COM NOVIDADES NO FRONT
“Os dirigentes políticos da esquerda precisam compreender que o interesse dos veículos de comunicação pela polêmica - por razões comerciais - é muito maior que o interesse por debater os grandes temas, capazes de moldar futuro melhor para o país. Só com a defesa de temas como a reforma política, o verdadeiro e indiscriminado combate à corrupção, a crise européia e o fracasso neoliberal, poderemos nos libertar da sedução dos holofotes e das armadilhas midiáticas, que são colocadas frequentemente só para disputar o “mercado” da notícia.
O artigo é de Tarso Genro.
Tarso
Genro
Ao longo dos últimos dez anos a
disputa de princípios, na esfera da política, tornou-se mais complexa. Os
argumentos tradicionais estão bloqueados por um senso comum formatado por
repetição de [pseudo]“verdades”, cuja aceitação não se fundamenta em fatos ou
provas, mas é criada pelo martelamento permanente, repetitivo, de “informações”
que são passadas como se não precisassem de argumentação minimamente lógica. O
fazer político e o discurso político, hoje, devem partir do pressuposto que o
senso comum já está “trabalhado pela
grande mídia” para formar “pré-conceitos”
sobre todos os temas relevantes do país e do mundo.
Repito o que disse em outras oportunidades: quando falo em “grande mídia”, não estou me reportando a qualquer órgão de imprensa, em particular, nem a um ou outro jornalista, sejam eles manipuladores ou não das informações que transitam nas suas colunas ou matérias. Reporto-me ao produto “matéria informativa”, no mercado da notícia, que é fabricado para ser assimilado pelo senso comum, ou por parte dele, como conjunto que passa a circular de forma dominante, como verdade, na “grande mídia” nacional.
Repito o que disse em outras oportunidades: quando falo em “grande mídia”, não estou me reportando a qualquer órgão de imprensa, em particular, nem a um ou outro jornalista, sejam eles manipuladores ou não das informações que transitam nas suas colunas ou matérias. Reporto-me ao produto “matéria informativa”, no mercado da notícia, que é fabricado para ser assimilado pelo senso comum, ou por parte dele, como conjunto que passa a circular de forma dominante, como verdade, na “grande mídia” nacional.
Assim, Chávez, que ganhou sucessivas
eleições na Venezuela e sofreu uma tentativa de golpe de Estado quase
concretizada, passou a ser um “ditador”.
Lula, que fez o governo mais democrático e avançado do país - em termos de progresso econômico,
distribuição de renda e soberania nacional- nos últimos 50 anos, passou a
ser retratado como um “Presidente tosco,
que teve a sorte de surfar nas boas ondas da economia mundial”. A corrupção
no Estado é apresentada sempre (e quando
ela passou a ser mais combatida e por isso se tornou mais evidente) como
uma “novidade”, ligada principalmente
ao PT (mesmo quando os “sacerdotes da
moralidade pública” são desnudados por inteiro e não são nem do PT, nem da
esquerda).
Ao lado desses macroeventos, alinham-se outros. Por exemplo, a deposição do ministro Orlando Silva, do PC do B, que é exposto cinicamente como participante de um esquema de corrupção, humilhado publicamente pela “grande mídia” perante o país e a sua família, sem qualquer cuidado com a verdade, e sobre o qual hoje não pende nenhum indício de culpa. O serviço - a chacina -, porém, foi feita de forma meticulosa, certamente respondendo a interesses econômicos e políticos obscuros.
Neste momento, a “grande mídia” atravessa período de esforço para a legitimação da deposição golpista do Presidente Lugo. Abre, assim, precedente perigoso no debate sobre o futuro das democracias na América Latina, que lembra os anos 70.
Os métodos são outros, mas os objetivos e os efeitos são os mesmos: travar reformas progressistas e roubar esperanças de mudanças dentro da ordem. Pode, uma maioria parlamentar, -mesmo legítima em termos eleitorais - promover a deposição sumária de um Presidente por “não cumprir adequadamente” as suas funções, sem direito a ampla defesa e sem mesmo um esboço de prova?
Ao aceitarmos como “normal” a deposição do presidente Lugo, qualquer maioria (seja qual for sua posição política) poderá interromper mandatos sem obediência a regras que presidem qualquer Estado Democrático de Direito, estimulando o desapreço do povo à democracia política. A naturalização da deposição de Lugo está sendo meticulosamente trabalhada para passar ao senso comum que ela foi um “ato legítimo”.
Ao lado desses macroeventos, alinham-se outros. Por exemplo, a deposição do ministro Orlando Silva, do PC do B, que é exposto cinicamente como participante de um esquema de corrupção, humilhado publicamente pela “grande mídia” perante o país e a sua família, sem qualquer cuidado com a verdade, e sobre o qual hoje não pende nenhum indício de culpa. O serviço - a chacina -, porém, foi feita de forma meticulosa, certamente respondendo a interesses econômicos e políticos obscuros.
