sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

EDMUND PHELPS: BRASIL E SEU EMPREENDEDORISMO

Li ontem no site “Terra Magazine”, do jornalista Bob Fernandes, a seguinte entrevista realizada por Pablo Calvi, de Nova Iorque, Estados Unidos, com Edmund Phelps, prêmio Nobel de economia em 2006:

“Edmund Phelps, prêmio Nobel de economia em 2006 e uma das mentes mais brilhantes de todos os tempos, segundo aqueles que conhecem seu trabalho, não tem dúvidas de que a inovação será a melhor arma para combater a crise financeira que já se expandiu até os mais remotos confins da economia mundial.

A inovação é para Phelps o principal motor para o crescimento. E de acordo com esse lendário expert mundial do neo-keynesianismo e uma das vozes que assessoram de mais perto o governo de Barack Obama, esta ferramenta constitui 90% do patrimônio do setor privado.

Phelps recebeu Terra Magazine em seu escritório do Earth Institute, que divide com sue colega e também prêmio Nobel Joseph Stiglitz, e falou amplamente sobre suas impressões da crise e da necessidade de potencializar o setor privado.

"O risco, claro, se alguém pensa na América Latina é que se vê ao empregador como a uma vaca leiteira a qual se tem de ordenhar", começa o diálogo Phelps, sentado em frente a uma pilha de ensaios sobre o novo modelo brasileiro. O primeiro deles era "O Brasil e a Economia Criativa. Um novo mundo nos trópicos", um compêndio do XX Fórum Nacional realizado no ano passado e coordenado pelo ex-ministro João Paulo dos Reis.

"Por isso é um milagre que os empreendedores não tenham desaparecido por completo da América do Sul".

MAS HÁ DIFERENTAS ENTRE OS PAÍSES: O QUE ACHA DO ÊXITO BRASILEIRO DOS ÚLTIMOS 10 ANOS?

Há claramente um elemento empreendedor no êxito do Brasil nos últimos 10 anos, mas com certeza há elementos de entrepreneurship na Argentina também. Os avanços em Mendoza e na indústria do vinho tem sido realmente espetaculares. E parece que se sobressaíram ao Chile. Cada vez que vou a um restaurante caro e vejo um Malbec argentino e não vejo nada do Chile, confirmo essa idéia de que os empreendedores têm suas próprias avenidas.

(Phelps é um velho conhecido da América do Sul. Não apenas deu aulas na Universidade do CEMA, Centro de Estudos Macroeconômicos da Argentina, como também viaja anualmente para visitar seus sogros em Buenos Aires).

No Brasil, suspeito que a atitude pró-empresarial, a orientação geral sobre os negócios e o grande fascínio e celebração dos negócios, a atitude pró-empresarial é uma das características mais importantes do sucesso.

Em outros países da América Latina, as companhias são sempre o principal suspeito. Se vê as empresas como uma espécie de fardo para os trabalhadores, uma ameaça. E eu entendo que o mundo não é perfeitamente justo e não há uma lei natural que faça com que cada empregador seja absolutamente justo com seus empregados. É um ambiente de concorrência razoável, uma companhia não é inimputável. Sempre pode perder aos seus empregados, pois, ante as más condições, eles podem optar por outros trabalhos.

Por isso, me parece que o setor na economia em que o empregador é uma ameaça para o empregado é o Estado. Um está quase indefeso perante o Estado se quiser se desfazer do outro. Não se puder lutar facilmente contra o Estado na justiça. Os trabalhadores no setor público se deparam com o risco de abusos de poder, e é precisamente onde se necessita dos sindicatos. E é aí que podemos encontrar os sindicatos nos Estados Unidos. É justamente aí que se precisa deles.

MAS O SENHOR DISSE VÁRIAS VEZES QUE NÃO CRÊ NO LIVRE MERCADO.

Exato. Não acredito em uma política sem governo, sem regulações e sem responsabilidade social...

E QUAL A SUA OPINIÃO SOBRE O LIVRE COMÉRCIO?PENSO EM PARTICULAR NOS TRATADOS QUE ESTÃO PENDENTES NA AMÉRICA LATINA, ESPECIALMENTE COM A COLÔMBIA. ELES BENEFICIAM A ECONOMIA NORTE-AMERICANA O A COLOMBIANA NESSE MOMENTO DE AUSÊNCIA DE CRÉDITO?

