O blog do Noblat publicou ontem o artigo a seguir transcrito, de autoria da Senadora Ideli Salvatti (PT-SC), líder do PT e do Bloco de Apoio ao Governo no Senado:
“A crise financeira por que passa o planeta não terá abalado apenas as economias dos países desenvolvidos e dos emergentes. Os tremores serão sentidos também nos gabinetes dos pensadores sobre as políticas econômicas a serem adotadas pelos governantes de agora em diante.
Economistas de todo o mundo parecem concordar que, de uma forma ou de outra, o Estado terá um papel maior na economia daqui por diante. E há dois pontos de referência para discutir este período específico da história: o ciclo de crises da economia e as fórmulas para evitá-las.
Karl Marx disse que o capitalismo vive crises cíclicas. Nas últimas décadas, com o fito de enfrentar essas crises, surgiu o receituário do Estado Mínimo e o neoliberalismo, defendendo que, com determinadas providências macroeconômicas, um governo enxuto e a liberdade de mercado, essas crises poderiam ser evitadas.
Agora, o mundo vive uma crise no epicentro da sua estrutura econômica e financeira.
As fórmulas neoliberais terão ido para o lixo da história?
O neoliberalismo era uma antítese ao modelo do Estado regulador. E, segundo o cientista político Emir Sader, só quando as potências centrais fossem vítimas da desregulação do mercado, a farra especulativa teria um limite. Agora a Bolsa de Nova York e o sistema financeiro dos países desenvolvidos são vítimas da especulação. "Esse momento chegou", afirma Sader.
Eis que - oposto ao receituário neoliberal do Estado Mínimo, como um oráculo, o economista Delfim Neto declarou recentemente: "Meus amigos, não se preocupem. Os governos salvarão os mercados." O lingüista Noam Chomsky já vê a economia dependente do Estado. "É um sistema no qual o público paga os custos e assume os riscos, e os lucros são privados", pontua, para o arrepio dos neoliberais.
Eis, porém, que a principal resposta apresentada pelos países desenvolvidos para solucionar a crise constituiu-se num forte golpe no neoliberalismo. Primeiro, na intervenção do governo norte-americano. A ajuda financeira aos bancos e às suas principais agências de crédito imobiliário é o reconhecimento do governo da maior potência capitalista do planeta quanto à incapacidade de o mercado encontrar todas as soluções para seus problemas. A ação - e não o discurso - fala por si: o mercado falhou e produziu a maior crise financeira de todos os tempos, e ponto final.
A cartilha neoliberal começou a ser colocada num canto obscuro da prateleira. O primeiro-ministro da Inglaterra, Gordon Brown, deu a senha. A Inglaterra decidiu lançar um programa de recapitalização e nacionalização do sistema bancário. Ou, em português claro, estatização. Cabe reafirmar que a injeção de recursos públicos na aquisição de um empreendimento privado é, sim, estatização.
Ora, estatizar é ir contra a proposta do Estado Mínimo, defendida pelo antecessor de Brown, Tony Blair, de quem, aliás, foi seu ministro de Finanças. Qual é a diferença entre um Estado Mínimo e um Estado Máximo? E, portanto: Qual o papel do Estado, na sociedade? Foi Estado Mínimo, concepção de fundo conservador, que deu origem ao receituário neoliberal.
Durante anos defendeu-se uma idéia de um Estado Mínimo que pressupõe a não-intervenção e seu afastamento em prol da liberdade individual e da competição entre os agentes econômicos.
Segundo o neoliberalismo, este seria o pressuposto da prosperidade econômica, daí a dificuldade de estes teóricos enfrentarem a crise atual.
Na cartilha desses economistas, a única forma de regulação econômica são (ou eram) forças do mercado, as mais racionais e eficientes possíveis. Ao Estado Mínimo caberia garantir a ordem, a legalidade e concentrar seu papel executivo naqueles serviços mínimos necessários: policiamento, forças armadas, poderes executivo, legislativo e judiciário. Portanto, um Estado que abriria mão de toda e qualquer forma de atuação econômica direta, como no caso das empresas estatais.
A esta altura, o sinal que o governo brasileiro emite sobre a presença do Estado, ao largo de idéias polarizadas, é a visão social da sua atuação, também nas determinantes econômicas. O presidente Lula disse, em recentes declarações no Exterior que, mais do que cuidar apenas da economia, os governantes precisam fazer uma abordagem política dos problemas financeiros que o mundo enfrenta com a crise mundial.
Muito além do esgotado neoliberalismo, um Estado que atue para fortalecer o seu mercado interno. É o que vem fazendo o Brasil ao adotar políticas sociais voltadas para a distribuição da renda. Além, portanto, dos estritos mecanismos dos ajustes macroeconômicos (indispensáveis) como o controle da inflação, da dívida pública e da política monetária.
Com a redução da concentração de renda, fortalece-se o mercado interno; com a ampliação das oportunidades, o Estado, com a educação, aposta no seu crescimento sustentado. Com os investimentos na infra-estrutura, em parceria com o empresariado, o Estado induz ao fortalecimento dos setores que suportam o crescimento no longo prazo.
O governo tem atuado com o Bolsa-Família, que já apresenta resultados na redução da concentração de renda, reconhecidos em todo o mundo. No mesmo sentido, tem atuado no fortalecimento da agricultura familiar, reduzindo o custo da alimentação, e ampliando o financiamento da agricultura como um todo.
Além de aumentar a capacidade de consumo da família brasileira, como apontam os estudos do IBGE, reforça também a capacidade de investimento das empresas, por intermédio da ampliação de linhas de crédito do BNDES.
Fortalece o consumo, dinamiza a economia e a robustece para enfrentar crises financeiras mundiais.
E agora surge no cenário internacional uma nova pauta, que inegavelmente terá flutuado como uma sombra ameaçadora sobre os dirigentes de todas as nações desenvolvidas, açuladas pela recessão: haverá necessidade de regular o sistema financeiro internacional e acabar de uma vez por todas com a crendice de que o mercado vai regular-se pelos seus próprios interesses.
Com a cartilha neoliberal no lixo, é hora de buscar soluções naqueles que já apontavam para as crises e para as suas soluções. O historiador britânico Eric Hobsbawn recomenda a releitura de Karl Marx, não como um receituário de governo, mas como uma forma mais realista de ver o capitalismo. Não fará mal, recomenda o historiador inglês, revisitar John Maynard Keynes, que defendeu a atuação do Estado no fortalecimento econômico das nações.”
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