segunda-feira, 21 de março de 2011

Emir Sader: “UMA VISITA MARCADA POR MAIS UMA GUERRA”


“A marca da visita de Obama não está dada por nenhum pronunciamento ou acordo assinado, mas pelo cenário do bombardeio da Líbia, com a sempre falsa justificativa de que fazem para defender os civis. Mesmo no plano do discurso, dos acordos e do seu itinerário, a visita foi decepcionante.

O senador Suplicy me ligou dizendo que não estava de acordo com uma mensagem que publiquei no twitter convocando os cariocas a um domingo de praia ao invés de ir ao comício que o Obama deveria fazer na Cinelândia. Ele dizia que o Obama era o continuador dos sonhos do Martin Luther King. E se, de repente, depois de conversar com a Dilma, ele anunciasse a fim do bloqueio a Cuba no comício?

O Suplicy me perdoará se não for absolutamente textual –se ele quiser precisar seus argumentos, pode escrever que a Carta Maior publicará integralmente seu artigo. Mas estou seguro que esses eram os dois argumentos que ele me expôs e eu, democraticamente, contra-argumentei.

Disse que é verdade que Obama representou –ou, para alguns, anda representa– um polo progressista dentro dos EUA, contra a direita e a ultradireita. Mas, mesmo lá dentro, apesar dos seus discursos contra os bancos, como causadores da crise, ele salvou os bancos, acreditando que eles salvariam os EUA, mas os bancos se salvaram a si mesmos e deixaram o país na recessão, com a elevada taxa de desemprego que ainda tem.

Mas, principalmente fora dos EUA –elemento inseparável para uma potência imperial-, sua política continua exatamente a mesma do Bush, ele não cumpriu nenhuma das promessas que fez: nem terminou com o bloqueio a Cuba, nem saiu do Iraque, e agora promove uma nova guerra, contra a Líbia.

Uma vez realizada a visita, creio que a posição que defendi se justifica ainda mais. A marca da visita não está dada por nenhum pronunciamento ou acordo assinado aqui, mas pelo cenário do bombardeio da Líbia, com a sempre falsa justificativa de que fazem para defender os civis do país.

Mesmo no plano do discurso, dos acordos e do seu itinerário, a visita foi decepcionante. Nos discursos, ele fez o mínimo possível de concessões: depois de ter apoiado expressamente a Índia para ingressar no Conselho de Segurança da ONU, fez apenas uma menção simpática ao Brasil –“apreço”-, longe do compromisso com o pais asiático. Os EUA não cumpriram com sua parte nos novos acordos comerciais e Obama tenta justificar a postura com a crise econômica, que dificultaria abrir o mercado dos EUA. Não havia nenhum sintoma de que anunciaria o fim do bloqueio a Cuba ou qualquer outra medida progressista, como seus pronunciamentos confirmaram.

Obama não trouxe o Ministro de Energia, como estava planejado, diminuindo as possibilidades de acordos nessa área. Rejeitou o convite para um jantar reservado com Dilma em Brasília, onde ficou apenas algumas horas, partindo rapidamente para o Rio. Aqui, fez programas familiares no jantar, na visita ao Corcovado e a Cidade de Deus. A suspensão do comício na Candelária –que tranquilizou o governo, que não via com bons olhos a operação– levou a um discurso no Teatro Municipal, onde houve mais seguranças, policiais e escoltas do que público.

Sua passagem –cujo aspecto mais importante foi o de que, pela primeira vez, um presidente empossado no Brasil é visitado por um presidente norte-americano, ao invés de ir visitá-lo– deixa uma imagem frágil, de pouca transcendência, de mais um presidente dos EUA que não somente não deixa um cenário de guerra –o Iraque– como prometido, como leva seu país, no momento da sua viagem, a mais uma.”

FONTE: escrito pelo cientista político Emir Sader e publicado no site “Carta Maio” (http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=683).

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