiva cada vez mais próxima de queda acentuada no preço dos principais produtos argentinos de exportação. A tonelada da soja caiu da média projetada, de 490 dólares, para 410 em novembro. É verdade que a produção argentina cresceu, mas não o suficiente para compensar essa queda e as outras que certamente virão.

A implantação de novos mecanismos de controle sobre o câmbio diminui, e muito, as margens que as empresas, especialmente as transnacionais, tiveram até agora para remeter lucros e dividendos às suas sedentas matrizes. A média mensal de compra de dólares na Argentina, onde já existiam mecanismos de controle e limites permitidos, subiu de um bilhão por mês, no primeiro trimestre, para três bilhões mensais no terceiro, véspera da eleição presidencial. Além do mais, vale recordar que os argentinos poupam em dólares: 45% das compras no mercado oficial de câmbios foram operações inferiores a dez mil dólares. Também esses pequenos poupadores foram afetados pelos novos mecanismos na hora de comprar dólares. Os efeitos do controle vão além: exportar, importar, fixar preços, contrair créditos e financiamentos no exterior, remeter lucros, tudo passa por um filtro mais apertado.

A contrapartida oferecida pelo governo ao empresariado é a promessa de aumentar a proteção do parque nacional, ou seja, impor novas barreiras às importações, e ao mesmo tempo aumentar a oferta de crédito dos bancos estatais a taxas subsidiadas.

Outro trambolho incômodo que vem dos tempos de seu falecido marido e antecessor na presidência, Néstor Kirchner, é a manipulação escancarada dos índices de inflação. Além da desconfiança em títulos públicos indexados a uma taxa irreal, a outra taxa, a real, funcionou até agora como baliza na hora dos ajustes salariais. E aí reside outra dúvida premente: o país aguentará ajustar salários ‘pelo índice dos super-mercados, e não pelo índice oficial’, como exigiu Daniel Moyano, o poderoso líder da todo-poderosa CGT, a Central Geral dos Trabalhadores?

Tudo indica que não. Ao adotar como um dos eixos de seu segundo mandato o combate à inflação, Cristina Kirchner sabe que está mexendo num vespeiro. O setor privado, como sempre, afirma que a alta nos preços se deve ao crescimento dos salários. Os sindicatos dizem que o empresariado mesquinho se nega a repartir lucros e benefícios. Seja como for, ao longo de 2011 a média geral dos reajustes obtidos nas negociações coletivas foi de 31%, muito além da inflação oficial, de 9%, e do chamado ‘índice do supermercado’, ou seja, a inflação real, que ronda os 25%. A grande tarefa, e um dos maiores desafios do governo, é fazer com que esses dois índices encontrem uma convergência próxima ao índice oficial.

Cristina Kirchner iniciou seu segundo mandato nas vésperas das negociações salariais que estabelecerão os ajustes do ano que vem. Até junho de 2012, não haverá trégua na tensão que todos, dentro e fora do governo, dão como inevitável.

E é exatamente nesse panorama que, logo nos primeiros dias do segundo mandato de Cristina Kirchner, explodiu uma crise profunda entre o governo e o líder da mais poderosa central sindical, a CGT. Daniel Moyano, certo de ter poder que nem todos acham que ele tem, se lançou num ataque feroz que o deixou à beira da ruptura total com o governo. E Cristina Kirchner, certa de ter um poder que tudo indica que tem, resolveu enfrentar a parada.

É um começo de mandato bastante tumultuado. E há mais conflitos pela frente.”

FONTE: escrito pelo jornalista Eric Nepomuceno e publicado no site “Carta Maior”  (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19245).

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