segunda-feira, 16 de abril de 2012

REFLEXÕES ANTECIPADAS DE PERSEU ABRAMO SOBRE OS DIAS DE HOJE

Padrão de Manipulação

Por Perseu Abramo, no livro “Padrões de Manipulação da Grande Imprensa

“A relação entre a imprensa e a realidade é parecida com aquela entre um espelho deformado e um objeto que ele aparentemente reflete: a imagem do espelho tem algo a ver com o objeto, mas não só não é o objeto como também não é sua imagem; é a imagem de outro objeto que não corresponde ao objeto real.

Assim, o público — a sociedade — é cotidiana e sistematicamente colocado diante de uma realidade artificialmente criada pela imprensa e que se contradiz, se contrapõe e, frequentemente, se superpõe e domina a realidade real que ele vive e conhece.

Como o público é fragmentado no leitor ou no telespectador individual, ele só percebe a contradição quando se trata da infinitesimal parcela de realidade da qual ele é protagonista, testemunha ou agente direto, e que, portanto, conhece. A imensa parte da realidade, ele a capta por meio da imagem artificial e irreal da realidade que ele não percebe diretamente, mas aprende por conhecimento.

Daí que cada leitor tem, para si, uma imagem da realidade que, na sua totalidade, não é real. É diferente e até antagonicamente oposta à realidade. A maior parte dos indivíduos, portanto, move-se num mundo que não existe, e que foi artificialmente criado para ele justamente a fim de que ele se mova nesse mundo irreal.

A manipulação das informações se transforma, assim, em manipulação da realidade.

[Nota do Viomundo: Perseu escreveu isso antes dos bilhões de vasos comunicantes desconcentrados da blogosfera, que deu aos leitores a oportunidade de trocar opiniões e críticas sobre o conteúdo]

*****
OS PADRÕES DE MANIPULAÇÃO
[...]

3.3. Inversão da versão pelo fato: não é o fato em si que passa a importar, mas a versão que dele tem o órgão de imprensa, seja essa versão originada no próprio órgão de imprensa, seja adotada ou aceita de alguém — da fonte das declarações e opiniões.

O órgão de imprensa, praticamente, renuncia a observar e expor os fatos mais triviais do mundo natural ou social e prefere, em lugar dessa simples operação, apresentar as declarações, suas ou alheias, sobre esses fatos. Frequentemente, sustenta as versões mesmo quando os fatos as contradizem. Muitas vezes, prefere engendrar versões e explicações opiniáticas cada vez mais complicadas e nebulosas a render-se à evidência dos fatos. Tudo se passa como se órgão de imprensa agisse sob o domínio de um princípio que dissesse: se o fato não corresponde à minha versão, deve haver algo de errado com o fato.
[...]

3.4. Inversão da opinião pela informação. A utilização sistemática e abusiva de todos esses padrões de manipulação leva, quase inevitavelmente, a outro padrão: o de substituir, inteira ou parcialmente, a informação pela opinião. Deve-se destacar que não se trata de dizer que, além da informação, o órgão de imprensa apresenta também a opinião, o que seria justo, louvável e desejável, mas sim que o órgão de imprensa apresenta a opinião no lugar da informação, e com o agravante de fazer passar a opinião pela informação. O juízo de valor é inescrupulosamente utilizado como se fosse a própria mera exposição narrativa/descritiva da realidade. O leitor/espectador já não tem mais diante de si a coisa tal como existe ou acontece, mas sim uma determinada valorização que o órgão quer que ele tenha de uma coisa que ele desconhece, porque o seu conhecimento lhe foi oculto, negado e escamoteado pelo órgão.

Essa inversão é operada pela negação, total ou quase total, da distinção entre juízo de valor e juízo de realidade, entre o que já se chamou de “gêneros jornalísticos”, ou seja, de um lado a notícia, a reportagem, a entrevista, a cobertura, o noticiário e, de outro, o editorial, o artigo, formas de apreensão e compreensão do real que, coexistentes numa mesma edição ou programação, se completavam entre si e ofereciam ao leitor alternativas de formar sua (do leitor) opinião, de maneira autônoma e independente.

Hoje, exatamente ao contrário, o fato é apresentado ao leitor arbitrariamente escolhido dentro da realidade, fragmentado no seu interior, com seus aspectos correspondentes selecionados e descontextualizados, reordenados inadvertidamente quanto a sua relevância, seu papel e seu significado, e, ainda mais, tendo suas partes reais substituídas por versões opiniáticas dessa mesma realidade. Ao leitor/espectador, assim, não é dada qualquer oportunidade que não a de consumir, introjetar e adotar como critério de ação a opinião que lhe é autoritariamente imposta sem que lhe sejam igualmente dados os meios de distinguir ou verificar a distinção entre informação e opinião.”

PS do Viomundo: Rapaz, eu juraria que o Perseu escreveu isso neste fim-de-semana, depois de ler certa revista…”

FONTE: portal “Viomundo”  (http://www.viomundo.com.br/politica/reflexoes-antecipadas-de-perseu-abramo-sobre-os-dias-de-hoje.html). [Imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’]

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