segunda-feira, 16 de junho de 2014

AEROPORTO PRIVADO: BOM OU RUIM?



Aeroportos privados: isso é bom ou ruim para o país?


Governo deve tomar decisões sobre a criação de novos terminais aeroportuários. Segundo o interesse privado, ou somente após ampla consulta aos envolvidos?

Por José Augusto Valente

"O governo federal parece determinado a mudar a legislação atual para viabilizar a implantação de aeroportos privados no Brasil. Como essa não é uma proposta da esquerda, suponho que seja resultado das pressões de partidos, nas negociações de apoio para as eleições presidenciais. O marco regulatório em vigor somente permite aeroportos públicos, operados diretamente pela Infraero ou em parceria com empresas privadas, via concessão, a partir de processo licitatório específico. É o caso de Campinas, Guarulhos, Galeão, Confins/MG e Brasília, entre outros.

O primeiro aeroporto privado da lista, aguardando a nova lei, é o de Caieiras/SP, do "grupo CCR", que administra várias rodovias estaduais e federais, além da Ponte Rio-Niterói e o aeroporto de Confins/MG. Esse assunto tem ocupado espaço relevante nos veículos da imprensa, mostrando uma divergência entre gigantes da construção civil brasileira: Camargo Correa/Andrade Gutierrez (CCR) de um lado, Odebrecht do outro.

Para entendermos melhor o que orienta essa proposta, precisamos conhecer qual o quadro atual nos diversos países, especialmente nos desenvolvidos. Segundo Neeleman, dono da "Azul", “a privatização talvez não seja a melhor opção. Isso porque os aeroportos privados tendem a encarecer os serviços, os custos das empresas e os preços das passagens. Aeroporto é um negócio diferente dos demais. Não dá para abrir um aeroporto aqui porque outro cobra caro ali. Não há espaço para isso. Na Argentina, no México e na Inglaterra, onde os aeroportos foram privatizados, o resultado foi desastroso. Hoje, eles têm as tarifas mais altas do mundo. Nos EUA, não há nenhum aeroporto privado de importância, e o sistema funciona bem. Lá, os aeroportos não são do governo federal, mas dos Estados ou das cidades. Eles têm um presidente e um conselho de administração que tomam as decisões. A legislação obriga os administradores a aplicar o lucro da operação nos próprios aeroportos. Os maiores, como o de Dallas, no Texas, ganham tanto dinheiro com o aluguel de estacionamento e lojas que não cobram nada das companhias aéreas. Assim, mais gente viaja por lá, porque as tarifas são mais baixas. Eles sabem que podem ganhar mais com o desenvolvimento da economia – com taxistas, hotéis e restaurantes – do que com o aeroporto.

O movimento de privatização dos aeroportos foi mais forte no Reino Unido e, posteriormente, na Austrália e Nova Zelândia. Na Europa continental, a opção foi por um modelo de privatização parcial, com o setor público permanecendo com a maioria do capital dos aeroportos.

No caso brasileiro, o que me parece relevante nessa discussão é responder a duas questões básicas:

a) A competição de aeroportos é sempre benéfica para os usuários do sistema?
b) O Governo federal deve tomar decisões sobre a criação de novos terminais aeroportuários, segundo o interesse privado, ou somente após ampla consulta aos envolvidos?

A primeira pergunta exige que se leve em consideração que aeroportos tendem a se constituir em monopólios naturais, devido ao elevado valor de investimento e manutenção, que exige economia de escala para garantir custos atrativos para os usuários. Assim, para aeroportos já estabelecidos - com ônus de outorga e rigorosa regulação - a concorrência com aeroportos privados pode levar à quebra dessa escala alcançada, com consequências negativas nos preços e/ou qualidade dos serviços oferecidos. Logo, é mais provável que competição entre aeroportos públicos e privados não seja uma boa para os usuários e para o país.

A segunda pergunta aponta para considerar que aeroportos devem ser planejados para maximizar a demanda e reduzir custos para os usuários e operadores. Além disso, provocam forte impacto ambiental e trazem riscos para quem mora ou trabalha no seu entorno. Finalmente, que as empresas aéreas poderão ter interesse ou não na utilização de novos terminais, em função de diversas variáveis.

Assim, é imperioso levar em conta um planejamento criterioso, bem como consultar, não só as empresas aéreas, mas também os moradores da cidade onde se instalará o terminal e, em especial, os que moram ou trabalham no entorno, para que digam se o eventual benefício a ser gerado compensa os custos intangíveis, como barulho, poluição, elevado investimento em mobilidade urbana e risco de acidente.

Assim, a anunciada Medida Provisória sobre o tema, ora em gestação na Casa Civil, terá que garantir tanto mecanismos deliberativos de consulta, como de análise de impacto regulatório, para avaliar os possíveis estragos no sistema estabelecido, se quiser evitar a possibilidade de “dar um tiro no pé”.

De outro lado, a direita e centro-direita querem a abertura ampla, geral e irrestrita de aeroportos, para a iniciativa privada implantar e operar, segundo seu interesse, com o mínimo de regulação possível e, de preferência, sem consulta alguma. A eterna luta entre o interesse público e o interesse privado!

Vamos aguardar o texto legal, para uma avaliação do rumo tomado e dos possíveis riscos para o sistema."

FONTE: escrito por José Augusto Valente, especialista em Logística e Transportes  (http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Aeroportos-privados-isso-e-bom-ou-ruim-para-o-pais-/4/31122).

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