sábado, 20 de março de 2010

O IRÃ QUE SE CUIDE

Artigo evidencia a "agenda oculta" da intensa campanha dos EUA (e da grande mídia, sua aliada ou dependente) contra o Irã, acusando-o de pensar em, no futuro, talvez também fazer armas atômicas como seu vizinho Israel. Tal hipótese, para os EUA e Israel, já justificaria "duras sanções" e até ataque militar e invasão do território e reservas petrolíferas iranianas.

"A China tem bons motivos para não mexer no câmbio, e os EUA não têm fôlego para forçar a mudança

Pela primeira vez desde que se tornaram hegemônicos, os Estados Unidos mostram-se incapazes de liderar uma recuperação da economia mundial. O bastão passou para a China, que multiplica parcerias e já responde pela maior parte do crescimento global. Mesmo assim, está na berlinda, acusada de manter sua moeda artificialmente desvalorizada. Organismos multilaterais têm se pronunciado sobre isso, o governo americano já elevou tarifas de importação de produtos chineses e o Congresso discute a adoção de novas medidas, mais abrangentes, na mesma direção.

São crescentes as pressões para a valorização do yuan. A meu ver, isso não acontecerá: a China tem bons motivos para não mudar, e os EUA não têm fôlego para forçar a mudança.

Desde a década de 1970, quando romperam os Acordos de Bretton Woods, os EUA manejam livremente a emissão da moeda do mundo, que é a sua, como instrumento de hegemonia.

Recentemente, a emissão de trilhões de dólares para salvar instituições financeiras, combinada com taxas de juros em torno de zero, reforçou a tendência à desvalorização do dólar, que é funcional para a economia americana, entre outros motivos porque desvaloriza suas dívidas. Cria-se, ao mesmo tempo, uma superoferta de recursos que perambulam pelo mundo. Países que adotam uma posição passiva e concedem ampla liberdade à entrada e saída de capitais, como o Brasil, orgulham-se de recebê-los em abundância. São muito elogiados. Mas expandem seu passivo externo de curto prazo e valorizam suas moedas, punindo os sistemas produtivos locais.

Para escapar das armadilhas inerentes a esse padrão monetário, a engenhosa solução chinesa foi atrelar o yuan ao dólar, de modo a neutralizar as flutuações desse último. Não vejo por que os chineses abandonariam essa política, que tem contribuído para o seu excepcional desempenho.

A capacidade de retaliação americana tem limitações, até porque afrontaria interesses internos. Mais que do câmbio, a atual disparidade comercial entre os dois países decorre das políticas de investimento das grandes empresas dos EUA, que deslocaram em grande escala atividades manufatureiras para a China. Uma parte do deficit americano é lucro das suas multinacionais. (Nos setores em que a produção física permaneceu nos EUA, como agricultura e certos produtos de alta tecnologia, o país asiático segue sendo um grande comprador.)

Basta observar as agendas dos dois países para constatar que o tempo está a favor da China. Os EUA lidam, principalmente, com déficit e guerras: consomem demais, poupam de menos, sustentam um sistema financeiro agigantado e quebrado, aumentam a presença militar no mundo, mantêm exércitos em operação em outros continentes e gerenciam Estados falidos, como o México.

A China, sem pirotecnias presidenciais, amplia o mercado interno, moderniza a infraestrutura, aumenta a base produtiva instalada em seu território, incrementa a capacitação científica, aprofunda relações com os polos dinâmicos da Ásia e os países produtores de petróleo, investe pesadamente na exploração dos recursos africanos, consolida os laços com a Rússia, grande potência energética, e se torna o principal parceiro comercial da América do Sul, desbancando até o Brasil.

Não é o câmbio que explica isso. É um projeto nacional consistente. Para tentar contê-lo, talvez os EUA precisem gerar uma gigantesca instabilidade internacional. O Irã que se cuide.

FONTE: escrito por CESAR BENJAMIN, editor da Editora Contraponto e doutor honoris causa da Universidade Bicentenária de Aragua (Venezuela). É autor de "Bom Combate" (Contraponto, 2006). Publicado hoje (20/03) na Folha de São Paulo [1º parágrafo colocado por este blog].

Um comentário:

Probus disse...

As riquezas do Irã em gás natural: EUA miram a principal energia do mundo futuro


"Até agora, o foco parecia ser principalmente o petróleo. Há por exemplo afirmações que um planeado pipeline do Mar Cáspio para o Mar Arábico através do Afeganistão e do Paquistão é o prêmio principal por trás campanha militar aparentemente fútil dos EUA naqueles países.

Mas o que mostra o partenariado CNPC-Irã é que o gás natural é prêmio principal que será essencial para a economia do mundo, e especificamente o fluxo de duas vias deste combustível para o Leste e Oeste da Ásia Central rumo à Europa e à China.

Ele destaca a recente previsão da International Energy Agency (IEA), com sede em Paris, que reviu dramaticamente em 100 por cento as suas estimativas das reservas globais de gás natural. Economides atribui este enorme aumento a rápidas melhorias tecnológicas em extrair de campos de gás até agora inacessíveis. Afirma que a IEA estima quantidades de gás natural para 300 anos de abastecimento da atual procura mundial.

Se alguém simplesmente fantasiar quaisquer contribuições futuras de ordens de grandeza dos maiores recursos na forma de hidratos de gás, é fácil ver como é quase certo que o gás natural evolua até ser o primeiro combustível da economia mundial"

http://port.pravda.ru/busines/24-03-2010/29150-riquezas_ira-0