Por Mauro Santayana
"A escalada da resistência dos talibãs e dos iraquianos demonstra que as guerras não se vencem apenas com a força militar. As guerras são movimentos que exigem das nações o máximo de sua potência moral. Na versão de Salústio, Caio Mário, o grande general plebeu, convoca seus comandados para a guerra contra Jugurta, dizendo-lhes que nenhum homem coloca um filho no mundo com a presunção de que possa ser eterno, mas com a esperança de que venha a ser honrado. De retorno a Roma, ao passar sob os arcos de triunfo, os combatentes eram a própria pátria que se honrava; nela se integravam no instante da glória. Segundo o New York Times, o principal homem da CIA no Afeganistão é Ahmed Wali Karzai, irmão do próprio presidente do país. Ahmed é o maior traficante de ópio do país. E o governo pretende tentar no Afeganistão o que não deu certo no Iraque: comprar os inimigos com dinheiro vivo. Com a corrupção formam governos, com a corrupção os sustentam e os derrubam, quando lhes convém.
Bush disse que ia ao Iraque matar Hussein porque ouvira de Deus essa ordem. Mais tarde confessou indiretamente que a guerra se devia ao vício norte-americano pelo petróleo. Como reza um provérbio persa, mesmo o mais falso dos homens diz uma verdade na vida. Consumindo mais de 12 bilhões de barris de petróleo por dia, seu governo, a serviço dos donos do poder, tem que buscá-lo onde quer que o encontre. É famosa a frase de Kissinger, para justificar a espoliação dos países periféricos: “Os países industrializados não poderão viver, se não tiverem à sua disposição os recursos naturais não renováveis do planeta. Terão que montar sistema de pressões e constrangimentos que garantam os seus objetivos”. Quando essas pressões, constrangimentos políticos e econômicos se frustram, partem para o golpe, os atentados, a guerra.
O presidente Obama está vivendo os piores dias de seu primeiro ano de governo. É evidente a pressão dos militares, exercida pelo general McChrystal, para que Washington envie mais tropas ao Afeganistão. Ocorre que de nada adianta o sangue norte-americano que vem escorrendo no Afeganistão e no Iraque, em troca de petróleo e gás, quando os governantes títeres dos invasores se putrefazem na corrupção e no tráfico de ópio. Depois do atentado de anteontem em Kabul, contra o escritório da ONU, 92 pessoas morreram no mercado de Peshawar, no Paquistão, que estava apinhado. Os Estados Unidos e a Otan não terão tropas para enfrentar essa ampliação do conflito.
É famosa a constatação do irreverente – mas, assim mesmo, grande estadista – que foi Georges Clemenceau: a guerra é uma coisa grave demais para ser confiada aos militares. Sendo uma decisão política, deve ser politicamente conduzida. Obama se vê pressionado pelos democratas, aos quais se unem moderados republicanos, a encontrar uma forma de se retirar da região, mas os falcões recebem sua ração de arenga por parte de Dick Cheney e outros membros do governo anterior. Os Estados Unidos cumpriram um grande destino, em benefício de grande parcela de seu povo. Sendo um país de imigrantes, venceu, com o tempo – e com o sangue – muitos dos preconceitos raciais que o manchavam. Mas terão que buscar o melhor caminho a fim de renunciar à ideia de que são os árbitros e senhores do mundo. O presidente Obama, sob a pressão constante dos que reclamam o avanço da democracia social e dos que a isso se opõem, tenta ganhar algum tempo, e é provável que tema, como temeram alguns de seus predecessores, o fanatismo dos conservadores, sempre alimentado pelos grandes interesses das corporações financeiras, industriais e militares. Cabe-lhe ainda administrar o pânico previsto diante da gripe suína – cuja ameaça cresce com o inverno nórdico – a reação poderosa do complexo farmacêutico-hospitalar contra a ampliação do seguro médico oficial e a crise econômica, que se expressa nos crescentes déficits do Tesouro.
O mito da invencibilidade bélica norte-americana está, mais uma vez, à prova. Ele foi desmentido na Coreia, na Baía dos Porcos, no Vietnã – e até mesmo na Somália. E está sendo desmentido no Iraque e no Afeganistão – com maiores consequências geopolíticas do que no passado. Quanto ao guerreiro Bush, de acordo com o que ele mesmo revelou, anteontem, em público, se compraz em rezar, passear com seu cachorro pelas ruas de Dallas, e, como bom cidadão, recolher as fezes do animal pelo caminho."
FONTE: artigo do jornalista Mauro Santayana publicado no Jornal do Brasil e também reproduzido (29/10) no blog "De um sem mídia", de Carlos Augusto de A. Dória.
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