Da Revista “Carta Capital”
“Da natureza do universo (isto é, se
houver apenas uma) à serventia dos sonhos, ainda há muitas coisas que não
sabemos -- mas poderemos saber em breve. Um novo livro procura algumas respostas
Por
Hayley Birch, Colin Stuart e Mun Keat Looi, no “The Observer”
1.
De que é feito o universo?
Os astrônomos enfrentam um enigma
embaraçoso: eles não sabem de que são feitos 95% do universo. Os átomos, que
formam tudo o que vemos a nosso redor, respondem por ínfimos 5%. Nos últimos 80
anos, ficou claro que a maior parte do resto é composta de duas entidades
sombrias -- a “matéria escura” e a “energia escura”. A primeira, descoberta em
1933, age como uma cola invisível, ligando galáxias e aglomerados de galáxias.
Revelada em 1998, a segunda empurra a expansão do universo a velocidades cada
vez maiores. Os astrônomos estão se aproximando das verdadeiras identidades
dessas intermediárias invisíveis.
2.
Como a vida começou?
Há 4 bilhões de anos, alguma coisa
começou a se mexer na sopa primordial. Algumas substâncias químicas simples se
uniram e criaram a biologia – surgiram as primeiras moléculas capazes de se
replicar. Nós, humanos, somos ligados pela evolução àquelas primeiras moléculas
biológicas. Mas como as substâncias químicas básicas presentes na Terra
primitiva se organizaram espontaneamente em algo semelhante à vida? Como
obtivemos o DNA? Qual era a aparência das primeiras células? Mais de meio
século depois que o químico Stanley Miller propôs sua teoria da "sopa
primordial", ainda não chegamos a uma conclusão sobre o que aconteceu.
Alguns dizem que a vida começou em poças quentes perto de vulcões; outros, que
ela foi provocada por meteoritos que caíram no mar.
3.
Estamos sós no universo?
Talvez não. Os astrônomos vasculham
o universo em busca de lugares onde mundos com água poderiam ter dado origem à
vida, de Europa [satélite de Júpiter] e Marte, em nosso sistema solar, a
planetas a muitos anos-luz de distância. Os radiotelescópios têm vigiado o céu,
e em 1977 ouviu-se um sinal com as características potenciais de uma mensagem
alienígena. Hoje, os astrônomos podem rastrear as atmosferas de mundos
distantes em busca de oxigênio e água. As próximas décadas serão um momento
excitante para ser um caçador de alienígenas, com até 60 bilhões de planetas
potencialmente habitáveis só em nossa Via Láctea.
4.
O que nos torna humanos?
Apenas olhando seu DNA, você não
saberá -- o genoma humano é 99% idêntico ao de um chimpanzé e 50% ao de uma banana.
No entanto, temos um cérebro maior que a maioria dos animais – não o maior, mas
com três vezes mais neurônios que o de um gorila (86 bilhões para ser exato).
Muitas coisas que antes considerávamos características nossas – a linguagem, o
uso de ferramentas, reconhecer-se no espelho – são encontradas em outros
animais. Talvez seja a nossa cultura – e suas consequências em nossos genes (e
vice-versa) – que faça a diferença. Os cientistas acreditam que cozinhar e
dominar o fogo podem ter nos ajudado a desenvolver cérebros maiores. Mas é
possível que nossa capacidade de cooperação e troca de habilidades seja o que
realmente faz da Terra um planeta de humanos, e não de macacos.
5.
O que é a consciência?
Ainda não temos realmente certeza.
Sabemos que tem a ver com diferentes regiões do cérebro ligadas em rede, mais
que uma única parte do cérebro. Há uma teoria de que, se descobrirmos que
partes do cérebro estão envolvidas e como funciona o circuito neural,
descobriremos como surge a consciência, algo em que a inteligência artificial e
tentativas de construir um cérebro neurônio por neurônio poderão ajudar. A
questão mais difícil e mais filosófica é por que alguma coisa deve ser
consciente. Uma boa sugestão é que, ao integrar e processar muita informação, além
de focalizar e bloquear, em vez de reagir aos estímulos sensoriais que nos
bombardeiam, podemos distinguir entre o que é real e o que não é e imaginar
diversos cenários futuros que nos ajudem a adaptar-nos e a sobreviver.
