quinta-feira, 23 de abril de 2015

O DESLOCAMENTO DO PODER GEOPOLÍTICO MUNDIAL PARA O ORIENTE


Bandeiras de China e EUA em Nova York

O deslocamento do poder geopolítico para o Oriente

"A China conquistou uma grande vitória diplomática na batalha não declarada contra os EUA pela liderança econômica da Ásia, e do mundo, ao reunir 57 países na fundação do novo "Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura" e lograr incluir nesse grupo países como Reino Unido, Alemanha, França e Itália, considerados fiéis aliados do império.

Por Umberto Martins

Sabe-se, e não era de se esperar outra coisa, que Washington fez ostensiva campanha contra o empreendimento chinês, alegando que vai esvaziar o Banco Mundial, o que pode realmente ocorrer e, por sinal, não será lamentável.

Afinal, trata-se de uma instituição que se mostrou impotente e incompetente diante da crise, remanescente decadente dos acordos de Bretton Woods, como o FMI, e igualmente dominada pelos imperialistas americanos e europeus e a serviço desses, como demonstrou o economista Joseph Stiglitz.

Isolamento dos EUA

Apesar dos apelos e das pressões, os EUA acabaram isolados, na companhia do Japão e Canadá. Certamente os interesses financeiros falaram mais alto, o dinheiro é sempre mais atraente e convincente que as ideologias. Veja como o "Financial Times" descreveu e analisou o inusitado acontecimento, em matéria assinada pelos jornalistas Lionel Barber, David Piling e Jamil Anderlini:

Até janeiro, nenhum país ocidental parecia disposto a participar de uma instituição que representa um desafio claro à ordem mundial estabelecida e dominada pelos EUA. Mas, desde então, a maioria dos aliados de Washington já declarou sua adesão ao banco”, fato que os jornalistas interpretam, corretamente, como um “exemplo notável de como o poder geopolítico está se deslocando para o Oriente”.

A surpresa maior ficou por conta da Inglaterra, até então tida como aliada número 1 do império. Logo ela, sempre tão fiel e subserviente, foi agora estimular outros governos ocidentais a provar o prazer da infidelidade.

A decisão britânica, no mês passado, de aderir ao AIIB (sigla em inglês do novo banco), apesar dos protestos de Washington, provocou uma corrida de outros aliados europeus e ocidentais que deixou os EUA parecendo imobilizados e isolados. Mesmo altos funcionários americanos descreveram o episódio como uma surpreendente vitória diplomática de Pequim” (Leia a íntegra no Valor Econômico).

Luta pela hegemonia

Parece que estamos presenciando um episódio singular da luta pela hegemonia geopolítica do globo, o que é um desdobramento natural das extraordinárias transformações econômicas em curso no mundo ao longo das últimas décadas como resultado de duas leis que caracterizam o movimento da histórica em nossa época: o desenvolvimento desigual das nações e o parasitismo econômico das potências capitalistas, que hoje contamina principalmente os EUA.

A China conquistou em 2014 o posto de maior economia do mundo. Tem um PIB maior do que o dos EUA sob o critério de 'paridade de poder de compra'. Porém, a força e crescente influência da potência asiática no globo não estão associadas diretamente ao PIB.

Derivam de sua exuberante liderança no comércio exterior e são ainda mais disseminadas pela proeminência, a cada dia maior, na exportação de capitais tanto sob a forma de investimentos diretos quanto indiretos.

O próspero país asiático, dirigido pelo Partido Comunista, já não é apenas o banqueiro dos EUA, o maior credor da Casa Branca. Transformou-se, ao mesmo tempo, no grande banqueiro da América Latina, da África, da Ásia, do mundo.

Cautela chinesa

É preciso notar que no mesmo dia em que foi anunciada a adesão de 57 países (o Brasil inclusive) ao novo banco o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, recebeu o jornal inglês "Financial Times" para uma longa entrevista na qual assegurou que a “China não quer subverter a ordem financeira global” e sugeriu que o banco asiático de desenvolvimento foi criado para atuar em sintonia com o "Banco de Desenvolvimento Asiático" (dominado por EUA e Japão).

Não constituiria, portanto, um “claro desafio à ordem mundial” como insinua o diário britânico na mesma matéria em que reproduz as opiniões do premiê.

Não se deve cutucar a onça com vara curta, ensina o ditado. É bem característica e compreensível a cautela do dirigente chinês, que procurou suavizar a repercussão do fato e acalmar os ânimos do poderoso rival que, apesar da decadência econômica, ainda preserva incontestável superioridade na esfera militar.

Durante toda a entrevista, Li absteve-se de se vangloriar e insistiu repetidamente que a China não tem nenhuma intenção de criar uma nova ordem mundial”, comentaram os jornalistas.

Resignação ou guerra?

Os estrategistas estadunidenses consideram que o maior desafio do império, na atualidade é, precisamente, conter a ascensão da China. Mas a cada dia que passa vai ficando mais evidente que isso não será possível pela via do desenvolvimento pacífico da economia. O comportamento das economias nacionais é determinado por leis objetivas, indiferentes a vontades individuais e mesmo às políticas governamentais (sujeitas a limites e restrições fiscais). Não fosse assim, as crises do capitalismo seriam facilmente contornadas ou corrigidas.

O parasitismo que grassa nos EUA (e se traduz nas dívidas), contaminando toda sociedade e influenciando negativamente o ciclo de reprodução do capitalismo estadunidense, tornou o declínio econômico irreversível.

Mesmo um conflito comercial de grande proporção (ameaça recorrente) pode ser mais prejudicial aos norte-americanos que aos chineses, dada a reciprocidade dos laços de dependência comercial e financeira que unem as duas potências.

Restam à burguesia estadunidense uma honrosa resignação e a conciliação com a emergência de um novo mundo em que já não terá a hegemonia ou a opção de cair na tentação de uma solução militar. Os conflitos e tensões crescentes em todo o planeta, com destaque para a Ucrânia, o Oriente Médio e o Mar da China, sugerem que, infelizmente, a segunda hipótese não pode ser descartada.

A luta pela paz mundial nunca foi tão necessária, mas tudo indica que humanidade não alcançará a Paz Perpétua imaginada por Kant ou afastará o risco de guerra entre as nações sem antes ajustar as contas com o sistema capitalista e imperialista.

Voltarei ao tema nos próximos artigos."

FONTE: escrito por Umberto Martins, jornalista, colaborador do "Portal Vermelho"  (http://www.vermelho.org.br/noticia/262495-9).

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