"Fizemos tudo para que não ocorra um apagão aéreo neste final de ano"
Entre os investimentos para 2010, estão a ampliação da frota em três aviões e a possibilidade de o cliente usar a internet
Se a chuva não atrapalhar, o movimento nos aeroportos neste final de ano deve ser intenso, mas sem riscos de apagão. "Fizemos tudo o que está ao nosso alcance para que não haja apagão", afirma o presidente da Gol, Constantino de Oliveira Júnior.
Apesar dos gargalos nos aeroportos, a Gol planeja grandes investimentos para 2010.
Além de aumentar a frota em 3 aviões, para 111 jatos, a companhia vai começar a oferecer acesso à internet. Também estão previstas uma total reformulação do site da companhia, que passará a funcionar como um portal de turismo, e a inauguração de duas novas lojas populares, para vender bilhetes para a baixa renda.
A seguir, trechos da entrevista à Folha.
FOLHA - Qual a chance de apagão neste fim de ano?
CONSTANTINO JÚNIOR - Fizemos tudo o que está ao nosso alcance para que não haja apagão. Criamos um plano de contingência bastante abrangente, com quatro aeronaves reservas.
Colocamos pessoal extra nos aeroportos, no atendimento e no call center. Estamos com redundância tripla na infraestrutura de comunicação e de energia elétrica. Mas não posso garantir 100% de que não haverá tumulto. Situações meteorológicas adversas sempre podem gerar algum transtorno.
FOLHA - Muito se tem falado sobre as deficiências na infraestrutura dos aeroportos. Como isso tem limitado o crescimento do setor?
CONSTANTINO - Até o ano passado, só Congonhas [SP] operava com restrição. Recentemente, Guarulhos [SP] também chegou ao limite. Mas estamos buscando alternativas para continuar ampliando a oferta de voos de e para São Paulo. Uma possibilidade é a transferência de conexões e escalas para outros centros, como Galeão [RJ], Confins [MG] e Brasília [DF]. Hoje 40% dos passageiros que decolam de Congonhas ou de Guarulhos estão em conexão ou escala. A tendência é reduzir isso paulatinamente, abrindo espaço para mais voos diretos. Mas isso não resolve.
FOLHA - Vai ser preciso um terceiro aeroporto em São Paulo?
CONSTANTINO - Sim. Na minha visão, o terceiro aeroporto deveria ser o de Viracopos [Campinas, SP], com a ampliação da sua capacidade. Mas é imprescindível investir no trem de acesso ao aeroporto para quem sai de São Paulo. O governo tem perfeita noção de quais investimentos são necessários.
FOLHA - Mesmo com todo o impasse entre a Infraero e o TCU (Tribunal de Contas da União), o sr. acredita que as obras vão acontecer a tempo para a Copa do Mundo de 2014?
CONSTANTINO - A Infraero nos trouxe até aqui. Qualquer solução não precisa excluir necessariamente a Infraero. A Infraero tem uma engenharia forte, conhece as necessidades, mas vem enfrentando problemas relacionados à fiscalização. É preciso trazer o TCU para o lado da mesa, para que os processos andem. Recurso tem, conhecimento existe e vontade também.
FOLHA - Mas, quando o TCU barra alguma obra, é porque tem alguma irregularidade, não?
CONSTANTINO - Não estou dizendo que o TCU deve aceitar irregularidades nem estou falando em anistia. Mas é preciso buscar uma solução que permita destravar. Não sei dizer qual.
FOLHA - A Gol encostou na TAM em participação no mercado doméstico, com 42% ante 44%, segundo a Anac. A Gol passará a TAM?
CONSTANTINO - A liderança de mercado não faz parte das nossas metas. Queremos liderar a preferência dos passageiros e melhorar ainda mais as nossas operações.
FOLHA - Com os aviões cheios, a classe C se transformou na mais nova fronteira para as companhias aéreas. O que a Gol está fazendo para atrair esse público?
CONSTANTINO - Existem 11 milhões de brasileiros que poderiam voar e não voam. Para esse público, criamos em 2005 o VoeFácil, programa de parcelamento de passagens. Hoje, 4% dos tíquetes vendidos são pelo VoeFácil. Desses, 70% são classe C e 10%, classe D. Para 2010, queremos tornar essa ferramenta mais poderosa, com análise de crédito mais rápida, mais flexibilidade no pagamento. Só depois poderemos partir para uma mídia de massa.
FOLHA - O VoeFácil não faz da Gol uma financeira? Não seria melhor deixar isso para um banco?
CONSTANTINO - O fato de investirmos no VoeFácil não nos inibe de fechar parcerias com bancos para financiar as passagens. Mas o racional é diferente de uma financeira. Estamos concedendo crédito para a pessoa utilizar um assento que eventualmente sairia vazio. Se você compra uma passagem de R$ 100, eu não te dou R$ 100, te dou um assento. Tenho desembolso se te transportar e você não pagar.
