sexta-feira, 13 de abril de 2012

ÁREA MILITAR IMPULSIONA OS NEGÓCIOS DE TI


“Dezenas de empresas relativamente jovens e centradas em tecnologia estão encontrando espaço para negociar com as Forças Armadas. O movimento cresce à medida que os requisitos de segurança migram para o mundo digital, onde é preciso defender um novo tipo de fronteira, a do ciberespaço, sem descuidar das tarefas militares tradicionais. O impulso vem da retomada dos investimentos na área de defesa. Estão em andamento projetos que vão do desenvolvimento de mísseis a satélites geoestacionários

Por Gustavo Brigatto, no jornal “Valor”

Se você já viu algum filme de ação, deve conhecer o clichê: é o do fornecedor de armas para as Forças Armadas, geralmente uma megacorporação com interesses mesquinhos, que não se importa em arriscar a segurança da população para vender tecnologias perigosas, envoltas em projetos secretos.

Giovani Thibau já viu produções do gênero, mas sua empresa, a “TechBiz Forense Digital”, não poderia estar mais distante desse lugar-comum. Criada em 2005, a companhia prevê atingir uma receita de R$ 25 milhões neste ano - bem distante dos conglomerados bilionários da ficção - e seus contratos com o Exército brasileiro não têm nada de secretos. Os negócios, que começaram há dois anos, com acordos cujos valores variavam entre R$ 100 mil e R$ 250 mil, hoje chegam a R$ 4,6 milhões.

Como a “TechBiz”, outras empresas relativamente jovens e centradas em tecnologia - e não em armamentos - estão encontrando espaço para negociar com as Forças Armadas. O movimento cresce à medida que os requisitos de segurança também migram do mundo analógico para o digital, onde é preciso defender um novo tipo de fronteira, a do ciberespaço, sem descuidar das tarefas militares tradicionais.

"Esse é só o começo", diz Thibau, cofundador e diretor executivo da “TechBiz”, sobre as perspectivas de fornecimento futuras para os militares brasileiros. O pano de fundo é a retomada dos investimentos do governo em programas de reaparelhamento das Forças Armadas. Atualmente, estão em andamento projetos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que vão do desenvolvimento de mísseis até a instalação de sistemas de vigilância de fronteiras, passando pelo lançamento de satélites geoestacionários, a compra de veículos aéreos não tripulados e a defesa cibernética. Todos, praticamente, requerem algum tipo de conhecimento disponível em empresas brasileiras.

Só no reaparelhamento das Forças Armadas, a estimativa do “Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia do Instituto de Economia da Unicamp” (NEIT-IE) é de que até 2020 sejam investidos, em média, R$ 6 bilhões por ano. "A defesa é um dos vetores para o crescimento da economia", afirmou recentemente o general Aderico Visconde Pardi Mattioli, do Ministério da Defesa, em visita ao polo de eletroeletrônica de Santa Rita do Sapucaí, no interior de Minas.

A viagem de Visconde, da Secretaria de Produtos da Defesa, visava identificar potenciais fornecedores de software para redes de comunicação, sistemas de rastreamento e localização etc.

São áreas que interessam diretamente à “Dígitro”. A companhia, que há mais de 30 anos atua na área de segurança pública, firmou recentemente uma parceria com a “Israel Aerospace Industries” (IAI), uma das maiores fabricantes daquele país, para criar produtos para defesa. O primeiro resultado é um sistema para monitorar sistemas de vigilância que pode ser usado no controle de fronteiras e em grandes eventos.

Prédio-sede da Digitro, em Florianópolis

Segundo Marco Arie, diretor da IAI para América Latina, toda a tecnologia foi transferida para a “Dígitro”, que também adicionou recursos próprios. A previsão é fazer o mesmo em projetos futuros. "Estamos começando as conversas com as Forças Armadas", diz Geraldo Faraco, presidente da “Dígitro”. A disputa, diz o executivo, não será fácil: diversas companhias têm interesse em disputar as mesmas oportunidades.