6.
Por que sonhamos?
Passamos cerca de um terço de nossas
vidas dormindo. Considerando quanto tempo passamos fazendo isso, você poderia
pensar que sabemos tudo a respeito. Mas os cientistas ainda buscam uma
explicação completa de por que dormimos e sonhamos. Seguidores das opiniões de
Sigmund Freud acreditavam que os sonhos são expressões de desejos não
realizados – muitas vezes sexuais –, enquanto outros se perguntam se os sonhos
são alguma coisa além de disparos aleatórios do cérebro adormecido. Estudos com
animais e os progressos em imagens do cérebro nos levaram a uma compreensão
mais complexa, que sugere que sonhar pode ter um papel na memória, no
aprendizado e nas emoções. Os ratos, por exemplo, repetem em sonhos suas
experiências da vigília, o que aparentemente os ajuda a solucionar tarefas
complexas como percorrer labirintos.
7.
Por que existe matéria?
Na verdade, você não deveria estar
aqui. A "matéria" de que você é feito tem uma contrapartida chamada
antimatéria, que só difere em carga elétrica. Quando elas se encontram, ambas
desaparecem em uma fagulha de energia. Nossas melhores teorias sugerem que o “Big
Bang” criou quantidades iguais das duas, o que significa que toda matéria,
desde então, deve ter encontrado sua antimatéria, as duas destruindo-se e
deixando o universo inundado apenas de energia. Claramente, a natureza tem uma
tendência sutil para a matéria, ou você não existiria. Os pesquisadores estão
peneirando dados de experiências como o “Grande Colisor de Hadrons”, tentando
compreender por que, sendo a supersimetria e os neutrinos os dois principais
candidatos.
8.
Existem outros universos?
Nosso universo é um lugar muito
improvável. Modifique algumas de suas características, mesmo ligeiramente, e a
vida como a conhecemos torna-se impossível. Em uma tentativa de desvendar esse
problema de "sintonia fina", os físicos cada vez mais recorrem à
noção de outros universos. Se existir um número infinito deles em um
"multiverso", então cada combinação de características se
desenvolveria em algum lugar e, é claro, você se encontraria no universo onde é
capaz de existir. Pode parecer loucura, mas evidências da cosmologia e da
física quântica apontam nessa direção.
9.
Onde colocamos todo o carbono?
Nas últimas centenas de anos, temos
enchido a atmosfera com dióxido de carbono – liberando-o ao queimar
combustíveis fósseis que antes trancavam o carbono abaixo da superfície da
Terra. Hoje, temos de colocar todo esse carbono de volta ou nos arriscarmos às
consequências de um aquecimento climático. Mas como podemos fazê-lo? Uma ideia
é enterrá-lo em antigos campos de petróleo e gás. Outra é escondê-lo no fundo
do mar. Mas não sabemos quanto tempo ele permanecerá lá, ou quais seriam os
riscos. Enquanto isso, temos de proteger os estoques naturais e duradouros de
carbono, como as florestas e a turfa, e começar a fazer energia de uma maneira
que não produza ainda mais carbono.
10.
Como conseguimos mais energia do sol?
A redução dos estoques de
combustíveis fósseis significa que realmente precisamos de nova maneira de
movimentar nosso planeta. Nossa estrela mais próxima oferece mais que uma
solução possível. Já estamos controlando a energia do sol para produzir energia
solar. Outra ideia é usar a energia da luz do sol para dividir a água em suas
partes componentes: oxigênio e hidrogênio, que poderia fornecer um combustível
limpo para os carros do futuro. Os cientistas também trabalham em uma solução
energética que depende de recriar os processos que ocorrem no interior das
próprias estrelas -- eles estão construindo uma máquina de fusão nuclear. A
esperança é que essas soluções supram nossas necessidades energéticas.