Não conheço os detalhes do tratado, mas gostaria que o governo dos Estados Unidos implementasse tratados de livre comércio de modo unilateral. Claro que, quando os demais países começam a levantar tarifas contra nossas exportações, devemos manter uma margem de negociação. Mas creio que seria bom para nós implementar uma política de livre mercado sem se importar com o que os países façam.

Agora, reduzimos nossas tarifas tanto que não sei o quanto mais é possível. Há bolsões de proteção neste país, mas, em geral, os níveis tarifários são baixos aqui.

Apesar disso, eu não creio que a economia dos Estados Unidos do século 19 tenha atingido níveis semelhantes de êxito graças ao livre mercado. Não existia o livre comércio naquela época. Na verdade, tínhamos tarifas. E creio que há um papel para as tarifas, que podem oferecer segurança para novas indústrias à medida que começam a crescer. Mas, como vê, não sou excessivamente doutrinário em relação a este tema.

Sou doutrinário em relação a ter um setor privado que está aberto a desenvolver e implementar novas idéias, inovadoras, em um ambiente no qual empreendedores e financiadores estão abertos para aceitar níveis razoáveis de risco como um retorno excitante e intelectualmente interessante, que resulta na aventura da inovação econômica.

O SENHOR ACREDITA QUE A SOLUÇÃO DAS ESTATIZAÇÕES E DOS CRÉDITOS QUE O GOVERNO NORTE-AMERICANO INJETOU EM VÁRIAS COMPANHIAS DE RISCO EM 2008 - COMO BEAR STEARNS, AIG, GENERAL MOTORS, CHRISLER - FORAM UMA SOLUÇÃO COM SABOR LATINOAMERICANO PARA OS PROBLEMAS NORTE-AMERICANOS?

Admito que o resgate da Bear Stearns me recordou um pouco as aventuras coorporativistas européias. Uma espécie de organização racional da economia a cargo do governo central. E não creio tampouco que o crédito concedido para General Motors e Chrysler foi a melhor solução para o problema automotivo. Acredito que havia muitas oportunidades para um pacote de falências em que todos os envolvidos no nível social perdessem os acordos que tinham.

Deveriam ter acontecido mais consultas de especialistas internacionais para atingir um cenário eficaz e produtivo para as quebras. Sobretudo para facilitar o ressurgimento, o novo nascimento de empresas como General Motors e Chrysler sem a carga enorme da dívida que hoje ambas possuem. Uma quebra não teria exigido dinheiro do governo. Mas o Congresso esperou e esperou tanto que ao final parecia que GM e Chrysler iam desaparecer sem dar-lhes dinheiro.

Este foi o motivo pelo qual o governo precisou dar crédito-ponte. Foi lamentável, foi um erro e não é o primeiro do governo norte-americano. Mas eu espero sinceramente que não seja o começo de uma nova política industrial. De fato, se me deixar pensar um segundo mais, acredito que não é o começo de um novo modelo.

Com Obama teremos um presidente mais ativo que evitará cair neste tipo de posições.

A coisa mais importante que posso dizer é que, se quisermos sair desta depressão e voltar a níveis saudáveis de atividade industrial, com níveis de desemprego entre 5% e 6%, com inovação e bons níveis de produtividade, isto tem que surgir primeiramente do setor privado. Do Vale do Silício e das centenas de milhares de lugares que geram a inovação.

Esta tem que ser a saída, o motor de crescimento, o mesmo que tivemos durante quase 200 anos. O mesmo motor é muito bom também gerando emprego. Claro, muitas vezes o motor trava e não funciona bem e pode necessitar de um pouco de ajuda para começar a trabalhar bem, mas necessitamos deste motor.

Veja, li hoje em um relatório que a administração espera que o desemprego chegue a 10% em 2009. Assim, por mais que faça o governo dos Estados Unidos, não acredito que possa baixar por si o desemprego para os históricos 6%. O governo não pode fazer isso sozinho. Mas o setor privado, e isto Obama sabe bem, pode conseguir. Com confiança e um pouco de estímulo, e talvez um pouco de sorte.”

Nenhum comentário: