domingo, 8 de agosto de 2010
A ORIGEM DAS RESERVAS DE PETRÓLEO
A ORIGEM DO PETRÓLEO: MATÉRIA DO “NEW YORK TIMES”
“Nesta semana, o ‘The New York Times’ publicou reportagem sobre as origens do petróleo. O texto informa que, de acordo com a teoria mais aceita, a maior parte do combustível fóssil da Terra surgiu de pequenos organismos do mar. A matéria explica por que a exploração offshore tende a se fortalecer ao longo do tempo e cita a Petrobras e seus investimentos no setor
RECONSTITUINDO A ORIGEM DAS RESERVAS DE PETRÓLEO
William J. Broad
“Em 1913, quando o automóvel surgiu na vida dos americanos, a revista ‘The Outing Magazine’ apresentou a seus leitores um resumo da história do combustível dos novos veículos no artigo ‘The Story of Gasoline’ (A história da gasolina). Depois de uma rápida vinheta que descrevia a morte do “Stegosaurus Ungulatus”, o artigo explicava que “ontem, você entornava os restos do dinossauro com uma lata de medida — que, supomos, tinha capacidade de cinco galões quando cheia — em seu tanque de gasolina”.
A história, que as crianças adoram ouvir, de que o petróleo teria se originado de terríveis lagartos persistiu por muitas décadas. A logomarca e os anúncios publicitários da Sinclair Oil Company retratavam um dinossauro, e a empresa decorava seus postos de gasolina com réplicas gigantes dos animais com longos pescoços e caudas. A publicidade deu um novo sentido ao termo “combustíveis fósseis”.
Porém a ênfase se revelou equivocada.
Atualmente, um dos mais importantes princípios da geologia afirma que a maior parte do petróleo do mundo surgiu não de animais pesados e desajeitados da terra, mas, sim, de minúsculos organismos do mar. Essa teoria afirma que enormes quantidades de organismos microscópicos caíram sobre as profundezas escuras durante séculos, produzindo sedimentos espessos que o calor interno da Terra acabou transformando em petróleo. Estima-se que 95% ou mais do petróleo existente no mundo tenha se originado no mar.
“Esta é a teoria predominante”, disse o cientista emérito David A. Ross, do Instituto Oceanográfico Woods Hole, em Cape Cod. A ideia, acrescentou, foi investigada por geólogos que percorreram o globo terrestre durante décadas, observando repetidas vezes que camadas de sedimentos marinhos são um “bom indicador” de onde se pode encontrar petróleo.
A teoria explica ainda a perfuração em alto-mar – por que existe petróleo em muitos leitos marinhos, por que a localização é quase sempre próxima da costa e não nas profundezas abissais e por que, a despeito do desastre ocorrido com a plataforma ‘Deepwater Horizon’ no Golfo do México, que matou 11 pessoas da equipe e causou o maior vazamento de petróleo da história dos EUA, os especialistas dizem que a perfuração em alto-mar deve aumentar ao invés de cessar.
À medida que os reservatórios da terra secarem, dizem os geólogos especializados em petróleo, os elevados custos e os possíveis riscos da perfuração em alto-mar serão menos dispendiosos e mais aceitáveis. Obviamente, trata-se de uma questão tanto política e econômica, quanto geológica. Não é porque existe petróleo que os poços precisam necessariamente ser perfurados. Muitas coisas podem afetar a frequência da perfuração em alto-mar, como o interesse público e o compromisso com o desenvolvimento de fontes alternativas de energia, e não estamos falando aqui apenas da energia solar, eólica, geotérmica e outros processos naturais, mas também da fissão nuclear e até mesmo da fusão nuclear.
Seja qual for a importância do petróleo no futuro, as camadas em alto-mar são provavelmente as mais novas fontes. “Da maioria das áreas da Terra, é no alto-mar que está o maior potencial”, disse William E. Galloway, geólogo especializado em petróleo da Universidade do Texas, em Austin. “Temos perfurado poços há cem anos e a maioria desses poços localiza-se na terra. Portanto, os volumes ainda inexplorados estão basicamente em alto-mar, em áreas que antes eram inacessíveis.”