11.
O que há de tão estranho nos números primos?
O fato de que você pode comprar em
segurança na internet se deve aos números primos – aqueles números que só podem
ser divididos por si mesmos e por 1. A criptografia de chave pública – o
coração do comércio na internet – usa números primos para criar códigos capazes
de isolar a informação delicada de olhares curiosos. No entanto, apesar de sua
importância fundamental em nossa vida cotidiana, os primos continuam sendo um
enigma. Um aparente padrão deles – a “hipótese de Riemann” – intriga algumas
das mentes mais brilhantes da matemática há séculos. No entanto, até hoje
ninguém foi capaz de domar sua originalidade. Fazê-lo poderia simplesmente
destruir a internet.
12.
Como derrotar as bactérias?
Os antibióticos são um dos milagres
da medicina moderna. A descoberta de sir Alexander Fleming, que ganhou o Prêmio
Nobel, levou a remédios que combateram algumas das doenças mais mortíferas e
tornou possíveis a cirurgia, os transplantes e a quimioterapia. Mas esse legado
está em perigo – na Europa, cerca de 25 mil pessoas morrem por ano de bactérias
resistentes a diversas drogas. Nossa produção de medicamentos vem falhando há
décadas e estamos agravando o problema por meio da prescrição excessiva e do
mau uso de antibióticos – estima-se que 80% dos antibióticos nos Estados Unidos
vão para reforçar a pecuária. Felizmente, o sequenciamento do DNA está nos
ajudando a descobrir antibióticos que não sabíamos que as bactérias poderiam
produzir. Juntamente com métodos inovadores, embora pareçam estranhos, como o
transplante de bactérias "boas" da matéria fecal e a busca por novas
bactérias no fundo dos oceanos, podemos continuar firmes nessa corrida com
organismos que surgiram 3 bilhões de anos antes de nós.
13.
Os computadores podem continuar se acelerando?
Nossos ‘tablets’ e ‘smartphones’ são
minicomputadores que contêm mais poder de computação do que os astronautas
levaram para a lua em 1969. Mas, se quisermos continuar aumentando o poder de
computação que carregamos em nossos bolsos, como vamos fazê-lo? Existe número
limitado de componentes que podem ser comprimidos em um chip. O limite já foi
alcançado, ou existe outra maneira de fazer um computador? Os cientistas estão
considerando novos materiais, como carbono atomicamente fino – o grafeno –,
assim como novos sistemas, como a computação quântica.
14.
Encontraremos a cura para o câncer?
A resposta curta é não. Não uma
única doença, mas um agrupamento de centenas de doenças, o câncer existe desde
os dinossauros e, sendo causado por genes descontrolados, o risco está embutido
em todos nós. Quanto mais tempo vivermos, maior a probabilidade de que algo dê
errado, de diversas maneiras. Pois o câncer é uma coisa viva – em constante
evolução para sobreviver. Embora seja incrivelmente complexo, por meio da
genética estamos aprendendo cada vez mais o que o causa e como ele se
dissemina, e aperfeiçoando seu tratamento e prevenção. E saiba disto: até a
metade de todos os cânceres – 3,7 milhões por ano – pode ser evitada; pare de
fumar e beber, e coma moderadamente, mantenha-se ativo e evite a exposição
prolongada ao sol do meio-dia.
15.
Quando poderei ter um mordomo robô?
Os robôs já podem servir bebidas e
carregar malas. A robótica moderna pode nos oferecer uma "equipe" de
robôs individualmente especializados: eles leem suas encomendas na “Amazon”,
ordenham suas vacas, separam seu correio eletrônico e o transportam entre
terminais no aeroporto. Mas o robô realmente "inteligente" exige que
desvendemos a inteligência artificial. A verdadeira questão é se você deixaria
um mordomo robótico sozinho em casa com sua avó. Como o Japão pretende ter
cuidadores robóticos para seus idosos até 2025, hoje pensamos seriamente nisso.
16.
O que há no fundo do oceano?
