terça-feira, 25 de setembro de 2012

OPOSIÇÃO AGE COM LULA COMO AGIU COM GETÚLIO E JANGO

“Oposição quer fazer com Lula o que fez com Getúlio e Jango”, diz ex-ministro da Defesa Waldir Pires


Por Bob Fernandes, no portal “Terra Magazine”

“Na quinta-feira, 20, seis partidos de sustentação do governo Dilma (PT, PMDB, PSB, PDT, PC do B e PRB), em nota pública, acusaram a oposição de estar “disposta a qualquer aventura” e a “práticas golpistas”. Segundo a nota, “em defesa da honra e dignidade” do ex-presidente Lula, assinada pelos presidentes dos seis partidos, “assim foi em 1954, quando inventaram um ‘mar de lama’ para afastar Getúlio Vargas” e “assim foi em 1964, quando derrubaram Jango para levar o País a uma ditadura de 21 anos”.

Para uma reflexão sobre o momento, e o passado, “Terra Magazine” foi ouvir alguém com idade, história e autoridade para tanto.

Entre os dias 31 de Março e 1 de Abril de 1964, um golpe militar derrubou o governo João Goulart, o Jango. Dois funcionários foram os últimos a deixar o Palácio do Planalto depois do golpe. Um deles, o chefe da Casa Civil, Darcy Ribeiro. O outro, o Consultor-Geral da República, Waldir Pires. Ex-secretário de Estado, deputado estadual e federal, governador e senador, criador da Controladoria-Geral da União e ex-ministro da Defesa no governo Lula, Waldir Pires, aos 85 anos, é candidato a vereador pelo PT em Salvador. Na conversa que se segue, Waldir Pires discorre sobre o que já viveu e as relações ou semelhanças com o momento. Em um trecho da conversa, o ex- ministro da Defesa diz:

- “Vamos ser claros: a oposição quer fazer com Lula o mesmo que fez com Getúlio Vargas e com Jango…até as expressões que usam são as mesmas, ‘mar de lama’ é uma delas…”

Em outro momento, avança:

- “Eu já vi e vivi esse filme antes, e há amarras extraordinariamente suspeitas em tudo isso… o cheiro é o mesmo…”

Abaixo, a entrevista:

--Terra Magazine: Onde o senhor estava no dia do golpe que levou à ditadura em 1964?

Waldir Pires: Em Brasília, no Palácio do Planalto. Eu era o Consultor-Geral da República… eu e o Darcy Ribeiro, Chefe da Casa Civil, fomos os últimos a deixar o Palácio quando derrubaram o presidente João Goulart, o Jango..

--Seis partidos, PT, PMDB, PSB, PDT, PC do B e PRB, todos de sustentação ao governo Dilma, assinaram e lançaram uma nota pública. Nessa nota, acusam os partidos de oposição, PSDB, DEM e PPS, de estarem “dispostos a qualquer aventura” e de “não hesitarem em práticas golpistas”. O documento é apresentado em defesa “da honra e dignidade” do ex-presidente Lula…

…Sim, eu tomei conhecimento da nota…

--Como o senhor, aos 85 anos, tendo vivido o que já viveu e viu, vê esse momento?

Parece-me evidente que a oposição, ao menos setores da oposição, estão agindo em relação ao ex-presidente Lula como um dia agiram em relação a Getúlio Vargas e João Goulart…

--O senhor diria que já viu esse filme antes ou isso é um exagero dessa nota dos seis partidos?

Eu já vi e vivi esse filme antes, e há amarras extraordinariamente suspeitas em tudo isso…o cheiro é o mesmo…

--Em que termos o senhor faz essa comparação?

Vamos ser claros: a oposição quer fazer com Lula o mesmo que fez com Getúlio Vargas e com Jango…até as expressões que usam são as mesmas, “mar de lama” é uma delas…

--Mas não existiriam outros fatores objetivos no discurso da oposição? Assim como existem fatos que são objetos das críticas e denúncias e até do julgamento no Supremo…

Existem razões e fatos, mas o Brasil tem instituições funcionando e que são capazes de examinar os fatos sem que seja preciso pressão e a criação de um ambiente artificial. E diga-se que instituições fortalecidas exatamente durante os dois mandatos do governo Lula. Eu mesmo fui ministro-chefe da Controladoria-Geral da União que não existia até Lula. O governo Fernando Henrique tinha uma Corregedoria

--E qual a diferença?

