“Todo mundo conhece a história do
bode na sala.
Sua conclusão é que, às vezes, para
resolver um problema, é preciso criar artificialmente outro maior. Como o da
família que vivia apertada em uma casa minúscula. Ela foi se aconselhar com um
sábio e ouviu a recomendação de colocar na sala um bode.
A vida tornou-se insuportável.
Voltaram ao ancião, que mandou tirá-lo de lá.
Ficaram tão contentes livrando-se do
problemão que o anterior virou um probleminha. Pararam de lamentar o
desconforto da casa acanhada e festejaram.
Uma parte das oposições brasileiras
parece estar raciocinando dessa maneira em relação ao julgamento do “mensalão”.
Não é que inventaram um bode, talvez
imaginando que ganhariam alguma coisa retirando-o?
É o que parece quando se vê a ânsia
com que alguns colunistas e comentaristas se puseram a elucubrar sobre um fato
até ontem inexistente.
O pretexto foram as declarações do
advogado do ex-deputado Roberto Jefferson perante o Supremo Tribunal Federal,
ao defendê-lo.
Como se não bastasse a histrionice
de seu cliente - notável, entre outras coisas,
por já haver apresentado meia dúzia de versões contraditórias sobre algo que
batizou e depois assegurou que nunca existira - o personagem aproveitou
seus minutos de visibilidade nacional para “denunciar” o ex-presidente Lula.
É evidente que Lula pode ser
questionado, como qualquer cidadão, independentemente do cargo que ocupou.
Tanto que já o tinha sido, nessa mesma Corte que havia avaliado a consistência
do que fora alegado contra ele e deliberado que não justificava qualquer
providência.
O disparate do gesto é evidente. O
que o advogado fez foi apenas exibir sua ignorância a respeito das regras do
julgamento de que participava - e com
retórica medíocre.
Pior, no entanto, foi perceber como
algumas redações receberam seu rompante.
Os defensores dos demais réus, que
cumpriram seu papel com respeito ao Tribunal e aos compromissos profissionais
básicos, foram ridicularizados quase unanimemente, como se fosse absurdo que
lutassem pelos clientes.
O único advogado que resolveu jogar
para a plateia teve um dia de herói. Fez a pauta de muitos “analistas sérios”.
Quem se ancora em gente desse
calibre mostra que anda pobre de argumentações.
Mas a extemporânea volta da
discussão a respeito de Lula acaba por revelar outra coisa. Que aqueles que
apostavam que o julgamento do “mensalão” o desgastaria, assim como a Dilma e a
seu partido, agora temem pela fragilidade da denúncia.
Nas pesquisas eleitorais
disponíveis, não se percebe prejuízo para os candidatos petistas - ou vantagem para os adversários - causado
por esse motivo, passadas já três semanas do início. Como se vê, por exemplo,
em São Paulo, onde, por enquanto, Serra míngua e Haddad cresce.
Se a denúncia da Procuradoria-Geral
só fica em pé graças a muito anabolizante de mídia, se nada indica que afete
grandemente as eleições municipais, o que resta?
Pôr um bode na sala. Reaquecem uma
acusação contra Lula, imaginando que, para “protegê-lo”, o “lulopetismo”
ofereça a cabeça dos acusados.
Duplo erro. Nem Lula precisa disso,
nem existe alguém que queira fazer a negociação.”
FONTE: escrito por Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto
Vox Populi. Publicado no blog do Noblat do jornal “O Globo” (http://oglobo.globo.com/pais/noblat/post.asp?cod_post=461001&ch=n) [Imagem obtida no Google e
adicionada por este blog ‘democracia&política’].
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