“O ‘Goldman Sachs’ encheu seus cofres com 600 milhões de euros quando ajudou a Grécia a maquiar suas contas a fim de que esse país preenchesse os requisitos para ingressar na zona do euro, a moeda única europeia.
O resultado da operação foi gigantesca fraude que fez do suposto salvador, no caso o “Goldman Sachs”, o operador da derrocada da Grécia e de boa parte da Europa. Mario Draghi, atual presidente do BC Europeu, na época, era vice-presidente do “Goldman Sachs” para a Europa.
Por Eduardo Febbro, de Paris
“Paris - Há empresas que roubam para o império para o qual trabalham. A ‘Goldman Sachs’ é uma delas. O banco de negócios norte-americano encheu seus cofres com um botim de 600 milhões de euros (800 milhões de dólares) quando ajudou a Grécia a maquiar suas contas a fim de que esse país preenchesse os requisitos para ingressar na zona do euro, a moeda única europeia.
A informação não é nova, mas, até agora, se desconheciam os detalhes mais profundos do mecanismo pelo qual o “Goldman Sachs” enganou todos os governos europeus que participavam da criação da moeda única. O porta-estandarte da oligarquia financeira operou protegido por sólidas cumplicidades no seio das instituições bancárias europeias e dentro do poder político, que fez tudo o que esteve ao seu alcance para impedir as investigações.
Dois dos protagonistas dessa megafraude falaram pela primeira vez sobre as transações encobertas mediante as quais Atenas escondeu o tamanho de sua dívida. Trata-se de Christoforos Sardelis, chefe do escritório de gestão da dívida grega entre 1999 e 2004, e de Spyros Papanicolaou, o homem que o substituiu até 2012.
O resultado da operação foi gigantesca fraude que fez do suposto salvador, no caso o “Goldman Sachs”, o operador da derrocada da Grécia e de boa parte da Europa. Levando-se em conta somente os bancos franceses, a aventura grega custou 7 bilhões de euros : o “BNP Paribas” perdeu 3,2 bilhões, o “Crédit Agricole”, 1,3 bilhões, a “Société Générale”, 892 milhões, o “BPCE”, 921 milhões e o “Crédit Mutuel”, 359 milhões. Esse foi o custo só para o sistema bancário francês : os povos pagaram e pagarão em sacrifícios e privações muito mais do que isso.
A operação financeira foi astuta. O Tratado de Maastricht, da União Europeia, fixava requisitos rígidos para integrar o euro: nenhum membro da zona euro poderia ter dívida superior a 60% do PIB e os déficits públicos não poderiam superar os 3%. Em junho de 2000, para ocultar o peso gigantesco da dívida grega que era de 103% de seu PIB e obter assim a qualificação da Grécia para entrar no euro, o “Goldman Sachs” bolou um plano: transportou a dívida grega de uma moeda a outra.
A transação consistiu em mudar a dívida que estava cotizada em dólares e em yens para euros, mas com base em uma taxa de câmbio fictícia. Assim, se reduziu o endividamento grego e, com isso, a Grécia respeitou os critérios fixados pelo Tratado de Maastricht para ingressar no euro. Um detalhe complicou a maquiagem: o “Goldman Sachs” estabeleceu um contrato com a Grécia mediante o qual dissimulou o acerto sob a forma do que se conhece como um SWAP, um contrato de câmbio para os fluxos financeiros, que equivale a uma espécie de crédito.
Esse esquema fraudulento fez com que, na base dos chamados “produtos derivados” implicados na operação, em apenas quatro anos a dívida que a Grécia contraiu com o “Goldman Sachs” passasse de 2,8 bilhões de euros para 5,1 bilhões. Dois jornalistas da agência “Bloomberg”, Nick Dunbar e Elisa Martinuzii, realiazaram paciente investigação ao término da qual desnudaram esse obscuro mecanismo.
Segundo explicou aos jornalistas o chefe do escritório de gestão da dívida grega entre 1999 e 2004, Christoforos Sardelis, nesse momento a arquitetura da proposta do “Goldman Sachs” escapou de suas mãos. Logo em seguida, disse Sardelis, os atentados de 11 de setembro e uma má decisão dos bancos plantou a semente do desastre atual. A conclusão da investigação é contundente : Grécia e “Goldman Sachs” hipotecaram o futuro do povo grego e acionaram uma bomba relógio que, 10 anos mais tarde, explodiria nas mãos da sociedade.
Em matéria de grandes fraudes organizados por bancos de investimento, a impunidade é a regra. Ninguém foi, nem será condenado. Christoforos Sardelis afirmou que “o acordo com o ‘Goldman Sachs’ é uma história muito sexy dentre dois pecadores”. O ‘Goldman Sachs’ obteve apetitosos lucros nessa operação truculenta. No entanto, o banco de negócios norte-americano afirma em sua defesa que não fez nada de ilegal, que tudo o que foi realizado respeitava ao pé da letra as diretrizes do “Eurostat”, o organismo europeu de estatísticas.
O “Eurostat”, por sua vez, alega que só tomou conhecimento dos níveis de endividamento grego em 2010. A defesa parece pobre porque as primeiras denúncias sobre a maquiagem das contas gregas e o papel desempenhado pelo “Goldman Sachs” datam de 2003.
Em um informe de 2004, o “Eurostat” escreveu : “falsificação generalizada dos dados sobre o déficit e a dívida por parte das autoridades gregas”. Graças à cumplicidade do organismo financeiro norte-americano e de várias instâncias e personalidades europeias, a Grécia pôde dissimular durante vários anos o “pacote” escondido de sua dívida. Em 2010, Jean Claude Trichet, então presidente do Banco Central Europeu (BCE), se negou a entregar os documentos requeridos para conhecer a amplitude da verdade.
Edifício sede (o mais alto) do Goldman Sachs, em Nova York
No meio a essa grande mentira, há um personagem que hoje é central: trata-se de Mario Draghi, o atual presidente do Banco Central Europeu e grande partidário de terminar de uma vez por todas com o modelo social europeu. Draghi é um homem do “Goldman Sachs”. Entre 2002 e 2005, foi vice-presidente do “Goldman Sachs” para a Europa e, por conseguinte, estava a par da falsificação de dados sobre as finanças públicas da Grécia. Foi o seu próprio banco que estruturou a falsificação.
Mario Draghi
O liberalismo premia muito bem seus soldados. Durante dois anos, o Banco Central Europeu e os lobbies políticos usaram todos os truques possíveis para proteger Draghi e não permitir que fossem realizadas auditorias em torno das irregularidades cometidas na Grécia. As comissões do Parlamento europeu designadas para investigar essa megafraude se chocaram sistematicamente contra as redes que protegiam o segredo. O desenlace final dessa cumplicidade entre as oligarquias financeiras é conhecido por todos: quase um continente submerso na crise da dívida, a Grécia, estropiada e de joelhos, recessão, demissões massivas, perda de poder aquisitivo para os trabalhadores, reestruturações, sacrifícios dos benefícios sociais, planos de ajuste e miséria. Enquanto isso, os 600 milhões que o “Goldman Sachs” ganhou com essa fraude seguiram dando frutos na aposta suicida que o capital faz em benefício próprio contra a humanidade.
FONTE: escrito por Eduardo Febbro, correspondente de “Carta Maior” em Paris. Traduzido por Katarina Peixoto (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19731) [Imagens do Google adicionadas por este blog ‘democracia&política’].
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