domingo, 28 de fevereiro de 2016

"O CAMINHO E O DESASTRE" (por Janio de Freitas, na tucana "Folha")




O caminho e o desastre

Do Jornal GGN:

 "Nas voltas que a política no Brasil dá, voltamos aos 1950. Já passamos por uma democracia reformista, que se tornou um golpe afagado em ditadura militar, e renasceu das cinzas a democracia, um tanto caótica e, agora, voltamos aos anos 1950 com o entreguismo e o golpismo em alta pelas mãos do PSDB. 

O artigo de Janio de Freitas, na [tucana] "Folha" de hoje, traça um panorama de nossa tupiniquim atuação, com o golpismo de volta, bem como o sufocamento da economia. Janio clama por um Congresso mais afeito ao seu trabalho primordial e menos ligado aos seus interesses pessoais. E alerta que crise é fruto da atuação da imprensa, a política e a econômica e a cidadã. 

Leia o artigo a seguir:


Por Janio de Freitas, na Folha de São Paulo" 

"O Brasil experimentou uma democracia frustradamente reformista, passou por golpe de estado, sofreu a tragédia da ditadura militar, voltou à democracia caótica, e chegou. Chegou outra vez aos primeiros anos da década de 1950. O golpismo, o "entreguismo" ameaçador e a "república do Galeão" foram os estigmas daqueles anos. O golpismo volta no estilo PSDB; acompanha-o o "entreguismo" [antinacional] apontado na retirada de pré-sal da Petrobras, aprovada pelo Senado; e a versão civil da "república do Galeão", sob o nome insignificante de "Lava Jato", evidenciam juntos o estágio em que o Brasil de fato está.

Mas, se é desculpável a imodéstia de quem se aproximava da vida de adulto naquela década, o pequeno Brasil que não era então menos discriminatório e menos elitista, no entanto era mais inteligente, culto e criativo, menos incivilizado em suas cidades e muito, muito menos criminal.

O mundo se mediocriza, é verdade. A França o prova e simboliza. Mas o Brasil exagera, iludido por uns poucos e duvidosos avanços econômicos. Como a indústria automobilística, por exemplo, que sufocou os transportes públicos e deformou as cidades, dois efeitos antissociais no sentido menos classista da palavra. A degenerescência entra, porém, em fase nova. E acelerada.

São já os esteios do esboço de democracia a sofrerem investidas corrosivas. Ainda que sob outras formas, são prenúncios de repetição, se não contidos em tempo, dos desdobramentos lógicos que períodos como os anos 50 produzem, historicamente.

É melhor, e é urgente, que se comece a forçar o Congresso a ser menos infiel às suas finalidades institucionais e mais responsável com suas funções, seja em apoio ou oposição ao governo. Muitos poucos estão ali, em especial entre os deputados, para serem parlamentares. Dividem o seu tempo entre ser massa de manobra de interesses alheios e agir por interesses subalternos próprios. Uns e outros cada vez mais contrários à instituição e à democracia pretendida pela maioria do país.

A ministra Cármen Lúcia foi muito aplaudida pela invocação, em seu literário voto por liberdade biográfica, ao bordão "cala a boca já morreu". Ninguém observou que o complemento foi omitido: "quem manda aqui sou eu". O bordão é, na verdade, de extremo autoritarismo. Amputá-lo valeu como definição pessoal.

Mas não é o meio bordão, é o autêntico, realista, que os fatos já justificam: partes do Judiciário e do Ministério Público agem como se respondessem aos direitos civis (e por tabela a quem os defenda): cala a boca já morreu, quem manda aqui sou eu. E mandam mesmo, pela reiteração e pela indiferença, porque as instâncias com autoridade e meios de corrigir as deformações não o fazem, acomodadas no seu próprio poder ou intimidadas pela parcela da sociedade adepta do bordão. E os direitos e a Justiça se esvaem.

Crises políticas não se agravam sem imprensa. Crises econômicas expandem-se menos e menos depressa sem imprensa. Hoje em dia, a imprensa brasileira pratica uma solidariedade de modos com as deformações no Congresso, no Ministério Público e no Judiciário. Assola-a nova onda de relaxamento dos princípios éticos, para não falar em qualidade jornalística. E cresce a cada dia uma grande dívida de autocrítica, para relembrar as responsabilidades dos jornalistas profissionais. Com medo da internet, a imprensa brasileira foge de si mesma.

O Brasil não é bem-vindo aos anos 1950."

FONTE: escrito pelo jornalista Janio de Freitas, no jornal tucano "Folha de São Paulo". Transcrito no "Jornal GGN"  (  http://jornalggn.com.br/noticia/o-caminho-e-o-desastre-por-janio-de-freitas).

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