domingo, 11 de março de 2012

Grécia: “MERCADOS” FESTEJAM O FUNERAL DE UMA NAÇÃO


[Obs deste blog ‘democracia&política’: quando se fala “mercado”, significa “grandes conglomerados mundiais financeiros, econômicos e de mídia”]

“Mercados e bolsas festejam o acordo fechado na quinta-feira (8) entre a Grécia e os bancos credores, que concederam ao país desconto médio de 50% em troca de garantias e reformas que assegurem o pagamento do passivo restante.

Por Saul Leblon, em “Carta Maior”

Há razões para a banca comemorar: a adesão dos bancos ao desconto de 50% representa, no fundo, o oposto do que transparece e se alardeia. Trata-se de gigantesca transfusão, talvez a mais radical desde o Tratado de Versalhes, do sangue de um povo a credores pantagruélicos e interesses assemelhados. Uma derrota superlativa da democracia grega, que marcará a história do país por décadas; e provavelmente destruirá seu sistema representativo, marcado por traição nacional maiúscula.

As eleições parlamentares de abril agora podem funcionar como a espoleta dessa bancarrota. O processo consumado na quinta-feira compromete a vida da atual geração, a dos seus filhos e a dos netos que um dia eles terão. Em troca de um desconto sobre uma dívida impagável - contraída num intercurso entre governos irresponsáveis e banqueiros cúmplices- o Estado grego assinou uma espécie de testamento à favor dos mercados. Em seguida, consumou o suicídio político da democracia. A partir de agora, e por prazo indeterminado, a Grécia rende-se ao papel de protetorado das finanças internacionais. Um protetorado a ser alardeado como paradigma de bom comportamento.

Um diretório nomeado pelos mercados terá poderes legais para monitorar a tosquia do país, com direito a vetar orçamentos e redirecionar recursos prioritariamente ao pagamento de banqueiros. O que a coalizão socialdemocrata e conservadora fez foi municiar-se de um álibi internacional para sancionar um arrocho salarial indecente -o salário mínimo foi ineditamente reduzido; como ele, as pensões;demissões maciças da ordem de 150 mil funcionários públicos estão em marcha (15 mil já foram efetuadas este ano); privatizações e cortes na saúde e educação desencadearam surtos de suicídios e fome nas escolas. A entrega de crianças pobres a orfanatos é a tragédia mais recente protagonizada por famílias desesperadas.

ARGENTINA

Compare-se com o que fez a Argentina de Kirchner há nove anos para se ter a medida da regressividade acatada por Atenas. Em 2003, a Argentina era uma espécie de Grécia da América do Sul. Desacreditada aos olhos de seu próprio povo, balançava como um 'joão bobo' nas mãos do capital especulativo interno e externo. Nestor Kirchner herdou do extremismo neoliberal uma taxa de pobreza de 60% sobre uma população de 37 milhões de argentinos.

A dívida de US$ 145 bilhões, impagável, corroía seu sistema financeiro. Os credores sobrevoavam a nação argentina à espera do melhor momento para arrancar os seus olhos e o que lhe restasse ainda da carne, como fizeram na quinta-feira com a Grécia. O cerco internacional era avassalador.

A diferença é que Nestor Kirchner não se dobrou: impôs desconto unilateral e incondicional de 75% da dívida aos credores --ganhou margem de soberania, portanto, ao contrário da rendição grega espetada em sacrifícios brutais. Com independência, a Argentina desvalorizou o câmbio, congelou tarifas, destinou a receita crescente a programas sociais e de fomento; não ao pagamento à banca, como reza a rendição grega.

A taxa de pobreza recuou a 10% da população. A economia argentina foi a que mais cresceu no hemisfério ocidental na última década. Cristina foi reeleita em 2011 com apoio esmagador. Os desdobramentos virtuosos desse braço de ferro são espertamente omitidos pela crítica conservadora que tenta desmerecer os ganhos econômicos e sociais da soberania argentina, ao mesmo tempo em que edulcora o escalpo da sociedade grega. E o faz por uma razão compreensível: eles realçam as dimensões catastróficas dos desastres em marcha na Grécia, Espanha, Portugal e outros, submetidos à dose dupla de um purgante ortodoxo inútil, que o êxito da nação latino-americana derrotou e desmoralizou.”

FONTE: escrito por Saul Leblon, no site “Carta Maior”  (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=177661&id_secao=9) [subtítulo, imagens do google e trecho inicial entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].

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