sexta-feira, 27 de setembro de 2013

“Wikileaks”: EUA FAZEM VALER A LEI DELES NO BRASIL


Assange: “PRIVACIDADE E INTERNET ESTÃO CADA VEZ MAIS EM RISCO”

“Julian Assange participou através de videoconferência de um debate no Brasil. Para ele, com a internet derrubando as fronteiras entre os países, uma série de questões, em especial de natureza legal, surge. E por isso mesmo, Assange afirma que, hoje, o Brasil está submetido a leis estadunidenses.

Por Rodrigo Mendes

Aconteceu na quarta-feira (18), no “Centro Cultural São Paulo”, o ciclo de debates “Liberdade, privacidade e o futuro da internet”, que culminou com a participação do fundador do “Wikileaks”, Julian Assange. Mesmo que a participação de Assange estivesse agendada para acontecer, via internet, apenas às 19h30 da noite, a partir das 14h o auditório já estava lotado, sinal de que o tema é alvo de muita curiosidade e preocupação.

E já de cara, durante a primeira mesa, que tinha como tema “Arquitetura e Governança na Internet”, a preocupação ficou ainda maior. Os debatedores, Tereza Cristina Carvalho, professora da Escola Politécnica da USP, e Sérgio Amadeu, professor da UFABC e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil.

Tereza Cristina foi taxativa ao afirmar que “nossa privacidade já se foi faz tempo” e que “precisamos governar nossa própria rede, nossa própria vida”. Sérgio Amadeu tocou em pontos sensíveis, como a proposta de Marco Civil da internet que tramita atualmente no Congresso e que, segundo ele, foi construída pela sociedade. Ambas as falas trouxeram diversos elementos de alerta, de que a internet, hoje um espaço ainda livre, corre sérios riscos de se tornar cada vez mais ditatorial.

Julian Assange falou diretamente da embaixada do Equador em Londres, de onde está impedido de sair desde junho de 2012. Com a internet derrubando as fronteiras entre os países, uma série de questões, em especial de natureza legal, surge. E, por isso mesmo, Assange afirma que, hoje, o Brasil está submetido a leis estadunidenses. Para ele, os EUA fazem valer a lei deles no território brasileiro.

Esse foi outro ponto que perpassou todos os debates, o fato de os EUA usarem a “desculpa” do combate ao terrorismo, em especial o seu “Patriot Act”, promulgado depois do 11 de setembro de 2001, para espionar todo tipo de gente, no mundo todo. O problema é que isso se transformou em espionagem industrial, e como disseram vários dos participantes, os EUA usam as informações coletadas para dar vantagens econômicas às suas empresas no mercado mundial.

Para Assange, estamos vivendo um colapso do estado democrático de direito e dos direitos humanos. Além da vigilância massiva, há inúmeros casos de violações de tratados internacionais, crimes contra a humanidade, todos cometidos pelos EUA e aliados, em nome do “combate ao terror” [como espionar a Presidente do Brasil e a Petrobras].

Demonstrando conhecimento sobre o Brasil e a América Latina, Assange explicou que quase toda a comunicação eletrônica daqui passa pelos EUA. Por outro lado, ele exaltou a comunicação eletrônica, dizendo que é graças a ela que ele estava participando daquele debate.”

FONTE: reportagem de Rodrigo Mendes publicada no site “Carta Maior”  (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22734)

COMPLEMENTAÇÃO

"ESTAMOS MEXENDO COM O PODER CENTRAL", AFIRMA JULIAN ASSANGE


Por Deborah Moreira, da Redação do portal “Vermelho” 



Público de 700 pessoas lotou o auditório do Centro Cultural Vergueiro

Quando vemos todo o esforço deles em nos espionar, em nos perseguir após essas revelações, como as feitas por Eduard Snowden, isso demonstra que é algo de fato importante para eles [EUA], significa que estamos mexendo com o poder central deles. Precisamos prestar atenção a esses sinais.” A declaração é do jornalista Julian Assange, um dos fundadores do site “Wikileaks”, feita a uma plateia de 700 pessoas presentes na Sala Adoniran Barbosa do Centro Cultural São Paulo, na capital paulista.

