Li ontem no jornal Folha de São Paulo o seguinte artigo do ex-ministro Antônio Delfim Netto:
“O preâmbulo da Constituição informa que o povo brasileiro (por seus representantes livremente eleitos) reuniu-se para instituir um Estado democrático destinado a assegurar a sua liberdade, a sua segurança, o seu bem-estar e o seu desenvolvimento com igualdade e justiça... comprometido, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.
Como é evidente, essa magnífica coleção de valores a serem realizados e de objetivos a serem atingidos depende não apenas de nossa vontade mas também do ambiente em que, como nação, estamos inseridos. Num mundo política e economicamente dinâmico, onde a única certeza de hoje é que ela esconde a incerteza de amanhã, isso exige muito mais do que aquela disposição pacifista e de cooperação internacional.
Os últimos 20 anos mostraram:
1º) a desaparição da bipolaridade criada pela Guerra Fria entre EUA e URSS e o grave descumprimento por parte das potências atômicas da promessa de desmontagem de seus arsenais;
2º) a deplorável ineficiência do controle da proliferação atômica, o que tornou incômoda a situação dos países que, como o Brasil, acreditaram nela e a respeitaram. Sob a hipótese de "racionalidade", não sabemos com certeza se a proliferação aumenta ou reduz a probabilidade de conflito (teorema de Brito-Intriligator);
3º) o surpreendente retorno do barbarismo. Temos hoje dez disputas armadas graves no Mundo, e
4º) os riscos produzidos pela "inovação" financeira internacional desregulada, o que prova que há armas de destruição em massa tão sutis quanto as atômicas...
Aceitem ou não nossos estruturais pessimistas, o Brasil já é, com seus defeitos e virtudes, importante protagonista deste mundo incerto. É tempo, portanto, de construir -tanto quanto seja possível- pelo menos três autonomias: a alimentar, a energética e a militar. E construí-las harmonizando-as com os valores e objetivos constitucionais.
Como deve ser claro, eles não são independentes. A ligá-los está um fator que transcende a política internacional e é fortemente condicionado pelo desenvolvimento econômico interno estimulado pelas ciências e pela tecnologia.
É a compreensão dessa profunda interação entre as três autonomias que dá singular importância à Estratégia Nacional de Defesa, que o governo acaba de apresentar à nação.
Ela merece ser cuidadosamente escrutinada. A ligação entre ciência, tecnologia e indústria com a defesa nacional que ela propõe será fator importante e decisivo para o Brasil cumprir bem o seu destino.”
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