quinta-feira, 8 de outubro de 2009

LE MONDE: EM HONDURAS, OS "LEGALISTAS" REFUTAM ELEIÇÕES CONTROLADAS PELOS GOLPISTAS

"Carlos H. Reyes nos recebe no jardim de sua modesta casa, na capital hondurenha. Candidato da esquerda à eleição presidencial, esse militante conhecido por ser íntegro logo escolheu seu campo após o golpe de 28 de junho que derrubou Manuel "Mel" Zelaya. Espancado enquanto participava de uma manifestação de protesto, em julho, teve um pulso fraturado. Ele não se ilude a respeito do resultado das negociações que devem se abrir na capital hondurenha sob a égide da OEA (Organização dos Estados Americanos), ainda que as pressões se acentuem sobre o regime golpista.Nas ruas, hondurenhos não acreditam no término da crise política no país.


O presidente interino Roberto Micheletti anunciou a uma delegação de congressistas republicanos que ele poderia decretar, no início da semana, o fim do estado de exceção instaurado após a volta surpresa do presidente deposto. Ele prometeu a uma missão de parlamentares brasileiros que sua embaixada não seria atacada. Cercada por 500 militares, ela abriga há quinze dias Zelaya e sua comitiva. O meio empresarial, preocupado com a rápida degradação da economia, as igrejas, o embaixador dos Estados Unidos e uma primeira delegação da OEA aumentaram os contatos para tentar retomar o diálogo.

"Nossa posição é clara: não aceitaremos nenhum acordo que implique a impunidade para os golpistas e os corruptos", ressalta Carlos Reyes. No campo golpista, repetem que a solução para a crise virá das eleições gerais previstas para 29 de novembro.

Zelaya pede a aplicação de um acordo negociado pelo presidente da Costa Rica, Óscar Arias, que prevê seu retorno condicionado à Presidência até janeiro. Muitos países anunciaram que não reconhecerão os resultados das eleições se elas forem organizadas pelo governo interino. "Micheletti acha que a comunidade internacional acabará os validando", diz Jaime Rosenthal. Filho de um imigrante judeu que se refugiou em Honduras em 1929, fugindo das perseguições antissemitas na Europa, ele se tornou um dos mais poderosos empresários hondurenhos e um dos raros a terem condenado o golpe de Estado. Próximo de Zelaya durante seus primeiros anos de presidência, o fundador do grupo Continental, cujas atividades vão desde bancos até a exportação de pele de crocodilo, passando pelos setores de construção, comunicações, alimentício, imobiliário e de seguros, depois se distanciou dele.

"Só participaremos das eleições se a ditadura acabar. Não é possível fazer campanha enquanto os militares governam, e todas as grandes mídias, controladas pelos golpistas, destilam o ódio e a intolerância", ressalta Carlos Reyes.Veja a cronologia da crise

Desde que foi eleito, em 2005, Manuel Zelaya se aproximou cada vez mais dos governos de esquerda da América Latina, promovendo políticas sociais no país. Ao mesmo tempo, seus críticos argumentam que Zelaya teria se tornado um fantoche do líder venezuelano Hugo Chávez e acabou sendo deposto porque estava promovendo uma tentativa ilegal de reformar a constituição

Como ele passou a apoiar "Mel" Zelaya, produto puro da oligarquia rural, acusado de corrupção por aqueles que o derrubaram? "Eles o acusam de ter roubado, mas são todos ladrões. Quando ele aumentou o salário mínimo, eu não ia me opor", responde. "Mel começou a mudar quando se deu conta de que a oligarquia não o deixava fazer nada.

Jaime Rosenthal critica Zelaya por ter aprofundado o fosso entre ricos e pobres. "Os golpistas, civis e militares, não querem que ele volte ao poder, pois eles temem medidas de represálias", diz. Apesar das divisões que rompem o Partido Liberal de onde saíram Micheletti e Zelaya, ele pensa que a esquerda tem pouca chance de ganhar: "os dois grandes partidos, liberal e nacional, sobreviverão graças ao clientelismo e ao fato de que eles são os únicos implantados em todo o país". Por falta de acordo entre os dois campos, ele teme eleições tumultuadas: "Os postos de votação estão instalados nas escolas e os professores estão no centro da mobilização por 'Mel' Zelaya".

FONTE: reportagem de Jean-Michel Caroit, enviado especial a Tegucigalpa (Honduras), publicada hoje no jornal francês Le Monde e reproduzida no portal UOL.

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