A Controladoria fiscaliza e dá absoluta transparência a todos os gastos federais, está tudo na internet, cada centavo dos bilhões gastos pelo governo federal está no site. E mais. Tudo isso numa ação coordenada com o Ministério Público, no plano federal e nos Estados, com o COAF, a Receita Federal, Polícia Federal…ora, quando falam no resultado disso, do aprofundamento das investigações nos casos de corrupção, como esquecem de dizer que isso, que essa coordenação de esforços, é obra exatamente dos governos de Lula e agora de Dilma?

--Mas…

…a montagem dessa teia de acessos às informações e absoluta transparência, que leva a sociedade a ter acesso às informações, é obra de Lula, do governo Lula. Como é possível ignorar isso, esconder essa informação enquanto, ao mesmo tempo, se valem das informações que esse sistema coordenado de fiscalização e transparência permite obter?

--Isso foi decisão pessoal dele ou foi acontecendo?

Decisão pessoal dele. Quando o presidente me convidou para o Ministério da Defesa, me preocupei se poderia haver alguma modificação na atuação da Controladoria… O presidente Lula não apenas me garantiu que não, como manteve minha equipe, e Jorge Hage está até hoje à frente da equipe com resultados e um trabalho que não apenas o Brasil reconhece. A ONU, a OEA e outros organismos internacionais já reconheceram e deram destaque a esse trabalho modernizador no setor de controle e transparência de informações…

--Voltemos ao momento…

Vejo este momento com preocupação, com inquietação. É um erro, e mais do que isso, não condiz com a verdade esse ambiente de que vivemos num “mar de lama”, que há “corrupção generalizada” desde o governo Lula…

--Por que um erro?

Porque nossas instituições democráticas ainda são frágeis…porque isso não é verdade…a transparência, o acesso às informações, a atuação do Ministério Público, da Polícia Federal, a atuação conjunta nos últimos anos e os resultados disso mostram que esse ambiente desejado por certos setores é irreal, não é verdadeiro…O que há é que agora, depois de séculos, as informações, pela primeira vez na história, vêm a público…

--O que lhe preocupa?

Preocupa-me… há uma tendência nos últimos anos…os setores conservadores, ao invés de articularem golpes militares, agora dão golpes parlamentares… como se viu em Honduras, como se viu há pouco no Paraguai, e isso é precedido pela fomentação de um ambiente adequado para esses golpes parlamentares…

--O que o senhor, objetivamente, detecta nessa “ambientação”…

A generalização, o procurar atingir os adversários a esse nível que estão fazendo e como estão fazendo, ao invés do enfrentamento político democrático, enfrentamento com críticas duras, críticas e denúncias severas e tudo o mais, mas não com a criação de um ambiente artificial, e ainda mais quando isso parte dos setores de onde isso tem partido…

--Ou seja…

Setores com figuras, instituições que construíram fortunas incalculáveis, que estão aí, e sem que nada ou quase nada fosse dito ou apurado… alguns desses personagens até já se foram e deixaram fortunas, até porque não existiam os mecanismos de fiscalização e transparência de agora. Mas outros, bem mais recentes, estão por aí…como é possível querer que se acredite que a “corrupção nasceu ou cresceu” nos últimos anos, se foi exatamente nos governos de Lula e Dilma que iniciou o combate verdadeiro e eficaz, combate articulado e com o resultados que se conhece…isso é irreal e é uma farsa…

--Por que irreal e…

É irreal fazer de conta que a corrupção é algo apenas “atual”, é irreal fazer de conta que não se conhece os fatos conhecidos, do passado distante e também do passado recente… é uma farsa desconhecer a história do mundo e do Brasil, e desconhecer o combate que vem sendo travado exatamente desde a consolidação de todos esses mecanismos de controle e transparência… A corrupção existe, ninguém está negando isso, mas existem mecanismos de controle e eles estão funcionando…

--O senhor sabe que tentarão desqualificar, rotular suas observações…

Certamente, isso é parte desse processo todo…

--Que papel a mídia tem e deveria ter diante disso? Como o senhor percebe a atuação da mídia?

