domingo, 13 de fevereiro de 2011

Emir Sader: O NOVO QUADRO NO ORIENTE MÉDIO


ORIENTE MÉDIO: NADA SERÁ COMO ANTES

por Emir Sader, no seu blog

“Por duas fortes razões, o Oriente Médio tornou-se um pilar da política externa do império norte-americano: a necessidade estratégica do abastecimento de petróleo seguro e barato para os EUA, a Europa e o Japão, e a proteção a Israel –aliado fundamental dos EUA na região, cercado por países árabes.

Por isso o surgimento do nacionalismo árabe tornou-se um dos fantasmas mais assustadores para os EUA no mundo. Por um lado, pela nacionalização do petróleo pelos governos nacionalistas, afetando diretamente os interesses das gigantes do petróleo –norte-americanas ou europeias–, pela ideologia nacionalista e anti-imperialista que propagam –de que o egípcio Gamal Abder Nasser foi o principal expoente– e pela reivindicação da questão palestina.

A história contemporânea do Médio Oriente tem assim na guerra árabe-israelense de 1967 sua referência mais importante. A união dos governos árabes permitiu a retomada da reivindicação do direito ao Estado Palestino, que foi respondida por Israel com a invasão de novos territórios –inclusive do Egito-, com o apoio militar direto dos EUA.

Novo conflito se deu em 1973, agora acompanhado da política da OPEP de elevação dos preços do petróleo. A partir daquele momento, ou o Ocidente buscava superar sua dependência do petróleo ou trataria de dividir o mundo árabe. Triunfou essa segunda possibilidade, com a guerra Iraque-Irã incentivada e armada pelos EUA, que golpeou dois países com governos nacionalistas, que se neutralizaram mutuamente, em enfrentamento sangrento. Como subproduto da guerra, o Iraque se sentiu autorizado a invadir o Kuwait –com anuência tácita dos EUA-, o que foi tomado como pretexto para a invasão do Iraque e o assentamento definitivo de tropas norte-americanas no centro mesmo da região mais rica em petróleo no mundo.

Os EUA conseguiram dividir o mundo árabe tendo, por um lado, os regimes mais reacionários –encabeçados pelas monarquias, a começar pela Arábia Saudita, detentora da maior reserva de petróleo do mundo-, e por outro governos moderados, como o Egito e a Jordânia. A maior conquista norte-americana foi a cooptação de Anuar el Sadar, o sucessor de Nasser, que, supreendentemente, normalizou relações com Israel –o primeiro regime da região a fazê-lo-, abrindo caminho para a criação de um bloco moderado, pró-norte-americano na região, que se caracteriza pela retomada de relações com Israel –portanto o reconhecimento do Estado de Israel– e praticamente o abandono da questão palestina. Passaram a atuar também dento da OPEP, como força moderadora, favorável aos interesses das potências ocidentais.

O Egito, como país de maior população da região, com grande produção de petróleo e país daquele que havia sido o maior líder nacionalista de toda a região –Nasser– passou a ser o peão fundamental no plano político dos EUA na região. Não por acaso o Egito tornou-se o segundo país em auxílio militar dos EUA no mundo, depois de Israel e à frente da Colômbia.

Essa neutralização do mundo árabe, pela cooptação de governos e pela presença militar dos EUA no coração da região –atualizada com a invasão do Iraque– constituiu-se em elemento essencial da política norte-americana no mundo e da garantia de abastecimento de petróleo para complementar a declinante produção dos EUA e todo o petróleo para abastecer a Europa e o Japão.

É isso que está em jogo agora, depois da queda das ditaduras na Tunísia e no Egito. Impotente para agir de forma direta no plano militar, os EUA tentam articular transições que mudem a forma de dominação, mas mantenham sua essência. O Exército preferiu a renúncia de Mubarak, porque se deu conta que sua presença unia a oposição. Tem esperança que, sem ele, possa cooptar setores opositores para uma coalização moderada –com El Baradei, a Irmandade Mulçumana, com o apoio dos EUA e da Europa– que possa fazer reformas constitucionais, mas controlar o processo sucessório nas eleições de setembro, conseguindo desmobilizar o movimento popular antes que este consiga forjar novas lideranças.

Independentemente de que possa se estender a outros países da região –de que a Argélia, a Jordânia, o Marrocos, a Arábia Saudita, são candidatos fortes– a queda das ditaduras na Tunísia e no Egito demonstra que os EUA já não poderão manter o esquema de poder montado há mais de três décadas. O menos que se pode esperar é a instabilidade política na região, até que outras coalizões de poder possam se organizar, cujo caráter dará a tônica do novo período em que entra o Oriente Médio.”

FONTE: escrito pelo cientista político Emir Sader, publicado em seu blog e transcrito no portal “Viomundo” (http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/emir-sader-o-novo-quadro-no-oriente-medio.html) [imagem do Google adicionada por este blog].

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