Alice Amsden, professora do MIT estudiosa do papel do Estado como indutor do desenvolvimento. Morreu este ano, aos 68 anos
Da “Folha de São Paulo”
Professora do MIT (morreu no dia 15) enfatizou importância da Petrobras [indústria naval e outras políticas dos governos Lula e Dilma] em entrevista concedida à “Folha” em fevereiro
Alice Amsden afirma que Brasil ainda é muito pobre e não pode imitar políticas de livre mercado para crescer
Por Eleonora de Lucena, da ‘Folha’
“Alice Amsden era uma das mais importantes economistas heterodoxas de hoje. Mergulhou no processo de industrialização asiático e destrinchou o papel do Estado como indutor do desenvolvimento.
Professora de economia política no “Massachusetts Institute of Technology”(MIT), ela morreu no dia 15, em Cambridge (EUA), aos 68 anos.
Um mês antes, deu esta entrevista à “Folha”. Nela, fez elogios ao [recente] desenvolvimento brasileiro, afirmando que o país realizou uma "revolução racional", enfatizando a importância da Petrobras.
Sua avaliação era que o país, que tem "empresários de primeira linha", precisa ter um setor nacional forte, -público e privado.
Seu livro mais importante é "A Ascensão do 'Resto', os Desafios ao Ocidente de Economias com Industrialização Tardia" (UNESP, 2009).
-Folha - Como analisar o desenvolvimento brasileiro hoje?
Alice Amsden – Finalmente, as coisas estão indo bem no Brasil, depois de 500 anos.
O que está indo certo até o ponto em que o modelo brasileiro está começando a ser copiado pelo México e pela África lusófona?
Os novos países produtores de petróleo da África estão copiando o "nacionalismo de recursos" da Petrobras, em que uma companhia de propriedade nacional, em vez de uma empresa internacional, é o centro de um negócio gigante de petróleo.
-Quais foram as mudanças de longo prazo?
O Brasil parou de olhar na direção da “teoria do mercado” para buscar inspiração para as suas políticas.
Em vez de se dirigir para o beco sem saída das políticas universais -como o “livre-comércio” e as “vantagens comparativas”- e que eram supostamente boas para todos, começou a pensar com linhas dedutivas. Seu guia passou a ser as "experiências" de muitos países, não as teorias.
-Como é esse novo modelo?
O Brasil incentiva indústrias não com base nas "vantagens comparativas", mas com base no "conhecimento do negócio".
Se o conhecimento existe no Brasil, o governo pode avançar e apoiar uma nova indústria.
-Por exemplo?
A construção naval. Parabéns ao Brasil por fazer uma revolução racional.
-E a questão da inovação?
Está conectada com essa revolução. O Brasil começou inovando na fronteira mundial guiado pelo modelo de suas necessidades específicas (álcool, perfuração em águas profundas), não por um modelo, como no passado, que era baseado no que a ciência determinava como necessário a ser feito em pesquisa e desenvolvimento.
-Como a Sra. avalia o processo de privatização e as relações entre Estado e empresários?
O Brasil melhorou as relações entre o setor de negócios privado e os servidores públicos de alto nível. Agora, por causa da "privatização de veludo", os dois se complementam, em vez de cortar as gargantas uns dos outros.
O Brasil não fez privatização louca das joias da coroa, abrindo mão das melhores empresas públicas para executivos e engenheiros medíocres do exterior.[Por sorte não fez totalmente, pois o processo demotucano neoliberal foi interrompido com a eleição de Lula/PT]
-Qual o papel do setor privado no desenvolvimento?
Para ampliar o conteúdo nacional, a gestão pública pode assumir a liderança. Agora, por exemplo, a Petrobras está começando a usar navios de fornecedores nacionais e a Vale está se movendo na direção da produção de aço.
-Como a Sra. define o Brasil?
O Brasil é pró-capitalista, nacionalista e anti-imperialista. Com manobras inteligentes na OMC, mostrou uma forma brilhante de luta contra as tendências imperialistas do mundo desenvolvido.
Ficando mais rico, o Brasil não pode esquecer que é ainda um país muito pobre. Não pode imitar as políticas de “livre mercado” dos mais ricos e esperar se desenvolver".
FONTE: reportagem de Eleonora de Lucena publicada na “Folha de São Paulo” (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/32858-pais-fez-revolucao-racional-diz-economista.shtml). [trechos entre colchetes adicionados por este blog 'democracia&política'].
MT, Muito interessante artigo !
ResponderExcluirMas acho que os "Chicago boys" não gostam muito dela não...
Iurikorolev,
ResponderExcluirVocê lembrou bem. Pinochet, na década de 70, foi o inaugurador (com o uso da força) do neoliberalismo econômico na América Latina, conduzido por seus “Chicago Boys”. O Plano Pinochet era bem parecido com o nosso futuro Plano Real de Itamar Franco e FHC em 1994. Escancarou as portas quase sem taxas para produtos importados, privatizou (para estrangeiros) em grande escala, não apoiou com créditos a sua indústria, segurou sobrevalorizado o peso (em relação ao dólar). A inflação, como em todas as economias que se abriram repentina e radicalmente, caiu de forma abrupta nos primeiros anos. Veio a ilusão do sucesso da estabilização da moeda. Como consequência, vieram também a grande concentração de renda naqueles poucos nacionais que lucraram com a nova situação e o aumento das convulsões sociais (então reprimida com muitas mortes) e aumento do número de desempregados. Para os países ricos exportadores de produtos industrializados, foi ótimo. Cinicamente, com apoio do FMI, passaram a enaltecer para a América Latina o exemplo chileno. Caímos nesse engodo nos anos 90 e ainda não conseguimos nos refazer de todos os danos.
Maria Tereza