O papel é o de dizer como as coisas realmente são e foram, dizer quais são os fatos verdadeiros…e por isso vejo com preocupação a atuação de certos setores…

--Que setores?

Os setores conservadores. Há certas coisas muito parecidas, inclusive a expressão “mar de lama”, com a coisa terrível que a oposição fez com Getúlio… Tentam fazer o que fizeram com Getúlio e depois com João Goulart, e tudo isso para impedir os avanços, querem, com Lula ou sem Lula, interromper os avanços do processo democrático, e o verdadeiro avanço se deu com a inclusão social. Esse é o avanço. Democracia é também, mas não apenas, o compromisso de liberdades formais. Democracia é, foi, a inclusão social de 40 milhões de brasileiros que acontece desde Lula, e esse é o grande incômodo dos setores conservadores. Se a oposição quer vencer, que tenha um ideário e busque votos.

--Quanto à imprensa, à mídia, o senhor pode ser mais específico quanto ao que pensa?

Eu era ministro da Defesa no governo Lula e fui a um programa de televisão para ser entrevistado. Por três ou quatro vezes, o apresentador, que me recebeu de maneira muito gentil, repetiu “mas que vergonha o mensalão, hein?”,mas que surpresa um mensalão”. Na quarta vez, respondi: “Mas como surpresa com um mensalão? Você não se lembra do ‘mensalão’ do IBAD, aquele que terminou em CPI em 1962?”. Aquilo era uma trama, uma articulação e preparação para um golpe de estado (NR: Instituto Brasileiro de Ação Democrática. Financiado por setores do empresariado e pela agência norte-americana CIA, o IBAD teve como objetivo financiar a eleição de opositores ao governo João Goulart e também setores da mídia. Por decisão judicial, o IBAD foi fechado em 1963). Se querem usar a expressão “mensalão”, como ignorar tantos mensalões da história do Brasil, inclusive os bem mais recentes? Se falam em “mensalão”, como se esquecem que isso de agora veio "de Minas Gerais", e do PSDB?

--O senhor já foi secretário estadual, deputado estadual e federal, Consultor-Geral da República, ministro, governador, o ministro que criou a Controladoria-Geral da União, foi exilado por seis anos e agora é candidato a vereador pelo PT em Salvador, aos 85 anos. Por quê?

Por dever de gratidão. Dever de consciência, por ver minha cidade maltratada, a administração pública indiferente e sem nenhum projeto consistente para seu desenvolvimento, submetida a um processo de corrosão moral que a todos causa indignação. Porque não há como olhar para o espelho e admitir para si mesmo não participar das grandes preocupações. As capitais, a nossa capital, são ou deveriam ser um núcleo de organização da vida, de inclusão social… Salvador foi a cidade onde conheci o mar. Isso já é muito…”

FONTE: entrevista de Bob Fernandes com o ex-Ministro da Defesa Waldir Pires. O entrevistador foi redator-chefe da “CartaCapital”, trabalhou nas revistas “IstoÉ” (BSB e EUA) e “Veja”. Foi repórter da “Folha de S.Paulo” e “JB”, fez "São Paulo, Brasil" no “GNT/TV Cultura”. Comentarista da “TVGazeta” e “Rádio Metrópole” (BA). Entrevista publicada no portal “Terra Magazine” e transcrita no portal “Viomundo”  (http://www.viomundo.com.br/denuncias/waldir-pires-a-bob-fernandes-oposicao-age-com-lula-como-agiu-com-getulio-e-jango.html) e  (http://terramagazine.terra.com.br/bobfernandes/blog/2012/09/21/oposicao-quer-fazer-com-lula-o-que-fez-com-getulio-e-jango-diz-ex-ministro-da-defesa-waldir-pires/).

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