sexta-feira, 27 de março de 2009

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR A LINHA DE CRÉDITO FLEXÍVEL

Li ontem na Folha de São Paulo o seguinte artigo de Paulo Nogueira Batista Jr. O autor é Diretor-Executivo no FMI, onde representa nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago):

“A NOVA LINHA DE CRÉDITO DO FMI REPRESENTA UMA INOVAÇÃO EXTRAORDINÁRIA NO FUNCIONAMENTO DA INSTITUIÇÃO

“A crise mudou tudo, leitor. Propostas que o Brasil e outros países defendiam e que pareciam, há um ano, ou mesmo seis meses, totalmente irrealistas, talvez utópicas, estão na mesa de negociação aqui no FMI e em outros fóruns. Algumas delas estão sendo implementadas. Anteontem, o Brasil obteve uma vitória importante com a aprovação pela diretoria de uma reforma profunda nos instrumentos de empréstimo e no monitoramento do FMI, uma das mais importantes na história da instituição. O espaço não permite longas explicações. Vou me limitar a descrever rapidamente o aspecto que me parece fundamental. Para mais detalhes sobre a reforma, ver nota do Ministério da Fazenda, divulgada anteontem (www.fazenda.gov.br).

A principal inovação foi a criação da Linha de Crédito Flexível ("Flexible Credit Line" - FCL). Há cerca de um ano, recebi do ministro da Fazenda, Guido Mantega, a orientação de concentrar esforços no desenho de um instrumento de liquidez que equipasse o FMI para responder de forma adequada à crise. Naquela altura, a crise ainda não atingira os países em desenvolvimento com força, mas a percepção do ministro era que isso seria apenas uma questão de tempo.

A cadeira brasileira elaborou então uma proposta que foi recebida inicialmente com ceticismo, mas que foi sendo refinada. Gradualmente conquistamos o apoio do corpo técnico, da Administração do FMI e de outras cadeiras da Diretoria Executiva, não só de países em desenvolvimento mas também de países desenvolvidos.

Com a intensificação da crise de setembro de 2008 em diante, a urgência do tema tornou-se evidente. Em outubro, conseguimos uma vitória parcial: a criação da Facilidade de Liquidez de Curto Prazo ("Short-Term Liquidity Facility" -SLF). Infelizmente, ela nasceu cheia de travas que impediram a sua utilização pelos países. Passamos então mais alguns meses lutando para persuadir os setores mais conservadores do Fundo de que era preciso reformar a SLF. O resultado desse esforço adicional foi a FCL, que remove todas limitações da sua antecessora, ao mesmo tempo em que mantém os seus aspectos positivos intocados. Vitória completa, portanto. A FCL representa uma inovação extraordinária no funcionamento do Fundo. Ela estará disponível para países que tenham políticas econômicas sólidas e atendam a critérios de habilitação preestabelecidos.

Esses critérios foram definidos de forma flexível, como pretendíamos, constituindo no essencial uma enunciação genérica do que podem ser considerados, sem muita controvérsia, os elementos básicos de uma política adequada. Na FCL, não haverá cartas de intenção, critérios de desempenho, metas a cumprir ou monitoramento. Os países habilitados terão acesso rápido, praticamente automático aos recursos do Fundo. Não há um limite rígido de acesso; o valor do empréstimo será determinado caso a caso (a SLF tinha um limite de 500% da quota). Os prazos de amortização (de três anos e um trimestre até cinco anos) são iguais aos das linhas tradicionais (os "Stand-Bys") e mais longos que os da SLF (que tinha prazo máximo de nove meses).

Além disso, uma vez aprovada, a linha de crédito pode ser utilizada a qualquer momento ou não ser desembolsada, ficando como instrumento preventivo, mediante pagamento de uma comissão. O custo da linha também é muito inferior ao da SLF e igual ao das linhas tradicionais.

Agora, a próxima etapa é garantir a aplicação correta e justa da nova linha, não permitindo que velhas práticas do FMI reapareçam sob nova roupagem.”

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