Noventa e cinco por cento do oceano
ainda não foram explorados. O que existe lá embaixo? Em 1960, Don Walsh e
Jacques Piccard desceram 11 quilômetros, até a parte mais profunda do oceano,
em busca de respostas. Sua viagem ampliou os limites da aventura humana, mas
lhes deu apenas um vislumbre da vida no leito marinho. É tão difícil chegar ao
fundo do oceano que, geralmente, temos de recorrer a veículos não tripulados
como batedores. As descobertas que fizemos até agora – desde peixes bizarros
como o "olho de barril", com sua cabeça transparente, até um
potencial tratamento para Alzheimer feito de crustáceos – são uma pequena
fração do estranho mundo que se esconde sob as ondas.
17.
O que há no fundo de um buraco negro?
É uma pergunta que ainda não temos
ferramentas para responder. A teoria da relatividade geral de Einstein diz que
quando um buraco negro é criado por uma estrela enorme que morre, ele continua
escavando para dentro até formar um ponto infinitamente pequeno e denso,
chamado “singularidade”. Mas nessas escalas a física quântica provavelmente
também tem algo a dizer. O problema é que a relatividade geral e a física
quântica nunca foram grandes amigas – há décadas elas resistem a todas as
tentativas de unificação. No entanto, uma ideia recente – chamada “Teoria-M” –
poderá um dia explicar o centro invisível de uma das criações mais radicais do
universo.
18.
Podemos viver para sempre?
Vivemos em uma época incrível:
estamos começando a pensar no "envelhecimento" não como um fato da
vida, mas uma doença que pode ser tratada e possivelmente evitada, ou pelo
menos adiada por muito tempo. Nosso conhecimento do que nos faz envelhecer – e
o que permite que alguns animais vivam mais que outros – se expande rapidamente.
Apesar de não termos exatamente elucidado todos os detalhes, as pistas que
obtemos sobre danos ao DNA, o equilíbrio de envelhecimento, metabolismo e
capacidade reprodutiva, mais os genes que regulam isso, estão preenchendo uma
imagem maior, e potencialmente levarão a tratamentos medicinais. Mas a
verdadeira pergunta não é como vamos viver mais, e sim como vamos viver bem por
mais tempo. Já que muitas doenças, como diabetes e câncer, são típicas da
idade, tratar o envelhecimento em si poderá ser a chave.
19.
Como solucionar o problema da população?
O número de pessoas em nosso planeta
duplicou para mais de 7 bilhões desde a década de 1960, e calcula-se que até
2050 haverá pelo menos 9 bilhões de seres humanos. Onde todos nós vamos viver e
como vamos produzir alimentos e combustíveis suficientes para essa população?
Talvez possamos enviar todo mundo para Marte, ou começar a construir prédios de
apartamentos subterrâneos. Poderíamos até começar a nos alimentar com carne
criada em laboratório. Podem parecer soluções de ficção científica, mas talvez
devamos começar a levá-las mais a sério.
20.
É possível viajar no tempo?
Viajantes no tempo já caminham entre
nós. Graças à teoria da relatividade especial de Einstein, os astronautas que
estão em órbita na Estação Espacial Internacional experimentam o passar do
tempo mais lentamente. Naquela velocidade, o efeito é minúsculo, mas aumentando
a velocidade o efeito significa que um dia os humanos poderão viajar milhares
de anos no futuro. A natureza parece apreciar menos as pessoas que vão no outro
sentido e voltam ao passado, mas alguns físicos inventaram um projeto elaborado
de fazer isso usando “buracos de minhoca” (ou “pontes de Einstein-Rosen”) e
naves espaciais. Isso poderia ser usado até para dar a si mesmo um presente de
Natal ou responder algumas das muitas perguntas que cercam as grandes
incógnitas do universo.”
FONTE: escrito por Hayley Birch, Colin
Stuart e Mun Keat Looi, no “The Observer”. Transcrito na revista “CartaCapital”
e no “jornal GGN” (http://jornalggn.com.br/noticia/as-vinte-grandes-perguntas-da-ciencia).
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