A revista Carta Capital desta semana publica o seguinte texto de Maurício Dias:
ASSINAR O TRATADO DE NÃO-PROLIFERAÇÃO DE ARMAS NUCLEARES FOI UM EQUÍVOCO, DIZ CIENTISTA POLÍTICO
O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos acabou a leitura do livro The Return of History and the End of Dreams (New York, Alfred Knopf, 2008), de Robert Kagan, com uma avassaladora certeza em relação à passagem do tucano Fernando Henrique Cardoso pelo poder (1994 e 2002):
“Ele abdicou de parte da soberania brasileira ao assinar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares. Foi um tremendo equívoco histórico do governo dele.”
Robert Kagan é um personagem que transita no coração do poder nos EUA. Scholar neoconservador, um neocon, é respeitado estrategista internacional. Diretor do Projeto Liderança Americana, da Fundação Carnegie para a Paz Internacional, trabalhou no Departamento de Estado de 1984 a 1988 e foi assessor para política externa de John McCain, no Senado.
Para Wanderley Guilherme, Kagan lança uma das perguntas fundamentais da política internacional contemporânea: “Pode uma nação se considerar uma grande potência no mundo moderno se não é também um membro do clube nuclear?”
“Se o Brasil espera manter sua capacidade de decidir autonomamente o que pode se apresentar como uma ameaça física à sua soberania, que é um ingrediente do próprio conceito de poder de Kagan, precisa refletir sobre essa pergunta. Ela é feita por um dos possíveis estrategistas dos Estados Unidos, independentemente do resultado das eleições presidenciais”, considera Wanderley Guilherme.
E, como ele diz, a resposta à pergunta não significa lançar o Brasil “à aventura de produzir artefatos nucleares”. Situação que, certamente, não interessa ao País, nem econômica nem politicamente.
Wanderley lembra que a adesão ao tratado ocorreu sem maior discussão com o Congresso e “no limite, sem submeter tamanha abdicação de parte da soberania (a de definir autonomamente o que é uma ameaça ao País) a um plebiscito ou referendo”.
Ele explica: “A não adesão nunca significou que o Brasil desejava produzir artefatos nucleares, mas, sim, que não abdicava do direito de decidir, em algum momento, se era de seu interesse nacional produzi-los. O Paquistão e a Coréia do Norte são ouvidos e as cautelosas políticas de todas as nações árabes, em relação a Israel, se devem simplesmente ao fato de que tais nações consideraram de seu interesse de sobrevivência, não a estúpida deflagração de uma suicida corrida armamentista, mas a aquisição de argumentos contra intenções estranhas de desafios aos interesses desses países”.
Wanderley Guilherme lembra que “não é insensato pensar” que, caso o Brasil não tivesse assinado o tratado, as referências na Europa e nos Estados Unidos aos direitos brasileiros sobre a Amazônia “não teriam a petulância e sem-cerimônia” que possuem.
Além da Amazônia, há, agora, o pré-sal. Confirmadas as expectativas, a soberania brasileira sobre faixas oceânicas é outro tópico com elevado potencial de conflito.
Os EUA talvez pensem o mesmo se considerarmos a surpreendente reativação da IV Frota.
“Caso alguma ameaça real se concretize, o Brasil ficará diante da alternativa de não ter como se defender ou violar um tratado que livremente assinou. Em certo sentido, esse foi o mais desastroso legado do governo Fernando Henrique Cardoso”, afirma Wanderley Guilherme.
A solução para remediar essa herança de FHC é difícil, complicada, exige coragem. A saída é denunciar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, como fez a Coréia do Norte.
Esse episódio, por sinal, foi relembrado pelo embaixador Samuel Pinheiro, secretário-geral do Itamaraty. Em 2006, durante o 4º Encontro Nacional de Assuntos Estratégicos, ele disse que “é possível que o Brasil venha a sair do tratado”.
Estimulado por um militar presente ao encontro, Samuel Pinheiro lembrou que a Coréia do Norte denunciou o tratado e retirou-se.
O Brasil e a Índia eram dois emergentes poderosos que não assinaram o tratado. O Itamaraty o considerava, e ainda considera, discriminatório. Mas, em 1998, FHC entregou os pontos.”
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2 comentários:
Realmente foi um erro, pois se não fosse assinado o Brasil poderia intimidar um inimigo (mesmo se não quisesse produzir as armas).
Eu gostaria de saber também se esse acordo influenciará na criação do nosso 1º submarino nuclear, já que um submarino é uma arma de guerra. Se os EUA não quiserem que o Brasil produza o submarino, eles poderão usar desse argumento, e esse é o problema.
Prezado Hugo,
Não creio que os EUA conseguirão argumentos para impedir. Propulsão por reator nuclear, caso do submarino, nada tem a ver com arma nuclear. Tentar impedir, sim, isso tentarão. Boa parte da nossa mídia endossará a campanha contra. Para os EUA, nossas Forças Armadas devem ser apenas polícias de fronteira, garantidoras da ordem interna e frágeis contra ameaças das grande potências.
Maria Tereza
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