Algumas das antigas áreas oceânicas que produziam petróleo para o planeta ainda existem, como o Golfo do México, ao passo que outras desapareceram há muito tempo, como o oceano onde foram perfurados os gigantescos campos petrolíferos do Oriente Médio. Os corpos vêm e vão, pois a crosta terrestre, embora aparentemente rígida, na verdade se movimenta bastante ao longo das eras geológicas, separando continentes e bacias oceânicas, reagrupando-as depois como se fossem peças de um enorme quebra-cabeça.
O segredo da história do petróleo acabou se resumindo ao conhecimento de como os extintos oceanos, mares antigos e corpos menores de água produziram as complexas condições ambientais que aumentaram a prevalência de vida microscópica e garantiram que fossem enterradas nas profundezas, acabando por produzir os principais reservatórios de petróleo da Terra.
Os indícios foram se multiplicando durante mais de um século e incluíam descobertas geológicas, químicas e paleontológicas. Uma das primeiras indicações dizia respeito ao fato de que as descobertas de petróleo estavam sempre associadas às camadas antigas de rochas sedimentares – o tipo que se forma quando resíduos penetram na água durante séculos e, lentamente, formam camadas espessas de leito marinho.
Na década de 1930 houve um grande avanço. Alfred E. Treibs, químico alemão, descobriu que o petróleo continha resíduos fósseis de clorofila, o componente das plantas que ajuda a converter a luz do sol em energia química. A clorofila parecia ser proveniente das minúsculas plantas encontradas nos mares antigos.
Nas décadas de 1960 e 1970, amostras de petróleo continham muitas moléculas de fósseis. Os hopanóides, uma classe dessas moléculas, eram considerados como representantes de resíduos de antigos micróbios que se alimentavam dos detritos presentes nos leitos marinhos. Um livro publicado em 2009, ‘Echoes of Life: What Fossil Molecules Reveal About Earth History’ [Ecos da vida: o que as moléculas de fósseis revelam sobre a história da Terra] (Oxford University Press), diz que os geólogos encontraram tantas moléculas fósseis, e de tantas variedades, que começaram a usá-las como impressões digitais para identificar as relações entre as famílias de moléculas existentes nos bolsões de petróleo de águas profundas.
Uma outra descoberta importante ocorreu quando paleontologistas, examinando petróleo, reconheceram uma série de microfósseis. Quase sempre menores do que grãos de areia, os fósseis, no entanto tinham muito a dizer. Muitos eram foraminíferos, minúsculas criaturas marinhas com uma desconcertante formação de conchas. Geólogos especializados em petróleo começaram usando a aparência mutante dos foraminíferos como um guia confiável para a datação geológica.
À medida que as peças começaram a se encaixar, o cenário começou a ser visualizado. Foi a opinião dominante na década de 1970.
O processo normalmente começa em mares quentes ideais para a incubação da vida microscópica. É difícil imaginar a massa como um todo. Mas os cientistas observam que cada gota da água do mar contém mais de um milhão de minúsculos organismos.
A produção de petróleo começa quando as águas superficiais se tornam tão abundantes em vida microscópica que a chuva de resíduos supera a deterioração do leito do mar. O resultado é o espessamento do acúmulo do sedimento biológico.
Dorrik Stow, geólogo especializado em petróleo da Universidade Heriot-Watt, em Edimburgo, disse que o fluxo de nutrientes presente nas águas superficiais — provenientes em parte de rios e regiões costeiras e em parte do fluxo ascendente das águas das correntes do fundo das águas — determina a riqueza da vida microscópica e, em última instância, a abundância do petróleo.
Em seu livro ‘Vanished Ocean: How Tethys Reshaped the World’ [Oceano desaparecido: como o Tethys deu nova forma ao mundo] (Oxford University Press), Stow descreve como essas ondas de nutrientes podem provocar “uma orgia biológica” de reprodução frenética que acaba se transformando em uma “peste negra”. A lama negra se mistura com os restos de vida e, com o tempo, forma uma rocha sedimentar.
A história do Golfo do México mostra quantos fatores ambientais foram necessários para produzir imensas reservas de petróleo. Talvez o mais importante tenha sido os fluxos ricos em nutrientes provenientes dos grandes rios e cursos de água da América do Norte que desaguaram no antigo golfo, do mesmo modo como faz o Rio Mississippi hoje.
Scott W. Tinker, geólogo do estado do Texas, disse que os fluxos abundantes de lama e sedimento não apenas serviram de alimento para a vida microscópica, como também formaram barreiras rochosas que isolaram os restos orgânicos do mundo externo. Uma barreira importante foi o xisto, rocha sedimentar formada por argila e lodo.
“Os materiais orgânicos foram rapidamente soterrados sob o peso dos sedimentos”, diz Tinker. “Com isso, a biodegradação leva mais tempo. E a riqueza orgânica é preservada.”
Segundo ele, o fluxo foi tão pesado que os acúmulos cada vez maiores continuam pressionando as camadas sedimentares inferiores mais para o fundo da terra, pressionando-as em direção às zonas quentes onde o material orgânico é transformado em petróleo. O processo envolve uma série longa de reações químicas que lentamente transformam moléculas com vida em petróleo bruto inanimado.
“O golfo tem quilômetros e quilômetros de sedimentos”, afirmou. “De modo que as rochas ígneas são pressionadas em direção ao calor interno da terra.
A temperatura padrão da formação do petróleo varia de 120 a 210 graus Fahrenheit. Quanto maior a profundidade, mais elevada a temperatura da terra, que acaba ficando tão alta que as rochas derretem (e ocasionalmente reemergem na superfície em erupções vulcânicas).
O contexto ambiental do golfo também contribuiu para a formação de petróleo. O fato do antigo corpo de água estar, na sua maior parte, separado das influências diluidoras do mar como um todo fez com que houvesse uma concentração de nutrientes e lama.
“O golfo sempre foi uma região confinada”, disse Galloway, da Universidade do Texas. “Uma razão pela qual ele funciona como um recurso de grande importância é o fato de ter sido em grande parte isolado dos oceanos do mundo.”
Segundo os cientistas, as restrições aos fluxos de água acabaram desempenhando papéis importantes na determinação de onde o petróleo se forma. O Mar Tethys — oceano antigo que envolveu a linha do equador no Período Cretáceo, há cerca de 100 milhões de anos, no auge dos dinossauros — tornou-se uma fábrica esparramada.
Suas regiões mais produtivas estão concentradas em linhas litorâneas, regiões costeiras e mares rasos, disse Stow, da Universidade Heriot-Watt, cujo novo livro descreve a vida secreta do Tethys. Ele identificou “amplas áreas em prateleiras” como uma das melhores “fábricas para a proliferação biogênica”. Quando o Tethys praticamente deixou de existir (entre seus vestígios estão os mares Aral, Negro, Cáspio e Mediterrâneo), suas costas férteis do sul formaram a dezena de nações do Oriente Médio que produzem dois terços do petróleo do mundo.
Stow chama essa riqueza de “um acidente da geologia”.
Um acidente similar ocorreu quando a África e a América do Sul lentamente se separaram no Período Cretáceo, formando o estreito início do Atlântico Sul. Dos grandes rios jorravam nutrientes, e o frenesi biológico ocorrido nas costas ocidentais do estreito oceano acabou formando os vastos campos de petróleo que agora estão sendo descobertos e explorados em águas profundas no Brasil.
Em junho, a Petrobras, a estatal brasileira do petróleo, divulgou um plano de investimento de cinco anos, no valor de US$ 224 bilhões, para explorar campos em águas profundas e dobrar sua produção de petróleo.
Muitos países e empresas petrolíferas estão agora correndo para explorar a oportunidade geológica das águas costeiras profundas. Entre as principais áreas em alto-mar estão Angola, Azerbaijão, Congo, Cuba, Egito, Líbia e Tanzânia, enquanto países como Canadá e Noruega, que já perfuram em alto-mar há um bom tempo, estão apresentando novos planos. A consultoria ‘Cambridge Energy Research Associates’ estima que a extração global em águas profundas poderá praticamente dobrar até 2015, com a produção concorrendo com o que a Arábia Saudita produz em terra.
“Isso não tem a ver com dinossauros”, disse Kenneth E. Peters, geoquímico do petróleo da Universidade de Standford. “Qualquer tipo de material orgânico pode contribuir, sem dúvida. Mas se você olhar para a cadeia alimentar, eles estão no topo. São os pequenos que têm importância.”
FONTE: escrito por William J. Broad e publicado no, ”The New York Times” e no blog “Fatos e Dados”, da Petrobras (http://www.blogspetrobras.com.br/fatosedados/?page_id=26977).
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