Um decreto presidencial de 2008, a Estratégia Nacional de Defesa, favorece companhias nacionais como a “Dígitro”, ao estipular a preferência de compra de tecnologias desenvolvidas por empresas brasileiras sempre que elas estiverem disponíveis.

Foi esse mecanismo que tornou possível a compra de um sistema antivírus da “BluePex”, e do simulador de guerra cibernética de outra brasileira, a “Decatron”, no fim do ano passado. As licitações somaram R$ 6 milhões.

AVware, da BluePex, de Campinas

Ao vender produtos para a área militar, as empresas não só ganham um novo cliente, como se beneficiam da possibilidade de melhorar seus produtos para o mercado civil. A “BluePex” incorporou uma série de recursos criados com o Exército na nova versão de seu antívírus, que será lançada em maio. O produto vai ganhar até novo nome: “AVware Defesa BR”. "O Exército acaba funcionando como uma vitrine muito importante para conquistar a confiança dos clientes", diz Jefferson Penteado, presidente da companhia.

Na avaliação de Rodrigo Acioli, analista do “Departamento de Institutos de Pesquisa em Áreas Estratégicas da Financiadora de Estudos e Projetos” (FINEP), o desenvolvimento de tecnologias nacionais é importante para evitar problemas de suprimento e no uso de determinados sistemas, além de melhorar as negociações com fornecedores internacionais. "Quando você tem tecnologias próprias, o nível das discussões muda", afirma o especialista.

A independência tecnológica também pode ter efeitos positivos na exportação. Pelas regras internacionais, se uma empresa brasileira criar um “tanque” [carro de combate] e usar sistemas desenvolvidos em outros países, o fornecedor pode impedir a venda do veículo brasileiro para nações com os quais seu próprio país tenha restrições na área de defesa.

Franco Machado, fundador da Mogai, de Vitória-ES

Nos últimos anos, a FINEP definiu as áreas de defesa e segurança pública como parte de seus alvos principais. Um dos projetos patrocinados foi um sistema de navegação robótica que pode ser usado em aviões, submarinos e até carros não tripulados, em desenvolvimento pela “Mogai Tecnologia”. "A ideia já existia, mas sem esse recurso [R$ 1,86 milhão], nunca teríamos apostado no desenvolvimento, por conta do custo", diz Franco Machado, fundador da “Mogai”. A tecnologia começou a ser vendida a empresas no ano passado. Entre os clientes está a Petrobras. A expectativa é testar o sistema com um carro sem motorista em 2013.”

FONTE: reportagem de Gustavo Brigatto, no jornal “Valor” (colaborou Marcos de Moura e Souza, de Santa Rita do Sapucaí, MG). Transcrito no portal da FAB  (http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?datan=11/04/2012&page=mostra_notimpol) [Imagens do Google adicionadas por este blog ‘democracia&política’].

2 comentários:

iurikorolev disse...

Maria Tereza
Excelente artigo !
Mas essas empresas possuem um grau de mortalidade alto.
Se o Governo não mantiver suas encomendas elas acabam.
(Já sei o que vc vai dizer : "por isso a elite demotucana etc etc" rsrsrrs)

Unknown disse...

Iurikorolev,
Também gosto de ver a capacidade empreendedora de jovens idealistas brasileiros em áreas de alto valor agregado. Realmente, nossas Forças Armadas há muitas décadas sobrevivem em condições espartanas e não conseguem manter fluxo de encomendas que sustentem essas empresas. Dá pena.
Elas têm que buscar mercado civil. De certa maneira, foi isso que a Embraer, criada e desenvolvida pelos militares, fez desde o seu início.
Não opinarei sobre complexos de culpa das nossas "elites" e dos demotucanos. É muito subjetivo e complexo. Não é minha área.
Maria Tereza