terça-feira, 10 de abril de 2012

FALTA DE PROFISSIONAIS AMEAÇA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

Lançamento do VLS
Por Virgínia Silveira, no jornal “Valor”

“A recomposição do quadro de profissionais para o programa espacial brasileiro é promessa antiga do governo, mas a falta de ação mais efetiva tem provocado perda sistemática de recursos humanos no setor, situação que vem piorando com a elevação da faixa etária dos pesquisadores.

DCTA

[OBS deste blog ‘democracia&política’: as seguintes organizações são subordinadas ao Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA, da FAB): Instituto de Aeronáutica e Espaço – IAE; Instituto de Fomento e Coordenação Industrial – IFI; Instituto Tecnológico de Aeronáutica – ITA; Instituto de Estudos Avançados – IEAv; Grupo Especial de Ensaios em Vôo – GEEV; Grupamento de Infra-Estrutura e Apoio de São José dos Campos – GIA-SJ; Centro de Preparação de Oficiais da Reserva da Aeronáutica de São José dos Campos – CPORAER-SJ; Centro de Lançamento da Barreira do Inferno – CLBI e Centro de Lançamento de Alcântara – CLA]

Foto de parte do ITA (São José dos Campos-SP), um dos institutos do DCTA
"Se não houver decisão neste ano, as nossas projeções indicam que, em 2020, o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) estará próximo de situação de colapso, reduzido a 26% do efetivo que possuía em 1994", diz o diretor do órgão, brigadeiro Ailton dos Santos Pohlmann. Segundo ele, a média de idade dos pesquisadores do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), responsável pelos principais projetos espaciais do país na área de foguetes, é superior a 50 anos.

A perda de cérebros no programa espacial é crescente e, com a demora em abrir um novo concurso, a situação só tende a piorar. "A grande dificuldade daqui para frente será treinar o pessoal novo, pois os que detêm o conhecimento, adquirido em mais de 20 anos de trabalho e estudos, já terão saído", alerta o presidente da “Associação Aeroespacial Brasileira” (AAB), Paulo Moraes Jr.

O último concurso público autorizado pelo governo para o DCTA foi feito em 2010, mas apenas 93 funcionários foram contratados para atender a todo o órgão, que inclui 11 institutos de ensino e pesquisa e dois centros de lançamento de foguetes. O déficit de pessoal hoje, de acordo com o brigadeiro Pohlmann, é de mais de mil funcionários. Em 2011, mais de 70 servidores deixaram o DCTA.

VLS
O lançamento do Veículo Lançador de Satélite (VLS) mais uma vez será afetado pela falta de recursos humanos especializados. "Desde 2003, quando aconteceu o acidente com o foguete na base espacial de Alcântara e se perderam 21 especialistas, não houve reposição desse pessoal", ressalta o brigadeiro.

O problema já foi relatado por diversas vezes ao governo, e mais recentemente, em fevereiro, a direção do DCTA enviou relatório ao Ministério da Defesa sinalizando que a situação ficará ainda mais crítica com a duplicação do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), projeto que conta com o apoio pessoal da presidente Dilma Rousseff.

A ampliação do ITA deverá ocorrer ao longo dos próximos cinco anos, mas já em 2013 a escola vai oferecer o dobro das vagas atuais, ou seja, 240. Atualmente, o ITA recebe 120 alunos por ano, mas de acordo com o reitor, Carlos Américo Pacheco, cerca de 500 estudantes que prestam o vestibular para o instituto têm nota mínima para entrar. Este ano, o ITA recebeu um total de 9.400 inscrições, o que representou aumento de 20% em relação a 2011.

Para ampliar o número de vagas, o ITA também precisará contratar 150 professores no período de cinco a seis anos e cobrir cerca de 50 aposentadorias que deverão acontecer nesse período. A expansão do instituto terá custo de R$ 300 milhões e as obras estão previstas para começar este ano.

"Não é possível duplicar o ITA se não houver a reposição dos quadros. A ampliação da escola exigirá, também, aumento significativo na capacidade do DCTA de apoiar essa expansão, na parte de pessoal (contratação de mais professores), infraestrutura de alojamento, alimentação, laboratórios de pesquisa e segurança, entre outros", diz o brigadeiro Pohlmann.

INPE

[OBS deste blog ‘democracia&política’: o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) foi criado em 1961 a partir de terreno e pesquisadores do DCTA em São José dos Campos. Hoje, o instituto tem instalações em doze cidades: São Paulo, Brasília, Alcântara, Atibaia, Belém, Cachoeira Paulista, Cuiabá, Eusébio, Natal, Santa Maria, São Martinho da Serra e São Luís e sua sede está na cidade de São José dos Campos-SP]

Laboratório de Integração e Testes de Satélites (LIT/INPE)
No “Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais” (INPE) a situação é mais grave na área de gestão, que em dez anos deve perder 70% do pessoal que trabalha no apoio às atividades finais do instituto, devido às aposentadorias. O plano diretor do INPE para os anos de 2011 a 2015 mostra que, em 1989, a instituição tinha 1,6 mil servidores, sendo apenas 50 com mais de 20 anos de serviço. Passados 20 anos, o número de funcionários é de 1.131, dos quais só 300 têm menos de 20 anos de casa. Atualmente, 72% dos engenheiros e tecnologistas do INPE trabalham há mais de 20 anos na instituição.

A área de engenharia de satélites, que recebe os principais recursos do orçamento do instituto, também preocupa bastante a direção do INPE. Segundo o coordenador de Gestão Tecnológica do instituto, Marco Antônio Chamon, em cinco anos o número de funcionários desse setor deverá cair de 132 para 89. "Em dez anos, estimamos que esse número esteja reduzido a 33 pessoas", afirma.

