terça-feira, 2 de dezembro de 2008

LACERDA É O ALVO

A revista Carta Capital desta semana publicou o seguinte texto de Leandro Fortes:

“Há exatos três meses, o delegado Paulo Lacerda vive em um mundo particular de solidão e clausura, à espera de uma possível absolvição de um crime sobre o qual não há nenhuma evidência concreta de que tenha sido cometido. Atualmente, para achar o delegado – uma das estrelas do primeiro mandato de Lula justamente por ter transformado a Polícia Federal em um órgão público eficiente –, é preciso cruzar o subsolo do Palácio do Planalto e passar por um posto de vigia, onde, invariavelmente, dois ou três funcionários ficam a perguntar, um ao outro, quem é Lacerda. Delegado? Onde ele fica? No gabinete do GSI? Na Senad? O GSI é lá em cima, mas a Senad é aqui embaixo. Alguém sabe o ramal? Não é, portanto, fácil encontrar o policial, que passa os dias enfurnado numa sala esquecida da Secretaria Nacional Antidrogas.

Com seus modos franciscanos, escondido no subsolo do mesmo palácio onde diariamente vários de seus adversários circulam na tentativa de removê-lo de vez da direção da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Lacerda tem tentado sobreviver a um mundo em desconstrução, inclusive de forma literal.

Em 1º de setembro, o delegado foi afastado temporariamente do cargo de diretor-geral da Abin depois de ter sido acusado de participar de um suposto grampo telefônico de um insosso diálogo entre o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Publicado pela revista Veja, sem que o áudio da tal conversa tenha jamais aparecido, o suposto grampo serviu à tese de que se vive no Brasil um “Estado policial” e um descontrole do aparelho jurídico-policial, representado pela PF, a agência de inteligência, o Ministério Público e juízes de primeira instância que se portariam como justiceiros.

Já houve tempos em que um diretor-geral da Polícia Federal (Vicente Chelotti) foi afastado do cargo por grampear o gabinete de um presidente da República (Fernando Henrique Cardoso). Antes disso, arapongas do extinto Serviço Nacional de Inteligência (SNI) foram identificados como responsáveis pelos grampos ilegais que revelaram os bastidores nada angelicais da privatização da Telebrás (semente da disputa empresarial que desembocaria na Operação Satiagraha).

Neste momento, o publicitário Marcos Valério de Souza, que não tem os amigos certos e não tentou subornar um delegado da PF, completa um mês e meio na prisão (na quinta-feira 27, o Supremo Tribunal Federal voltou a negar sua liberdade). Incrivelmente, nem nos tempos passados e muito menos no caso de Marcos Valério levantam-se vozes para apontar a existência de um “Estado policial” ou para acusar o desrespeito às garantias individuais.

Por que a Satiagraha teve o poder de mobilizar tantas forças contra ela? E por que, para muitos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, tornou-se de vital importância não só afastar Lacerda da Abin, mas aniquilar sua carreira?”

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