O jornalista Luiz Carlos Azenha, ex-repórter da TV Globo, publica hoje (30) no seu blog “Vi o mundo”, na coluna “denúncias”, um artigo oportuno e muito bom que inclusive ilustra perfeitamente o comportamento da grande mídia brasileira, bem semelhante ao modo de agir da “grande mídia” do Equador e dos demais países da América Latina, com raras exceções.
Transcrevo o artigo do Azenha (acrescentei subtítulos entre parênteses, para facilitar a leitura):
“CORREA CHAMA JORNALISTAS DE "APÁTRIDAS"; COLÔMBIA VAZA SUPOSTOS DADOS DE COMPUTADOR PARA O NY TIMES”
(MÍDIA BRASILEIRA)
“Costumo dizer que, se houver uma crise entre o Brasil e os Estados Unidos, a mídia brasileira se colocará à disposição do Departamento de Estado americano para oferecer a Washington mais espaço que ao governo brasileiro.
No Equador já está acontecendo. Diante da crise entre o país e a Colômbia, que estão com as relações diplomáticas cortadas, as emissoras de TV privadas locais e os principais comentaristas políticos assumiram a defesa da Colômbia, tanto na repercussão dos acontecimentos quanto na opinião a respeito deles.
O que assistimos hoje no Brasil, em torno de um suposto dossiê, é uma crise artificial criada pela revista Veja, com apoio da Folha, Estadão, TV Globo e adjacências. Esse filme já assistimos no passado. "Especialistas" são convocados para dizer que o governo vai cair, ou que vai perder a eleição, ou que fulana ou sicrano estão fritos. É, essencialmente, uma ação eleitoral defensiva que tem o objetivo de queimar uma possível candidata à presidência da República.
Porém, qual foi a decisão estratégica do governo Lula desde sempre? Buscar uma acomodação com a mídia tradicional, fortalecendo-a com propaganda oficial - na casa dos milhões e milhões de reais. É como dar Biotônico Fontoura àqueles que querem te fazer sangrar. Até agora a estratégia de acomodação deu certo, se considerarmos a mais recente pesquisa de opinião a respeito do governo.
Mas já dá para sentir o afastamento de vários aliados à esquerda do governo Lula. O que dizem? Que o governo é unha-e-carne com a mídia tradicional, que são duas faces da mesma moeda. Mais: que o surgimento de uma mídia independente e plural - baseada em rádios e TVs comunitárias, em sites da internet e outros meios - não interessa ao governo Lula, uma vez que ele ficaria sujeito a críticas à esquerda”.
(MÍDIA EQUATORIANA)
(...) “O presidente do Equador, Rafael Correa, denunciou publicamente o comportamento de alguns jornais de seu país, como o El Telégrafo”.
O jornal equatoriano El Comercio minimizou a denúncia do presidente com um parágrafo: "É uma pena que haja estes apátridas, que em seu papel de comunicadores apóiam a conduta do governo colombiano", disse. E mais: São "um punhado de apátridas hipócritas".
O que tem acontecido no Equador? A Teleamazonas, por exemplo, uma das principais emissoras de TV do país, reproduz qualquer acusação feita contra o Equador pelo governo da Colômbia, inclusive com uso de imagens das emissoras colombianas RCN e Caracol.
Para efeito de comparação, é o mesmo que, em uma crise entre Brasil e Argentina que leve os países a romper relações diplomáticas, a TV Globo dar cinco minutos no Jornal Nacional para acusações do governo argentino e três para apresentar a defesa do governo brasileiro. Não acredito que a Globo faria isso no caso, mas não tenho qualquer dúvida de que faria se a crise fosse entre Brasil e Estados Unidos, especialmente entre os governos Lula e Bush.
"A TV Equador é a televisão pública do Equador, que os seus filhos poderão ver sem se preocupar, sem o espírito de busca de audiência; asseguramos que será um canal educativo, resgatando os valores, a culinária, com informação veraz e imparcial", afirmou Correa a respeito da TV pública equatoriana, que em breve será inaugurada.
Ele fez acusações tanto contra o ministro de Defesa da Colômbia, Juan Manuel Santos, quanto contra o chanceler daquele país, Fernando Araújo, a quem acusou de promover a propaganda contra seu governo.