O ciberativista foi a atração principal do “Seminário Liberdade, Privacidade e o Futuro da Internet”, promovido pela Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo e Boitempo Editorial, com apoio da Agência Pública, na noite de quarta-feira (18). A atividade, que começou às 14 horas e teve três mesas de debate no total, também foi transmitida pela internet pelo site do Centro Cultural.

Assange também comentou as denúncias de espionagem trazidas à tona por Eduard Snowden, ex-analista de inteligência da agência de segurança americana, a NSA, que vazou documentos que comprovam que o governo brasileiro e a Petrobras foram alvos dos arapongas estadunidenses.

A presidenta Dilma tinha mesmo que cancelar essa reunião com os Estados Unidos. Inicialmente, ela preferiu não cancelar. Mas, depois, ela olhou para o povo brasileiro e viu que, se não tomasse essa atitude de cancelar, poderia enfraquecer seu governo e o povo, porque esse tipo de situação cria um mercado político. Decisões simbólicas [como essa] são importantes para proteger as pessoas. E Dilma, como presidenta, tem a obrigação de proteger o povo brasileiro”, disse Assange, que emendou: “Eu, que sou um editor australiano e fui alvo dos Estados Unidos e fiz algo fora dos Estados Unidos, fui alvo por isso. Então, devemos nos perguntar: e vocês que estão aí me assistindo, também podem ser alvo dos EUA? Os Estados Unidos estão assumindo o controle e vocês, brasileiros, estão sendo invadidos por uma jurisdição, uma jurisdição que está fazendo valer a sua lei no estrangeiro".

Para Julian Assange, o mundo ocidental vive um colapso do Estado de Direito com a vigilância e espionagem. De acordo com o jornalista australiano, o presidente Barack Obama tem se mostrado o presidente daquele país que mais se apoiou na lei de espionagem para perseguir e denunciar profissionais da imprensa e quem mais contrariar os interesses imperialistas: "Obama perseguiu mais denunciantes sob essa lei da espionagem do que o dobro da soma dos outros presidentes. Isso não é apenas uma alteração do comportamento da vigilância sobre jornalistas, e sobre outras pessoas. Não se trata só disso. A administração de Barack Obama está se tornando uma força perigosa no Ocidente e demonstrando que o colapso está atingindo princípios básicos”. 





Sobre quais perspectivas ele tem para o futuro, diante do fato de estar asilado na embaixada do Equador em Londres, Assange simplesmente disse: “Em relação à minha própria situação, não é algo que tenho pensado muito nesses últimos meses. Vamos dizer que se encontre uma solução, em que mundo eu vou entrar quando sair daqui? Em um mundo que está se direcionando para uma distopia, vou entrar em um mundo agressivo contra o “Wikileaks”, contra meus amigos. E, diante disso, há algo mais importante do que a liberdade de Julian Assange. É muito difícil ficar 500 dias numa embaixada, mas é um luxo, ao contrário de vocês que estão aí, eu não posso ser preso. É o lugar mais seguro do mundo para Julian Assange”, disse.

Perguntado sobre o que nós podemos fazer como sociedade civil organizada, ele disse que, em primeiro lugar, é preciso entender o que está acontecendo exatamente e de que forma essas ações de vigilância na internet podem impactar nossas vidas. Para o ativista, plataformas como Gmail e Facebook são extremamente inseguras e que é preciso criar alternativas como sites próprios brasileiros. "Eu entendo o que é o Facebook, o Google e o que essas instituições fazem por nós. Mas se vou fazer parte de um grupo ativista, se vou ser jornalista, preciso tomar as precauções necessárias", aconselhou o autor do livro “Cyberpunks”, lançado recentemente no Brasil pela “Boitempo”, que conta e reflete a batalha em defesa da liberdade no ciberespaço.

VIGILÂNCIA E PRIVACIDADE NA REDE



Como garantir a privacidade em um cenário de vigilância e quais os impactos para a cultura digital? Esse foi o tema da segunda mesa de debate do evento, que contou com a presença de especialistas como Silvio Rhatto, pesquisador independente de tecnologias digitais de armazenamento e transmissão segura de dados, que alertou que, quando se trata de espionagem, os sistemas de comunicação são inevitavelmente inseguros tendo em vista a lógica dos arapongas é grampear tudo e todos. O ativista da privacidade e da comunicação segura explicou que atualmente mais do que proteger os dados, é preciso proteger os metadados, que são os dados de quem está circulando a informação. “Os metadados são o envelope da informação [onde tem o nome e endereço da correspondência de quem e para onde]. Com essas informações, outras tantas estão sendo criadas por empresas na construção do que chamamos de gráfico social ou gráfico de rede. Atualmente, existem aplicações de controle social muito sofisticadas, com finalidade de polícia”, disse.

Para proteger as informações e metadados, existem ferramentas que já são utilizadas, como o “Tor Project”, um software que permite navegar de forma anônima a partir da criptografia, escondendo seu endereço de IP (identificação do seu computador) e do servidor que você está acessando. Desenvolvido pela Marinha norte-americana na década de 1970, atualmente é sustentado pela ONG “Tor Project” e apoiado por entidades como a “Electronic Frontier Foundation” (EFF) e “Human Rights Watch”, e por empresas como o “Google”.

No entanto, até mesmo o “Tor” está sendo alvo de suspeitas por ter sido criado pela Marinha norte-americana e por outro problema maior: os “backdoors”, que são uma espécie de porta dos fundos criada por softwares e hardwares que deixam um caminho de invasão, sem despertar suspeitas do usuário. “As revelações do Snowden demonstram que esses ‘backdoors’ podem estar inseridos nos equipamentos que compramos. Os ‘backdoors’ podem estar em softwares, hardwares e até nos protocolos”, revelou.

Também participaram da mesa Marta Kanashiro (pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo [Labjor] e professora plena do Programa de Pós-Graduação em Divulgação Científica e Cultural do Labjor) e Gisele Beiguelman (professora da FAU-USP, midiartista e curadora, pesquisadora na área de História da Arte sobre usos críticos de mídias e editora da revista “Select”). Ao final, o público foi convidado a debater o tema com os especialistas.

PELA PORTA DOS FUNDOS

O professor Sergio Amadeu, da Universidade Federal do ABC, e pesquisador das relações entre comunicação e tecnologia, práticas colaborativas na internet e a teoria da propriedade dos bens imateriais, que participou da mesa anterior, sobre arquitetura e governança na internet, também fez um alerta para os “backdoors” e para os contratos que ‘assinamos’ com empresas como a Microsoft, sem tomar conhecimento do que estamos autorizando fazer com nossos dados. “A Microsoft pode passar as nossas informações para seus clientes porque nós os autorizamos. E quem são esses clientes?”, indagou Sergio Amadeu.

Como solução, tanto Sergio, que também integra o “Comitê Gestor da Internet” no Brasil, quanto os demais que integraram as mesas de debate, defenderam a adoção de softwares livres, principalmente pelo governo brasileiro. Já para garantir a liberdade de expressão na rede, Amadeu lembrou que tramita na Câmara o Projeto de Lei que institui o “Marco Civil da Internet”. “Eu sou a favor do ‘Marco Civil da Internet’ que garanta a neutralidade e a liberdade de expressão. Agora, estão querendo alterar o texto em benefício de empresas de telecomunicação. E se isso ocorrer, eu vou ser contra o ‘Marco Civil’. Por isso, temos que defender o texto original do Marco Civil”, afirmou Sergio Amadeu.”

FONTE da complementação: reportagem de Deborah Moreira, da redação do portal “Vermelho”  (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=224478&id_secao=1).

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