segunda-feira, 28 de setembro de 2009

GARCIA: EUA PODERIAM ATUAR MAIS EM HONDURAS

por Diego Salmen, em Terra Magazine

"A crise em Honduras poderia ter um desfecho diferente caso os Estados Unidos decidissem aplicar "constrangimentos maiores" ao governo golpista. A avaliação é de Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência da República para Assuntos Internacionais.

- Se os Estados Unidos decidissem aplicar constrangimentos maiores a Honduras, isso teria um impacto muito mais forte.

Em entrevista a Terra Magazine, o professor Marco Aurélio nega que o Brasil tenha agido deliberadamente ao abrigar o presidente destituído de Honduras, Manuel Zelaya, em sua embaixada no país centro-americano.

Nega, também, que a motivação por trás dessa postura seja a tentativa de garantir uma vaga no Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas). "A evolução dos acontecimentos é que levou o Brasil a ter um protagonismo e uma visibilidade maiores", diz.

Confira a entrevista.

Terra Magazine - O presidente Lula diz que o Brasil não vai aceitar "ultimato de golpistas". Mas como lidar com essa ameaça sabendo que Michelleti tem o poder de fato no país?

Marco Aurélio -
Ele tem o poder de fato, mas se ele... Ele já declarou que não pretende invadir a embaixada. E se invadir ou realizar qualquer ato de hostilidade maior, evidentemente que ele estará exposto às sanções do Conselho de Segurança da ONU.

O Brasil retaliaria unilateralmente, caso isso ocorresse?

Nós já retaliamos, não unilateralmente, mas multilateralmente. Nós suspendemos financiamentos, toda a ajuda financeira, passamos a exigir vistos para eles... É claro que aí nós procurariamos acentuar sanções multilaterais, e é um país que não tem condições de se sustentar por muito tempo sozinho. Ele já está numa situação bastante difícil.

Até por isso o senhor não acha que os EUA, por terem mais poder, poderiam ter uma participação maior na restituição de Zelaya?

Sem dúvida nenhuma. Se os Estados Unidos decidissem aplicar constrangimentos maiores a Honduras, isso teria um impacto muito mais forte.

O Brasil tem alguma preocupação com as declarações de Zelaya incitando à desobediência civil no país?

Não, o governo brasileiro já pediu para o Zelaya se abster de fazer declarações, evidentemente para não criar uma situação constrangedora para ele mesmo. Nós não queremos transformar a embaixada brasileira num escritório político, mas eu acho que ele vai seguir essa orientação.

Neste fim de semana o presidente Lula se reuniu, na Cúpula América do Sul-África, com personalidades como Muammar Kadafi (presidente da Líbia) e Robert Mugabe (presidente do Zimbábue), consideradas ditadores pela comunidade internacional. Isso não enfraquece a postura pró-democracia do Brasil em relação a Honduras?

Não... Veja bem: nós estamos observando na África e de uma maneira geral um movimento muito forte não só de recuperação econômica, mas também de recuperação da democracia. Nossa posição não é de nos imiscuir em questões políticas internas de outros países.

E em Honduras?

No caso de Honduras, foi um recurso internacional, generalizado e o tema foi tratado em primeiro lugar na OEA. Nós tratamos inclusive com muito cuidado; em um primeiro momento, havia alguns dizendo que o Brasil não estava fazendo o suficiente, estavam querendo que nós tivéssemos uma atitude mais adequada para o momento. De maneira geral, nós temos uma política, diante desses fenômenos, sobretudo em áreas mais distantes da nossa, de não pregar políticas de isolamento e constrangimento, muito pelo contrário: buscamos, pela persuasão, fazer com que essas situações melhorem.

Mesmo no caso de Mugabe, o ministro Celso Amorim já havia estado lá há alguns meses, manteve contatos com ele e com a oposição, e hoje há uma situação um pouco diferente. Há um acordo (de Mugabe) com a oposição. É um processo de caráter mais democratizante no país.

O senhor acredita que essa postura do Brasil na crise em Honduras ajudará o país a pleitear uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU?

Em primeiro lugar, não é isso que está nos movendo. O pessoal tem que perder a mania de achar que é isso o que está nos movendo, de maneira nenhuma. Não é essa a preocupação. Nós tinhamos uma atitude muito moderada no caso de Honduras, e até discreta. Isso ganhou uma visibilidade a partir do momento em que o Zelaya, o presidente constitucional, bateu às portas da embaixada brasileira pedindo proteção.

E evidentemente o Brasil não poderia deixar de oferecer essa proteção, sobretudo se tratando do presidente constitucional. Se fosse outro caso, nós poderíamos adotar uma norma mais estrita de asilo. A evolução dos acontecimentos é que levou o Brasil a ter um protagonismo e uma visibilidade maiores, e não uma ação deliberada da nossa parte."

FONTE: publicado hoje (28/09) pelo portal Terra Magazine, do jornalista Bob Fernandes. Reproduzido, também, no portal "Vi o mundo".

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