São essas mesmas pessoas que trabalham hoje no ambicioso programa de satélites do INPE, que prevê lançar até 2014 três satélites. Entre 2015 e 2020, estão previstos mais dois satélites em parceria com a China, um em parceria com a Argentina, um satélite com a Agência Espacial Americana (NASA) e três satélites nacionais.

"Não temos hoje condições de fazer dois satélites ao mesmo tempo", afirma Chamon. O satélite CBERS-3, feito com a China, segundo ele, será lançado no fim deste ano e, desde fevereiro, uma equipe de 30 a 50 técnicos e engenheiros do INPE está no país para trabalhar na integração e testes finais do satélite. "Eles ficarão por lá até o lançamento do satélite e isso certamente reduziu o ritmo de trabalho de outros projetos, pois não há substituto para esse tipo de especialista."

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) liberou a abertura de concurso público para a contratação de 107 servidores para o INPE em 2012, mas a instituição precisa de um mínimo de 400 contratações para repor especialistas em setores considerados estratégicos, como meteorologia, controle de satélites, ciência espacial e engenharia de satélites.

"Assim como nas universidades, precisamos de mecanismos que nos permitam repor nossos quadros de maneira sistemática, pois assim é possível preservar o conhecimento e transferi-lo aos poucos", explica.

"Há oito anos que o sindicato vem insistentemente cobrando as autoridades do governo federal sobre a contratação urgente de servidores para o INPE e o DCTA. As poucas contratações que aconteceram foram temporárias, o que, na área de ciência e tecnologia, chega a ser uma estupidez," protesta o vice-presidente do “Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial” (SindiCT), Fernando Morais Santos.

O “Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos” do INPE (CPTEC), responsável pela produção de informações meteorológicas diárias e climáticas, possui hoje um total de 148 funcionários. Desses, cerca de 80 são contratados em regime temporário. "São atividades que não podem parar e esse pessoal temporário só tem mais dois anos para ficar no CPTEC", ressalta.

Entre os funcionários temporários do CPTEC, segundo Chamon, existe um grupo de 15 programadores, responsáveis por manter o supercomputador do centro em funcionamento, que encerram o contrato com a instituição no segundo semestre deste ano. "Sem esse pessoal, não tem como fazer a previsão do tempo, pois são eles que colocam as informações que rodam no supercomputador", afirma Chamon.

RECURSOS ESCASSOS AMEAÇAM PROJETOS


A modernização da base de lançamento de foguetes em Alcântara, no Maranhão e o desenvolvimento de veículos lançadores e de satélites estão entre as prioridades do governo federal na área espacial. Esses projetos já têm, inclusive, recursos garantidos da ordem de R$ 2,2 bilhões até 2015, conforme previsto no plano plurianual 2012-2015.

Embora estejam na lista de prioridades de investimentos, alguns projetos ainda sofrem com a insuficiência de recursos. Somados à falta de especialistas em diversas áreas, os planos do governo nessa área poderão ser afetados. O lançamento do foguete VLS (Veículo Lançador de Satélite), por exemplo, que estava previsto para o início de 2013, deverá ser adiado. "Para cumprir a meta de lançamento no ano que vem precisamos de R$ 55 milhões e para este ano só temos disponível um pouco mais de R$ 16 milhões", revela o diretor do DCTA, brigadeiro Ailton dos Santos Pohlmann.

Os projetos que não estão na indústria, como os foguetes, são os mais afetados pelos constantes contingenciamentos de recursos e a falta de pessoal. "O setor de aerodinâmica de foguetes do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) já teve 18 especialistas. Hoje, tem apenas quatro", comenta o presidente da AAB, Paulo Moraes. O pesquisador, que trabalha no IAE, ressalta que não está sendo formado número suficiente de engenheiros no Brasil para atender às novas iniciativas do governo, das empresas de tecnologia e também a uma indústria de defesa em fase de crescimento.

Túnel Aerodinâmico, um dos setores de IAE

Hélice do túnel aerodinâmico
Com 11 institutos e dois centros de lançamento de foguetes, em Alcântara, no Maranhão, e em Natal (RN), o DCTA é o órgão da Aeronáutica que executa e coordena os principais projetos do governo na área de defesa. O programa de lançadores VLS e o Cruzeiro do Sul, que seria uma nova geração de foguetes, são os mais conhecidos.

A lista de responsabilidades do DCTA, no entanto, inclui ainda outros programas de vulto, como o da aeronave de transporte militar KC-390, que está sendo desenvolvida pela Embraer, o processo de seleção das novas aeronaves de combate F-X2 e de todos os mísseis utilizados pela Força Aérea Brasileira (FAB), que hoje estão sendo produzidos pelas empresas Mectron, controlada pelo grupo Odebrecht, e Avibras.

O DCTA também coordena a compra de outras aeronaves, como os 56 helicópteros que estão sendo adquiridos da Helibras para as Forças Armadas, os Super Tucano produzidos pela Embraer, a modernização da frota de aeronaves F-5 e AMX e o desenvolvimento de veículos aéreos não tripulados.”

FONTE: reportagem de Virgínia Silveira no jornal “Valor Econômico” e transcrita no site “DefesaNet”  (http://www.defesanet.com.br/space/noticia/5467/Falta-de-profissionais-ameaca-o-Programa-Espacial-Brasileiro) [imagens do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].

Nenhum comentário: