quinta-feira, 9 de junho de 2011

EUA APOIARAM DITADURAS, COM PÉ ATRÁS


“A Casa Branca temia que regimes latino-americanos se unissem contra ela, segundo papéis entregues à Justiça argentina. Arquivos da ‘Operação Condor’ consultados pela ‘Folha’ mostram que Washington quis influir nos governos da região.

Por Lucas Ferraz, na Folha de São Paulo

Confusos sobre a ‘Operação Condor’ [que teriam estimulado e coordenado], aliança de ditaduras do Cone Sul, os EUA tentaram coordenar a troca de informações de inteligência entre os países da região.

O objetivo era controlar a operação engendrada, nos anos 1970, para capturar e matar opositores.

Ao mesmo tempo em que [estimulava, mas fingia que somente] tolerava as ações dos militares latino-americanos, Washington queria [parecer] "exercer moderada influência" entre eles, segundo documentos do Departamento de Estado americano a que a ‘Folha’ teve acesso.

"Devemos trabalhar na troca sistemática de nível médio, algo mais que o intercâmbio de informações sobre terroristas", diz um informe de agosto de 1976, elaborado por Harry Shlaudeman, então responsável pela América Latina no Departamento de Estado [dos EUA].

"Nossa embaixada em La Paz tem recomendado que troquemos informes de inteligência com os bolivianos. Isso pode proporcionar um caminho até os suspeitos militares e trabalhar contra a síndrome deles de Terceira Guerra Mundial."

Segundo os americanos, era preciso atuar para mostrar às ditaduras da América Latina que o combate à subversão e ao comunismo não configurava uma nova guerra mundial, como os militares imaginavam.

"Talvez possamos convencê-los de que uma Terceira Guerra é indesejável", conclui Shlaudeman, que foi embaixador no Brasil.

Sobre o trabalho de coordenar informações da Operação Condor, há um alerta: é arriscado, diz o Departamento de Estado, pois os países poderiam concluir que os EUA estariam desinformados ou "não cooperativos".

Washington também temia que a aliança originasse um bloco dos países sul-americanos com a finalidade de atuar politicamente contra os interesses americanos.

Os documentos sobre a operação foram enviados à Justiça argentina por Peter Kornbluh. Historiador do “National Security Archive”, instituição não governamental norte-americana, Kornbluh é um dos maiores especialistas em Operação Condor.

CONTRADIÇÃO

A CIA, agência de inteligência americana, “descobre” [Oh! Surpresa!...] a existência da 'Condor' em julho de 1976. Ela fora criada meses antes, em novembro de 1975, numa reunião em Santiago entre oficiais de Chile, Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai e Bolívia.

Em uma década, 30 mil pessoas foram torturadas e mortas pela operação, inclusive líderes civis exilados sob a proteção da ONU.

O “National Security Archive” descobriu, no ano passado, um telegrama assinado por Henry Kissinger, em setembro de 76, em que ele pede a Shlaudeman para não tomar "nenhuma iniciativa" contra os assassinatos das ditaduras sul-americanas. A postura contraria uma decisão anterior do próprio Kissinger.

Dias depois, o ex-chanceler chileno Orlando Letelier foi morto num atentado a bomba em Washington, a metros da Casa Branca. O episódio elimina a ambiguidade dos EUA, que passam a condenar a aliança [fugira ao seu total controle?].

DESCONFIANÇA DITAVA LIGAÇÃO COM OS PAÍSES DA REGIÃO

Apesar do apoio americano a quase todos os golpes de Estado na América Latina nos anos 60 e 70, a relação da Casa Branca com as ditaduras sempre foi marcada pela desconfiança.

No caso brasileiro, a evidência foi a assinatura de um acordo nuclear com a Alemanha, em 1975. Os Estados Unidos tentaram impedir a realização do tratado.

Nos documentos da Operação Condor, o setor de inteligência do Departamento de Estado relata a preocupação de que os países do Cone Sul atuassem politicamente em bloco [da mesma maneira, hoje são contra o Mercosul].

O Brasil é o único que pode exercer essa liderança, diz trecho do documento intitulado "Cone Sul - Bloco em Formação?", elaborado no primeiro ano (1977) do governo Jimmy Carter.

"O país é a potência econômica da região e o único com legítimas pretensões de exercer influência extra-hemisfério", afirma o texto.

Ao radiografar a América do Sul e criticar principalmente a brutalidade das ditaduras do Chile e da Argentina, a Casa Branca afirma que eventual bloco atuaria contra a “nova política norte-americana na área de direitos humanos” [que continuou a ser posta em prática em Guantánamo, Abh Ghraib etc].

Mas ressalta: a unidade desses países poderia ser comprometida por "rivalidades históricas" e por disputas fronteiriças, como de fato ocorreu.

Em 1978, um ano depois da elaboração do documento, a Argentina e o Chile quase entraram em guerra, motivados por disputa em torno do canal de Beagle, na Patagônia.”

FONTE: escrito por Lucas Ferraz, na Folha de São Paulo. Transcrito no site “DefesaNet”  (http://www.defesanet.com.br/geopolitica/noticia/1338/EUA-apoiaram-ditaduras-com-pe-atras) [imagem do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog].

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