Neste momento, a “grande mídia” atravessa período de esforço para a legitimação da deposição golpista do Presidente Lugo. Abre, assim, precedente perigoso no debate sobre o futuro das democracias na América Latina, que lembra os anos 70.
Os métodos são outros, mas os objetivos e os efeitos são os mesmos: travar reformas progressistas e roubar esperanças de mudanças dentro da ordem. Pode, uma maioria parlamentar, -mesmo legítima em termos eleitorais - promover a deposição sumária de um Presidente por “não cumprir adequadamente” as suas funções, sem direito a ampla defesa e sem mesmo um esboço de prova?
Ao aceitarmos como “normal” a deposição do presidente Lugo, qualquer maioria (seja qual for sua posição política) poderá interromper mandatos sem obediência a regras que presidem qualquer Estado Democrático de Direito, estimulando o desapreço do povo à democracia política. A naturalização da deposição de Lugo está sendo meticulosamente trabalhada para passar ao senso comum que ela foi um “ato legítimo”.
[Senador Demóstenes, o “intransigente em relação à corrupção”, segundo a mídia tentava vender]
Há outro aspecto interessante no
movimento da mídia. Aquele que elege a “personalidade
da vez”. Até há pouco tempo, esse era o Senador Demóstenes, que seria o
contraponto à “herança Lula”. Pela
sua “probidade” e “intransigência em relação à corrupção”,
era considerado também “um modelo
ideológico”, capaz, inclusive, de promover uma pauta bombástica (e falsa),
como aquela que a Polícia Federal estaria gravando diálogos seus com o
ex-presidente do STF, Gilmar Mendes, que, na oportunidade, mostrou-se
justamente indignado.
Ministro da Justiça naquele período, considerando o pedido do ministro Gilmar que presidia o STF, determinei investigação rápida e profunda, que não localizou nenhuma escuta ilegal. Não seria Cachoeira o autor do grampo? Não seria falsa a degravação apresentada? Eis uma investigação suplementar que a PF deveria reabrir neste momento.
Ministro da Justiça naquele período, considerando o pedido do ministro Gilmar que presidia o STF, determinei investigação rápida e profunda, que não localizou nenhuma escuta ilegal. Não seria Cachoeira o autor do grampo? Não seria falsa a degravação apresentada? Eis uma investigação suplementar que a PF deveria reabrir neste momento.
[Senador
Randolfe Rodrigues, o efêmero “instrumento útil” da vez]
Atualmente, a figura mais promovida pela mídia é o senador Randolfe Rodrigues, do PSOL do Amapá. Assim como já foi, em outras oportunidades, a senadora Heloisa Helena, quando as suas diatribes udenistas serviam para a tentativa de desestabilização e promoção do fracasso do primeiro governo Lula. Ela era apontada pela mídia, naquela oportunidade, como “exemplo de coerência política e consciência ideológica da esquerda” e atraiu, pelo seu discurso radical contra Lula, o apoio e o voto de colunistas de jornais conservadores, ex-esquerdistas, que se autoproclamavam autênticos justiceiros do PT.
Buscava o governo, naquele momento difícil - não sem erros - dar estabilidade a uma maioria parlamentar para implementar programa de crescimento econômico e melhoria na distribuição de renda, que hoje orgulha toda a nação. O senador Randolfe, portanto, que se prepare, pois quando ele se ocupar em esboçar alguma defesa coerente do programa socialista do seu partido, será também sumariamente despedido dos grandes noticiários e das colunas que hoje lhe cortejam, à medida que já terá sido devidamente utilizado pela “grande mídia” para que este purgue o seu amor a Demóstenes.
Diante desse cenário, sustento que os partidos de esquerda devem elaborar suas agendas estratégicas não exclusivamente pelo que está sendo retratado ou exigido pela “grande mídia”. A informação, na sociedade democrática, é também parte de uma guerra pelo mercado e a produção da notícia. Nem sempre corteja a verdade, mas quase sempre está orientada pela busca do aumento do número de consumidores da notícia.
Os dirigentes políticos da esquerda precisam compreender que o interesse dos veículos de comunicação pela polêmica - por razões comerciais - é muito maior que o interesse por debater os grandes temas, capazes de moldar futuro melhor para o país. Só assim, com a defesa de agendas autônomas e de interesse público, como a reforma política, o verdadeiro e indiscriminado combate à corrupção, a crise européia e o fracasso neoliberal, poderemos nos libertar da sedução momentânea dos holofotes e não estaremos sujeitos às armadilhas midiáticas, que são colocadas frequentemente só para disputar o “mercado” da notícia. Não para informar e preservar a verdade.”
FONTE: artigo escrito por Tarso Genro, Governador do Estado do Rio Grande do Sul. Publicado no site “Carta Maior” (http://www.carta maior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20588)
[Título, imagens do Google, aspas e trechos entre colchetes adicionados
por este blog ‘democracia&política’].
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