FOLHA - A Gol inaugurou na semana passada uma loja popular no largo 13 de Maio, em São Paulo. Tinham planos de botar um exército de vendedores oferecendo passagem na periferia. Esse modelo não funcionou?
CONSTANTINO - Não desistimos do vendedor, ainda temos alguns ativos, mas percebemos que não dá para massificar com um discurso só. Pretendemos abrir mais duas lojas em caráter exploratório. O "x" da questão é como chegar a esse público. A aviação é um universo que não faz parte da vida dessas pessoas.
FOLHA - Dá para massificar a baixa renda e ao mesmo tempo querer atrair o passageiro corporativo?
CONSTANTINO - Tem de ter atratividade para os dois lados. Dificilmente você vai ver um cliente VoeFácil ao lado de um Smiles Diamante, que costuma viajar nos horários de pico. A nova classe média é altamente sensível a preço e se adapta aos horários em que as tarifas são mais baratas. Para o corporativo, temos o Smiles, com parcerias internacionais. Estamos investindo em mobilidade, no check-in pelo celular.
FOLHA - Quais os investimentos previstos para 2010?
CONSTANTINO - Vamos trazer 12 novos aviões, mas 9 são substituições. Também estamos preparando uma total reformulação do nosso site, que vai virar um portal de viagem. Vamos oferecer diretamente todos os produtos turísticos que já oferecemos hoje por meio de links: hotel, ingressos, aluguel de carro. E com a possibilidade de pagar tudo em uma única fatura.
FOLHA - Obviamente o site vai gerar receitas adicionais. Qual o peso das receitas adicionais hoje?
CONSTANTINO - Representam 14% das receitas, sendo que 4% são de carga. Nosso projeto é chegar a 20% em cinco anos. Pode parecer pouco ambicioso, mas estamos prevendo, naturalmente, que a demanda por passagens vai crescer.
FOLHA - Qual serviço tem mais potencial de gerar receita?
CONSTANTINO - O site acho que é o fundamental. O VoeFácil vai gerar receita financeira de juros. Pretendemos aumentar a venda de milhas para os parceiros do Smiles. O "buy on board" (venda de lanche a bordo) está em fase de aprendizado, mas tem muito para crescer. A questão é acertar a quantidade de cada pedido. Estamos investindo em um sistema que vai permitir gerenciar isso com mais eficiência.
FOLHA - E os planos de oferecer acesso à internet nos voos?
CONSTANTINO - Isso vai começar no decorrer do ano que vem. Estamos fazendo um investimento importantíssimo no Acars -sistema de controle operacional por satélite que vai permitir também gerar entretenimento de bordo. Não definimos ainda se vai ser internet aberta ou intranet restrita. O sistema permite também trocar SMS. Ainda não decidimos quem vai pagar pelo serviço, se o cliente ou se um patrocinador. Devemos ter essas definições até o fim de janeiro.
FOLHA - A empresa tem parceria com a Air France-KLM e com a American Airlines. Tem alguma nova parceria para anunciar em 2010?
CONSTANTINO - Estamos buscando parceiros nos EUA, na Europa, na Ásia e no Oriente Médio. Mas não posso anunciar ainda. [A Folha apurou que uma aliança será com a Delta.]
FOLHA - A Gol fez um acordo que permitiu à Flex voltar a voar. Por que ajudar a velha Varig?
CONSTANTINO - O fretamento do avião da Flex visa um objetivo comercial de curto prazo. Cumprimos 100% com a obrigação com o plano de recuperação.
FOLHA - Ninguém faz caridade. É importante manter a Flex viva para não haver sucessão de dívidas?
CONSTANTINO - Não estamos alugando pura e simplesmente para manter a Flex viva. Pagamos um preço justo.
FOLHA - Sem encontro de contas com a União, os trabalhadores vão tentar -como vêm tentando- reaver seus créditos com a Gol?
CONSTANTINO - E vamos mostrar que cumprimos os compromissos e empregamos muita gente. Não tínhamos a pretensão de resolver os problemas da Varig quando adquirimos a VRG. Uma linha clara separa os dois mundos. Estou tranquilo. Não é que não exista o risco. Mas seria praticamente jogar no lixo a nova lei de recuperação.
FOLHA - O seu pai se envolveu em alguns episódios de escândalos políticos em Brasília. Isso atrapalha a imagem da Gol?
CONSTANTINO - A questão do meu pai é particular. Ele nunca foi acionista da Gol, foi presidente do conselho. É meu pai e, como pai, tem grande influência na minha formação. Mas não tem participação direta na Gol e deixou o conselho em abril de 2008. Participa como chefe de família, não como empresário. O meu pai tem a independência dele, tem seus negócios, toca a sua vida."
FONTE: reportagem de Mariana Barbosa publicada na Folha de São Paulo de hoje (24/12).
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