quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

BRICS NÃO AMEAÇAM HEGEMONIA DOS EUA, DIZ ‘PAI’ DA [NEFASTA] TEORIA DO NEOLIBERALISMO

Joseph Nye Jr. é um dos mais "importantes" [i.é., dos mais badalados pela direita, bancos,"mercado"] teóricos globais das relações internacionais

Por Rogerio Wassermann, da BBC Brasil, em Londres

“Dez anos após a criação do acrônimo BRIC, os países do grupo não formam bloco coeso e não são capazes de criar aliança para ameaçar a hegemonia dos Estados Unidos no mundo, na avaliação de um dos mais importantes teóricos das relações internacionais.

Joseph S. Nye Jr., atual professor emérito da escola de governo da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, é o cofundador da [funesta] "teoria do neoliberalismo" e criador do conceito de "soft power", que define a capacidade de um país atingir seus objetivos por meio da influência de seus valores, cultura e política, em lugar do uso da força militar.

Para ele, os países do grupo são capazes de rivalizar pontualmente com os Estados Unidos de maneira individual, como no caso da crescente influência brasileira sobre a América Latina, mas não representam contraponto real aos americanos como um bloco, por conta das diferenças de interesses entre seus membros.

"Se a questão é se eles podem criar uma aliança contra os Estados Unidos, um bloco coeso, a resposta é não", disse ele em entrevista à BBC Brasil.

O acrônimo BRIC foi criado há dez anos pelo britânico Jim O’Neill, então economista-chefe do banco Goldman Sachs, incluindo Brasil, Rússia, Índia e China, os quatro gigantes com crescimento econômico acelerado. Posteriormente, o grupo foi institucionalizado pelos países, com a entrada posterior da África do Sul (o "s" acrescentado ao final do acrônimo), neste ano.

Nye, que foi secretário-assistente de Defesa no governo Bill Clinton, vê a Rússia como peça anômala no grupo, por ser "uma força em decadência, não emergente", e afirma que Brasil e Índia têm mais capacidade de exercer "soft power" do que a China, a maior economia e maior força militar do grupo, por serem países democráticos.

Para ele, os BRICS não vão acabar, mas terão papel limitado como "uma organização frouxa para coordenação diplomática".

Leia a seguir a entrevista concedida por Nye à BBC Brasil, por telefone:

BBC Brasil - Os BRICS podem representar uma grande força política global?

Joseph S. Nye Jr. - Não creio que possam ser uma grande força como uma organização coesa. Os interesses dos países são bem diferentes entre eles quando analisamos os detalhes.

Acho que individualmente, a China, a Índia e o Brasil terão papéis muito importantes. Já a Rússia, não creio que realmente pertença a esse grupo. A Rússia é uma força em decadência, não uma força emergente.

BBC Brasil - E individualmente, eles são capazes de rivalizar com os Estados Unidos em termos de dominação mundial?

Nye - O papel da China do leste da Ásia é comumente visto como um desafio à presença americana no Mar do Sul da China. Se olharmos para o Brasil, o país quer ter sua própria influência sobre a América do Sul, para contrapor à influência dos Estados Unidos.

Mas se a questão é se eles podem criar uma aliança contra os Estados Unidos, um bloco coeso, a resposta é não.

Há diferenças muito profundas, por exemplo, nos interesses da Índia e da China. A Índia está muito contente em ter boas relações com os Estados Unidos para conter o poder crescente da China.

BBC Brasil - Pode haver algum outro grupo de países emergentes que poderiam criar um grupo coeso para se contrapor aos Estados Unidos?

Nye - Depende do que considerarmos por ‘desafiar’. Se falarmos em um grupo de países capazes de se unir na ‘Organização das Nações Unidas’ para evitar a aprovação de uma resolução apoiada pelos Estados Unidos, claro. Isso já acontece hoje.

