segunda-feira, 22 de abril de 2013

UMA JORNALISTA ISRAELENSE EM TERRAS PALESTINAS

 Amira Hass

Amira Hass é considerada a única jornalista israelense a residir junto aos palestinos nos territórios ocupados. Ao visitar São Paulo, ela fez um relato do difícil cotidiano das famílias palestinas diante das restrições impostas por Israel. Para ela, drama é simbolizado pela desigualdade no abastecimento de água, em falta para os palestinos, mas farta para abastecer piscinas de assentamentos [israelenses implantados nas terras palestinas invadidas e ocupadas, e abastecidos com fontes de água palestinas furtadas]. 

Por Luciana Garcia de Oliveira

Há um pouco mais de um mês do dia em que é tradicionalmente comemorado os 65 anos da Independência do Estado de Israel, foi realizado um debate “Jornalismo e política: a construção da imagem de Israel e da Palestina” no auditório da B'nai B'rith, em São Paulo, com a ilustre presença da jornalista israelense Amira Hass. Filha única de dois sobreviventes do holocausto nazista, Amira Hass nasceu em Jerusalém, onde estudou na renomada Universidade Hebraica de Jerusalém. Ao longo da sua carreira como jornalista, muito frustrada com os desdobramentos da primeira Intifada, sobretudo com relação à cobertura israelense frente aos desdobramentos das manifestações palestinas, decidiu trabalhar diretamente dentro dos locais de conflito, os territórios palestinos [invadidos e] ocupados, em 1991 e, desde então, foi considerada (até o ano de 2003) como a única jornalista israelense a residir junto aos palestinos em regiões como Gaza (1993) e Ramallah (1997).

Em São Paulo, Hass relatou de maneira detalhada o modo pelo qual o discurso do holocausto é imposto dentro da sociedade palestina desde as primeiras migrações estrangeiras na região. É notado, no entanto que, a partir da fundação do Estado judeu, a história de Israel é permeada de inúmeras omissões, principalmente no que tange às esferas de comunicação e conhecimento. Sobre essa questão, Amira Hass ressaltou, diante de um público formado pela comunidade judaica de São Paulo, acerca do longo processo de destruição econômica, social e cultural da Palestina e dos palestinos desde antes de 1948.

Foram os desdobramentos da chamada “guerra de Independência”, conhecida como a ‘Nakba’ (catástrofe, em português), capazes de acarretarem em grandes levas de refugiados [palestinos expulsos], impedidos de retornarem as suas casas até os dias de hoje. E, os demais que permaneceram em seus territórios, passaram a conviver sob uma realidade de completa segregação. Isso ocorre porque os palestinos que vivem nos territórios [invadidos e] ocupados têm o direito de locomoção extremamente limitado, sendo submetidos diariamente aos chamados ‘checks in points’ (ou “barreiras de segurança”) a fim de cruzarem algumas fronteiras municipais. A complexidade da situação é capaz de impedir que cidadãos que residem na Cisjordânia [da Palestina] sejam, do mesmo modo, proibidos de visitarem a Faixa de Gaza [também da Palestina] e vice-versa.

Todas as restrições relacionadas ao direito de locomoção de uma maneira geral, a qual abrange, por sua vez, os direitos à visita, ao retorno dos refugiados da diáspora e de locomoção interna dentro dos territórios palestinos, tornam-se ainda mais urgentes, quando comparados ao tratamento dispensado à comunidade judaica da diáspora. Nesse caso, a chamada “lei do Retorno”, tende a beneficiar com direito à trabalho e moradia em Israel quaisquer indivíduo de origem judaica, incluindo aqueles que nunca estiveram naquela região. Tudo isso em detrimento de uma vasta comunidade palestina nascida no território [invadido] compreendido pela Palestina histórica.

Ainda com relação ao tratamento absolutamente desigual, Amira Hass não olvidou em mencionar o que seria a violação considerada mais grave e desigual, a questão da água. O seu testemunho revelou que os palestinos que vivem nos arredores dos luxuosos assentamentos judaicos, localizados na Cisjordânia, são obrigados a adaptarem suas rotinas com a escassez permanente no abastecimento de água para as suas necessidades básicas e, ao mesmo tempo, conviverem com a ostentação de piscinas bastante abundantes e exclusivas para os moradores estrangeiros [israelenses, ocupantes das terras palestinas invadidas e ocupadas, e abastecidos com fontes de água palestinas furtadas].

Viver do lado da ocupação, de acordo com a jornalista, é acima de tudo sobreviver com sensação de ameaça permanente. Isso ocorre porque não existe previsão para a cessação da ocupação, o que impede, por sua vez, que as famílias palestinas possam planejar seus futuros e que os territórios [palestinos usurpados e] sob jurisdição israelense, tenham um desenvolvimento pleno. E, muito ironicamente, toda a ocupação é mantida, por razões de segurança, por parte de um Estado que detém grande [poderoso, moderníssimo e treinado exército, equipado até com armas nucleares] e um enorme aparato tecnológico. Toda a contradição presente na atual conjuntura israelense, segundo Hass, tem grande probabilidade em provocar novas ondas de violência nos mesmo moldes de uma terceira Intifada.

Antes de finalizar a sua apresentação e a fim de apontar possíveis soluções para o conflito entre Israel e a Palestina, foi, durante o debate com o público, que Amira Hass defendeu a proposta pela solução de dois Estados, não como sendo um projeto ideal, mas como alternativa possível para amenizar o atual estado de hostilidade entre ambos os lados do conflito. Ainda, enfatizou acerca do compromisso da comunidade judaica da diáspora para a viabilização da coexistência na região, para ela isso será possível a partir do momento em que houver uma recusa ao apoio ao atual governo do Estado de Israel e quando grande parte da comunidade judaica passar a prestar mais atenção aos prejuízos causados historicamente ao povo palestino.”

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