(EUA ENVOLVENDO A VENEZUELA COM SUPOSIÇÕES CAPCIOSAS)
ARQUIVOS DIVULGADOS PELA COLÔMBIA MOSTRAM TENTATIVA DA VENEZUELA DE ARMAR REBELDES
A manchete acima foi divulgada neste domingo pelo New York Times, em reportagem assinada pelo correspondente Simon Romero, desde Bogotá.
(Prossegue o NYT)
"Arquivos oferecidos por autoridades colombianas de computadores que eles dizem ter sido capturados num ataque em território do Equador parecem ligar o governo da Venezuela à tentativa de conseguir armas para a insurgência da Colômbia", diz o primeiro parágrafo".
"Autoridades que participam da investigação dos computadores deram ao New York Times cópias de mais de 20 arquivos, alguns dos quais mostram contribuições dos rebeldes à campanha do presidente esquerdista do Equador, Rafael Correa."
"Se certificados, os arquivos ofereceriam uma visão da natureza do mais antigo conflito da América Latina, incluindo a morte de um espião do governo da Colômbia com microchips implantados no corpo, um crime aparentemente cometido pelos rebeldes em seu esconderijo na selva."
Os grifos são meus.
Temos dois problemas com esse tipo de reportagem. Em primeiro lugar, ela é baseada em fonte anônima que tem interesse no conteúdo. Em segundo lugar, o correspondente faz ilações a partir de supostas mensagens contidas em arquivo de computador. Se eu escrevo um e-mail dizendo que pretendo arrecadar 200 mil dólares para a campanha do prefeito Kassab não significa que eu tenha arrecadado o dinheiro, nem que tenha feito a contribuição.
Porém, está lá no texto a respeito dos arquivos que "some of which also showed contributions from the rebels to the 2006 campaign of Ecuador's leftist president, Rafael Correa". Traduzindo: "...alguns dos quais mostram contribuições dos rebeldes para a campanha de 2006 do presidente esquerdista do Equador, Rafael Correa."
Em nome da verdade factual, o Simon Romero deveria ter escrito que houve referência, em suposta troca de mensagens, a uma possível contribuição.
No quinto parágrafo do texto: "Embora tenha sido impossível verificar a autenticidade dos arquivos, as autoridades colombianas disseram que seu governo havia convidado a Interpol para analisá-los. As autoridades não quiseram se identificar alegando que a investigação da Interpol está em andamento."
De acordo com a reportagem, um total de 16 mil arquivos foram recuperados. O vice-presidente da Colômbia, Francisco Santos, disse que os laptops sobreviveram ao bombardeio porque estavam protegidos por caixas de metal.
"Pessoalmente eu não me arrependo de nada, de absolutamente nada, mas eu sou ministro de um governo que concordou que esse tipo de ação não seria repetido", disse o ministro de Defesa da Colômbia, Juan Manuel Santos. "Naturalmente isso depende de nossos vizinhos colaborarem na luta contra o terrorismo", afirmou.
"A principal arma que eles têm agora é o computador, o suposto computador de Raúl Reyes", disse Hugo Chávez a respeito. "O computador é como serviço à la carte, dando a você o que você quiser. Quer bife? Peixe frito? Bem passado? Você terá o que o império decidir", afirmou.
De acordo com uma carta que teria sido encontrada no computador, datada de 25 de janeiro de 2007, um dos integrantes do secretariado de sete membros das FARC, Iván Marquez, teria se referido a um certo Carvajal dizendo que "ele foi embora com a promessa de que traria um vendedor de armas do Panamá."
Carvajal, de acordo com o New York Times, seria o general Hugo Carvajal, diretor de inteligência militar da Venezuela.
"A divulgação dos arquivos acontece em um momento delicado, quando alguns legisladores em Washington estão pressionando para que a Venezuela seja incluída na lista de estados que patrocinam o terrorismo. Mas com a Venezuela entre os maiores fornecedores de petróleo dos Estados Unidos, tal decisão é considerada improvável por causa dos limites no comércio que imporia", diz o texto do New York Times.
De acordo com outro dos arquivos divulgados pelo jornal, há suposta correspondência de 21 de novembro de 2006 que menciona uma contribuição de 100 mil dólares das FARC à campanha de Rafael Correa.
O ‘Times’ também fala do registro, em um dos computadores de Raúl Reyes, de correspondência entre ele e o número um das FARC, Manuel Marulanda, sobre uma espiã do governo da Colômbia que teria sido descoberta com dois microchips implantados no corpo, um sob um dos seios e outro sob o queixo. A espiã teria sido executada.”
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