segunda-feira, 27 de maio de 2013

JANELA DO PRESÍDIO DE GUANTÁNAMO

“Desenhemos uma cena atual de barbárie: um grupo de patriotas, por defender seus países (e consequentemente seus povos, suas culturas, seus modos de vida, seus bens patrimoniais etc.) contra a invasão estrangeira, é agredido, agrilhoado e transferido a um presídio localizado numa ilha caribenha, que está bem longe de seus países de origem.

Por Bruno Peron (*), do México

Algo não muito diferente passou-se séculos atrás com os africanos que sofriam de banzo (saudade da terra natal), desnutrição e humilhações enquanto eram desterrados em direção ao solo americano para o trabalho escravo.

A maioria dos 166 detentos atuais do presídio de Guantánamo são de origem afegã e paquistanesa. Foram aprisionados na missão bélica invasora, ilegítima e unilateral dos Estados Unidos no Oriente Médio por “suspeita de ligação com a organização Al Qaeda”. Desde que chegaram a Guantánamo, não se lhes tem dado nenhuma garantia de quanto tempo permanecerão encarcerados e em que situação.

Em meados de maio de 2013, 100 destes 166 presidiários cumpriram 100 dias fazendo greve de fome em protesto aos abusos, maus-tratos, condições insalubres das instalações, roubo de seus pertences por carcereiros e atos de desprezo ao Alcorão (livro sagrado dos muçulmanos) por soldados estadunidenses.

O presídio de Guantánamo (Guantanamo Bay Detention Camp, que contém os espaços Camp Delta, Camp Iguana e Camp X-Ray de tortura a asiáticos) construiu-se numa base militar dos Estados Unidos no sudeste de Cuba. Projetou-se como um espaço de detenção temporária, embora tenha tomado outro rumo. Lá foram levados, noutros períodos históricos, detentos de origem japonesa e vietnamita, quase todos após guerras (respectivamente Segunda Guerra "Mundial" e Guerra do Vietnã).


[Ilha de Cuba, com o enclave de Guantánamo em vermelho. Cuba é asfixiada economica e politicamente há mais de 50 anos pelos EUA e muito criticada pela mídia demotucana brasileira "por ter tido presos políticos"...] 

O governo da ilha [de Cuba] ofende-se pela presença militar EUA. A porção territorial de 116 quilômetros quadrados foi tomada pelos Estados Unidos em 1903 - em acordo com o governo cubano daquela época - para fins de exploração mineira e naval. A posse estadunidense da Baía de Guantánamo é uma herança pré-Revolução Cubana que levou à patrulha ostensiva da área a partir de início da década de 1960 e à proibição de soldados estadunidenses cruzarem o limite com Cuba.

Algo sério está passando na Baía de Guantánamo, e a greve de fome dos encarcerados tenta despertar a atenção mundial sobre o tema. Nas vizinhanças de praias caribenhas paradisíacas, ecoa o martírio de 166 enjaulados por um país em desacordo com normas internacionais. Estão lá sem terem sido competentemente julgados e sentenciados por uma corte legítima. Há um desequilíbrio de forças nas relações internacionais que mantém a impunidade dos atos unilaterais [norte-ameicanos] e silencia os mais fracos.

A América Latina é uma região de contrastes. A Marinha estadunidense intensificou a patrulha da costa da Flórida, onde milhares de cubanos chegavam em embarcações precárias e superlotadas para tentar a vida nos Estados Unidos. Poucos obtinham êxito. A distância das águas entre Flórida e Cuba, para eles, era menor que a dos desertos escaldantes na fronteira entre Estados Unidos e México.

Instituições que se inspiram no modelo de direitos humanos do Velho Continente, da “Organização das Nações Unidas” [ONU] e da “União de Nações Sul-Americanas” [UNASUL] são as que mais pressionam a favor do fechamento do presídio de Guantánamo. Elas reivindicam que somente a transferência dos detentos a outro presídio não é garantia de resolução dos problemas que instituições como a “Cruz Vermelha Internacional” reconheceram. Algumas delas tiraram suas conclusões após visita de seus profissionais e técnicos a Guantánamo.

Embora uma das promessas da primeira campanha do presidente dos EUA Barack Obama tenha sido o fechamento do presídio de Guantánamo, o espaço continua funcionando normalmente. Uma medida paliativa que muitos esperavam era, pelo menos, a transferência dos detentos a outros cárceres, mas isso tampouco ocorreu. A entrada dos presidiários de Guantánamo ao território estadunidense poderá prescindir de visto, mas eles continuarão espiando o mundo por uma janela que é pior que a maior parte dos programas da televisão sempre que esta é vista como janela para o mundo.”

FONTE: escrito por Bruno Peron(*), mestre em Estudos Latino-americanos pela Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM). Transcrito no portal “Vermelho”  (
http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=214618&id_secao=9
). [Imagens do Google e trecho entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].

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