segunda-feira, 9 de agosto de 2010

"DÉJÁ-VU" NO IRAQUE


Na opinião de Robert K. Brigham, pesquisador norte-americano autor de “O Iraque é outro Vietnã?”, “mais uma vez o país está engajado em uma guerra de fronteiras nebulosas, sem uma estratégia clara de saída, sem uma boa definição de o que seja a vitória.

Larissa Ramina

O Presidente Barack Obama acaba de determinar a retirada do exército norte-americano do Iraque em 31 de agosto próximo. Todavia, 50.000 soldados continuarão naquele país até final de 2011 sem participar de operações de combate.

Muitos especialistas têm comentado a sensação de déjá-vu na guerra dos EUA no Iraque, referindo-se à guerra do Vietnã. Apesar de todas as diferenças, há de fato semelhanças desde os motivos da invasão.

No Iraque, a suposta posse de armas de destruição em massa, argumento rejeitado pela ONU e hoje reconhecido falso pelo próprio arquiteto da agressão, G. W. Bush, bem como a intenção de “instaurar a democracia naquele país” foram pretextos empregados para encobrir a verdadeira motivação do conflito: garantir a supremacia de Israel no Oriente Médio e o controle do petróleo iraquiano.

No Vietnã, o ataque ao navio Maddox pelos comunistas do Norte no Golfo de Tonquim é considerado por muitos estudiosos como evento de menor importância, se não forjado pela CIA. O fato é que, já há algum tempo os EUA armavam, treinavam e financiavam o Vietnã do Sul pró-capitalista para a resistência ao comunismo na Ásia, conforme a “teoria dos dominós”.

Assim como no Vietnã, os EUA chegaram ao Iraque subestimando a capacidade de resistência da população local, apesar de sua supremacia bélica. Na opinião de Robert K. Brigham, pesquisador norte-americano autor de “O Iraque é outro Vietnã?”, “mais uma vez o país está engajado em uma guerra de fronteiras nebulosas, sem uma estratégia clara de saída, sem uma boa definição de o que seja a vitória, sem o aval da ONU, com pouco apoio de aliados, custos cada vez mais altos e uma crescente insatisfação popular”.

Os EUA, por óbvio, não estão deixando o Iraque por se considerarem vencedores da guerra, em relação aos objetivos hegemônicos na região e à imposição da democracia.

A ordem de finalizar as operações militares chega num momento em que aquele país vive grande incerteza política e institucional, uma vez que, quase meio ano após a realização de eleições parlamentares, as diferentes facções políticas ainda não conseguiram acordo para a formação de um governo efetivo. O próprio presidente Barack Obama tratou de explicar que o sacrifício no Iraque não terminou, apenas passou de um esforço militar para um esforço civil conduzido por diplomatas.

De mais a mais, alguns dados apontam que o mês de julho foi o pior dos últimos dois anos em número de mortes, muito embora o ex-presidente George Bush tenha declarado, um mês e meio após o início da guerra, que a missão no Iraque estava “cumprida”...

Por outro lado, o deslocamento das tropas em direção ao Afeganistão indica, mais provavelmente, o desgaste militar e político de uma guerra considerada pela opinião pública como “injusta”. A guerra do Afeganistão, ao contrário, é considerada “justa” por ter sido motivada na eliminação de Osama Bin Laden e da Al Qaeda, supostos responsáveis pelos atentados de 11 de setembro. No Vietnã, em uma época em que ficava clara a hostilidade da opinião pública norte-americana ao conflito, também devido à divulgação de fotos e documentos na mídia, discurso de Nixon de 1969 resumia a nova estratégia da Casa Branca de “vietnamização” do conflito, sendo que os EUA aportariam ajuda financeira às nações decididas a assumir a responsabilidade no suprimento de homens para sua própria defesa.

O escândalo de “Watergate”, no entanto, impossibilitaria politicamente qualquer suporte à Nixon. No caso do Iraque, talvez as informações sigilosas sobre as operações militares no Afeganistão reveladas pelo site WikiLeaks tenham apressado a decisão de Barack Obama.

No Vietnã, os acordos de Paris de 1973 estabeleceram o prazo de 60 dias para que os EUA retirassem suas tropas, sendo que o futuro do país seria preparado por um “conselho nacional de reconciliação”. Esses acordos, porém, não puseram fim à guerra e seriam constantemente violados nos próximos dois anos.

Guerra, segundo os pensamentos ocidental de Carl von Clausewitz e oriental de Sun-Tzu, é o confronto entre duas vontades. Os EUA lutaram ao lado do Vietnã do Sul, capitalista, contra o Vietnã do Norte, comunista. O Norte impôs sua vontade em 1975, quando os últimos norte-americanos abandonaram o país às pressas. Historiadores importantes registrariam a vitória dos vietcongs contra os norte-americanos.

No Iraque, o desfecho ainda está por ser escrito. Todavia fica, por enquanto, a mesma sensação de derrota estadunidense que pairou na Indochina nos idos de 1975.”

FONTE: escrito por Larissa Ramina, Doutora em Direito Internacional pela USP e Professora da UniBrasil e da UniCuritiba. Publicado no site “Carta Maior” [imagem colocada por este blog].

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