Protesto contra Obama no Paquistão
Por Robert Fisk, jornalista inglês, no “The Independent”
“OK, então lá vai o que o presidente Barack Obama deveria dizer em discurso sobre o Oriente Médio: “Vamos sair amanhã do Afeganistão. Vamos sair amanhã do Iraque. Vamos parar de dar apoio covarde incondicional a Israel. Os EUA forçarão os israelenses a pôr fim ao sítio de Gaza. Suspenderemos todos os fundos que Israel espera receber, até que acabe, completamente, sem condições, a construção de colônias em terras roubadas aos árabes que nunca pertenceram a Israel.
Poremos fim a todos os negócios e cooperação com os ditadores viciosos do mundo árabe –seja saudita, sírio ou líbio– e apoiaremos a democracia também nos países nos quais os EUA [não] têm interesses comerciais massivos. Ah! E, sim, conversaremos com o Hamas, claro”.
Evidentemente, o presidente Obama não dirá nada disso. Arrogante e covardemente, só falará sobre os “amigos” que o ocidente teria no Oriente Médio, sobre a segurança de Israel –e “segurança” é palavra que Obama jamais usou ao falar da Palestina– e enrolará e enrolará sobre a “Primavera Árabe”, como se, algum dia, tivesse dado algum apoio a alguma democracia no Oriente Médio (antes, claro, de os ditadores já estarem em fuga); como se –quando mais precisaram do apoio de Obama– Obama tivesse oferecido a ajuda moral de sua autoridade ao povo do Egito. E que ninguém duvide: Obama falará também muito sobre um grande Islã religioso (mas nunca muito grande, senão os Republicanos recomeçam a exigir a certidão de nascimento de Barack Hussein Obama). Temo que ouçamos também – ah, sim, temo! – um convite-comando para que viremos a página de Bin Laden, para “dar o assunto por encerrado” e “seguir avante” (convite-comando que, também temo, o Talibã não aceitará).
Mr. Obama e sua igualmente desfibrada secretária de Estado não têm ideia do que enfrentam no Oriente Médio. Os árabes perderam o medo. Estão fartos de nossos “amigos” e enojados de nossos inimigos. Breve, os palestinos de Gaza marcharão sobre as fronteiras de Israel e exigirão o direito de “voltar para casa”.
No domingo, já se viram sinais disso nas fronteiras da Síria e do Líbano. O que farão os israelenses? Matarão palestinos aos milhares? E o que dirá então Mr. Obama? (Claro, exigirá “contenção dos dois lados”, frase que aprendeu do seu torturante predecessor).
Penso que os norte-americanos sofrem do mesmo mal que os israelenses: acreditam cegamente nos seus próprios argumentos de autoengano. Os norte-americanos continuam a falar da bondade do Islã; dos israelenses, de como entendem “a mente árabe”. Mas não entendem coisa alguma. O Islã, como religião, nada tem a ver com isso, como tampouco o Cristianismo (palavra que não tenho ouvido nos últimos tempos) tem algo a ver com isso, ou o Judaísmo. Trata-se agora de dignidade, honra, coragem, direitos humanos –qualidades que, noutras circunstâncias, os EUA sempre elogiam–, que os árabes entendem agora que também lhes cabem. E estão certos. É hora de os norte-americanos livrarem-se do medo que lhes inspiram os lobistas pró-Israel –de fato, são lobistas pró-Likud– e a repugnante acusação de antissemitismo que repetem contra qualquer um que se atreva a criticar Israel. É hora de os norte-americanos aprenderem a ter coragem, como a valente comunidade de judeus norte-americanos que protestam contra as injustiças cometidas por Israel e líderes árabes.
Mas nosso presidente favorito jamais dirá em seu discurso qualquer dessas verdades. Podem esquecer. Não passa de presidente bico-doce, que diz qualquer coisa, e que deveria ter devolvido –esquecemos?– seu Prêmio Nobel, porque nem Guantánamo conseguiu fechar; imaginem se conseguirá construir alguma paz! E o que disse ele no discurso do Nobel? Que ele, Barack Obama, tinha de viver no mundo real; que não é Gandhi... Como se –e honra ao “The Irish Times”, por ter sabido ler– Gandhi não tivesse combatido contra o império britânico! Assim sendo, seremos como sempre ensaboados pelas análises de sempre nos EUA, que elogiarão a fala do presidente, essa conversa fiada miserável.
Depois, virá o fim de semana em que Mr. Obama falará à conferência anual do AIPAC, o mais poderoso “amigo” de Israel nos EUA. E começará tudo outra vez, segurança, segurança, segurança; rápida –se acontecer– referência às colônias israelenses na Cisjordânia; e, isso eu garanto, muitas e muitas referências a terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo. E, sim, mencionará o assassinato (para não usar a palavra execução) de Osama Bin Laden.
Mas o que Mr. Obama não entende –e Mrs. Clinton, essa, então, não faz nem ideia– é que, no novo mundo árabe, já não se trata de confiar em ditadorezinhos e seus asseclas. Que basta de bajulação. A CIA deve andar carregando malas cheias de dinheiro para distribuir, mas suspeito que poucos árabes se animarão a tocar nesse dinheiro.
Os egípcios não mais tolerarão o sítio de Gaza. Nem, creio, os palestinos. Nem, tampouco, os libaneses, e nem os sírios, depois que se livrarem dos chefetes que os governam. Os europeus perceberão antes que os norte-americanos –estamos, afinal de contas, mais próximos do mundo árabe–, e duvido que continuem a admitir que a vida de todos continue a ser guiada pela indiferença acovardada com que os norte-americanos insistem em não ver o roubo de terras de que os israelenses fizeram meio de vida.
Tudo isso, claro, será como deslocamento vertiginoso de placas tectônicas para os israelenses –que deveriam estar elogiando e congratulando-se com os vizinhos árabes e com os palestinos, por se terem reunificado e unificado a causa; e que deveriam estar demonstrando solidariedade e amizade aos vizinhos árabes, em vez de medo. Faz tempo que minha bola de cristal partiu-se. Mas lembro bem do que Winston Churchill disse em 1940: “o que o general Weygand chamou de batalha pela França, acabou. Começa agora a batalha pelo Reino Unido.”
FONTE: escrito por Robert Fisk e publicado no jornal inglês “The Independent”. Transcrito no “Blog do Bourdoukan” e no portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=154817&id_secao=9) [imagem do Google adicionada por este blog].
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