Mas se formos para o outro extremo, será que um grupo de países poderia formar uma aliança militar para rivalizar com o poderio americano? Os Estados Unidos representam quase metade dos gastos militares mundiais. É difícil conceber qualquer outro grupo de países que possam ser capazes, até mesmo de chegar perto, do tipo de gastos militares necessários para rivalizar militarmente com os Estados Unidos.

Então, novamente, depende do que consideramos ‘desafio’. Em um sentido, isso já existe, mas em outro sentido isso não parece muito provável.

BBC Brasil - Os BRICS são capazes de transformar o aumento da importância econômica em ‘soft power’?

Nye - Muitos desses países já dispõem de ‘soft power’ e estão interessados em aumentá-lo. O Brasil tem ‘soft power’, que vem de sua cultura e seu sucesso crescente. A Índia tem a indústria de cinema de Bollywood, que é bastante impressionante.

Na China, o presidente Hu Jintao já disse que o país deveria aumentar seu ‘soft power’. O governo chinês está investindo bilhões de dólares para isso.

Mas o Brasil tem uma vantagem, como tem a Índia, de ser democrático e, portanto, ser capaz de usar sua sociedade civil para gerar ‘soft power’.

A China tem o problema de ser autocrática, o que significa que, quando eles tentam aumentar seu ‘soft power’, eles normalmente tentam fazer de sua própria maneira.

Um bom exemplo disso foi quando prenderam Liu Xiaobo e o impediram de ir à cerimônia de entrega do Prêmio Nobel da Paz. Então todos viram a cena pela televisão, no mundo todo, da cadeira vazia em Oslo. Mas isso tira ‘soft power’, em vez de construí-lo.

BBC Brasil - A atual crise na União Europeia pode criar um vazio no balanço global de forças que possa ser preenchido pelas nações emergentes?

Nye - Acho que os países emergentes aumentarão sua influência independentemente do que acontecer com o euro. Países como a China, a Índia e o Brasil vão aumentar sua parcela do produto mundial se o euro se mantiver ou não. Mas particularmente, se o euro entrar em colapso, o primeiro efeito disso seria provavelmente o fortalecimento do dólar, não do yuan ou de qualquer outra moeda de país emergente.

O colapso do euro, se acontecer, provavelmente vai fazer com que os investidores, em busca de um refúgio seguro, se voltem ainda mais para o dólar do que para moedas de países emergentes.

BBC Brasil - Que futuro o Sr. vê para os BRICS?

Nye - Acho que há futuro para os BRICS como organização frouxa para coordenação diplomática. Há algumas questões sobre as quais é conveniente para eles se sentarem juntos para conversar sobre a coordenação de uma posição.

Mas o problema que eu vejo com os BRICS é que, ao ir além desse nível, você vê que há interesses bem diferentes entre os países.

Por exemplo, o Brasil e a China têm visões diferentes sobre o valor do yuan (a moeda chinesa). O Brasil está descontente com a política chinesa de manter sua moeda desvalorizada. O país não gosta de falar muito sobre isso, porque não quer destruir o clima das reuniões dos BRICS. Mas há uma diferença clara de interesses aí.

BBC Brasil - O Sr. acredita que essas tensões internas entre os países, como também no caso das demandas de Índia e China por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, possam levar ao desmantelamento do grupo?


Nye – Não acho que ele possa acabar, porque é conveniente para alguns fins diplomáticos. Mas seu exemplo do ‘Conselho de Segurança’ parece ser um bom exemplo do porquê o grupo não deve se desenvolver além disso.”

FONTE: reportagem de Rogerio Wassermann, da agência britânica de notícias BBC (BBC Brasil, em Londres)  (http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/11/111125_joseph_nye_brics_rw.shtml). Transcrita no jornal O Globo e no blog do Noblat  (http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2011/11/29/brics-nao-ameacam-hegemonia-dos-eua-diz-pai-do-neoliberalismo-419070.asp).[título e trechos entre colchetes adicionados por este blog 'democracia&política'].

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