segunda-feira, 8 de junho de 2009

SERÁ DIFÍCIL ESCLARECER ACIDENTE, DIZ FRANÇA

AGÊNCIA FRANCESA QUE INVESTIGA TRAGÉDIA COM O AIRBUS AFIRMA QUE AINDA NÃO HÁ NADA DE CONCRETO SOBRE CAUSAS DA QUEDA INVESTIGADOR AFIRMA QUE TALVEZ NUNCA SE ACHE A CAIXA-PRETA, MAS CONFIRMA QUE MENSAGEM APONTOU FALHA NO LEME DA AERONAVE

“O BEA (Birô de Investigação e Análise), agência francesa que investiga acidentes aéreos, disse ontem que a investigação sobre as causas do acidente com o voo da Air France, com 228 pessoas a bordo, está "sem nada" concreto.

Disse mais: que talvez nunca sejam encontradas as caixas-pretas de dados e voz do avião.

Os investigadores confirmaram que houve uma mensagem indicando defeito no leme do Airbus-330 que desapareceu no domingo passado, mas disse que não é possível afirmar que a peça tenha quebrado de forma a contribuir com a tragédia.

Conforme a Folha revelou ontem, às 23h10 do domingo o sistema de mensagens automáticas do avião enviou mensagem indicando "falha no controle de curso do leme". Todas as mensagens indicando primeiro a saída do avião do modo automático de voo e, depois, a perda de seus sistemas de controle seguiram-se a este alerta sobre o leme.

Segundo pilotos e especialistas ouvidos, isso indica a possibilidade de quebra do leme, superfície móvel que fica no estabilizador vertical do avião -a "asa" na sua cauda. Com o leme avariado em sua estrutura ou controle, todo o sistema de pilotagem pode ser afetado. Há também a possibilidade de o alarme ter sido um erro.

Falando em Bourget, perto de Paris, o diretor do BEA tentou minimizar a informação. "É apenas uma indicação de que um dos sistemas, o que faz a limitação de movimentos do leme e que por sua vez está ligado à velocidade, não estava operando, pelo menos quando a mensagem foi enviada", disse Paul-Louis Arslanian.

"É muito cedo para saber as causas do acidente", disse.

A cautela de Arslanian é natural. Nenhum acidente aéreo acontece por apenas um motivo, salvo em exceções como atentados. Mas o fato é que uma avaria no leme, seja ela real ou virtual, dispara uma série de degradações dos sistemas de voo.

Pilotos ouvidos veem uma situação quase incontrolável para o comandante, já que o avião estava a presumidos 10,7 km de altitude e 840 km/h em meio a uma tempestade, segundo seus últimos dados captados pelo radar brasileiro.

"Esta é apenas uma mensagem de manutenção. Ela não significa que haverá um desastre. O que temos de levar em consideração é o significado dessas mensagens. Quando formos mais fundo na investigação, talvez esse tipo de mensagem nos ajude a fechar a porta ou, ao contrário, abrir mais ainda. No momento, não temos portas nem sequer paredes, não temos nada", disse.

A falha apontada é a do limitador do curso do leme. Como é uma das partes mais frágeis do avião, o leme tem uma espécie de trava no ângulo que pode variar para evitar danos estruturais ou manobras perigosas.

Seus movimentos são limitados a 25% de inclinação no próprio eixo até 296 km/h nos Airbus. A partir dos 703 km/h, essa tolerância cai a menos de 4%. Logo, um defeito real pode significar que o leme foi atingido por uma rajada violentíssima de vento. Mais improvável, poderia ter sido uma correção deliberada feita pelos pilotos.

De concreto, segundo Arslanian, há as 24 mensagens que o sistema de mensagens de texto Acars do Airbus enviou para a manutenção da Air France.

Elas foram enviadas entre 23h10 e 23h14, quando há um aviso de velocidade vertical na cabine -o que pode indicar um mergulho rápido ou despressurização do avião.

SEM CAIXA-PRETA

O problema hoje é que talvez só haja essas 24 mensagens como evidência técnica do acidente. O BEA diz que talvez nunca sejam encontradas as caixas-pretas de dados e voz do avião. "Estamos totalmente abertos, porque temos que trabalhar com fatos. Lentamente estamos vendo que alguns aspectos, como a existência de uma bomba, é menos crível do que no início, quando tudo era possível."

Ontem, a Aeronáutica e a Marinha não conseguiram avistar destroços da aeronave.

Arslanian confirmou que havia discrepância entre as velocidades medidas nos ADRs, os computadores que recolhem de sensores externos dados de velocidade, altitude e velocidade vertical (se o avião está descendo, subindo ou alinhado). "Não podemos extrapolar e dizer que essa é a causa do acidente", afirmou.

O que gerou a discrepância é uma incógnita, mas o BEA confirmou que estava em curso um programa de substituição dos pitots, os tubos que recolhem o ar no bico do avião e que somados a outro sensor chamado porta estática faz a medição para os ADRs. Há quatro pitots por avião e três ADRs. Eles alimentam um gerenciador de navegação chamado Adiru, que por sua vez compara os dados com aqueles medidos por um giroscópio, que não utiliza sensores externos.

Há a possibilidade de, dentro de uma nuvem carregada de gelo, os sensores externos tenham congelado -apesar de terem um sistema de aquecimento. Esse problema já aconteceu no passado. Com dados incorretos, o Adiru poderia informar dados discrepantes ao painel de comando, induzindo a tripulação a fazer alguma manobra inadequada para aquela altitude e velocidade.

Em dois incidentes com A-330 da australiana Qantas no ano passado, o Adiru confundiu dados do giroscópio falho com um dos ADRs, fazendo o avião subir e descer violentamente e de forma automática, tentando corrigir uma trajetória que não estava errada.”

FONTE: jornal Folha de São Paulo, de 07/06/2009, reportagem de Marcelo Ninio, Igor Gielow e Alan Gripp, do enviado especial a Paris

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