domingo, 15 de agosto de 2010

MANIPULAÇÃO PELA MÍDIA: AZENHA CONTA COMO, EM 2006, A GLOBO AJUDOU A PROVOCAR O SEGUNDO TURNO

Do “Viomundo”:

2006: COMO A GLOBO AJUDOU A LEVAR PARA O SEGUNDO TURNO

Por Luiz Carlos Azenha

“O texto abaixo trará apenas uma novidade (considerável) para os leitores habituais do site.

Mas é importante repetir a história, especialmente para os leitores que chegam agora.

Em 2006 eu era repórter especial da TV Globo baseado em São Paulo. Fui escalado para cobrir as eleições presidenciais. Foi minha primeira experiência no gênero. Fui destacado para acompanhar o candidato Geraldo Alckmin.

Mas antes, durante as denúncias que pipocaram por causa do mensalão, comprovei em Goiás caixa dois do PT. O assunto foi parar em Brasília. Na hora agá, o denunciado abriu os arquivos e disse que tinha dado dinheiro a todos os partidos. A partir daí, o assunto morreu.

O incômodo que eu e muitos colegas sentimos nasceu mesmo na campanha. Eu friso muitos porque a Globo quis fazer parecer que eram apenas dois gatos pingados. Na minha contabilidade, pelo menos dez profissionais da emissora demonstraram abertamente que estavam alarmados com o andamento da cobertura.

Conversávamos abertamente a respeito, na redação.

Como jornalistas experientes, sabíamos detectar as nuances na cobertura da emissora:

1. Marco Aurélio Mello, editor de Economia do Jornal Nacional, nos contou que tinha recebido ordens do Rio para “tirar o pé” das reportagens econômicas que poderiam ser vistas como positivas para Lula, que buscava a reeleição;

2. Alexandre Garcia, comentarista de Brasília, começou a aparecer em programas de entretenimento para fazer análises eleitorais;

3. Todos os sábados, o Jornal Nacional repercutia as capas com denúncias da revista Veja ao governo, sem checar se as informações eram ou não verídicas;

4. Nos 50 segundos diários de cada candidato, muitas vezes a emissora repercutia as denúncias que havia apresentado contra o governo. Assim, eram três candidatos (150 segundos) pedindos explicações ou fazendo acusações ao governo (Geraldo Alckmin, Heloisa Helena e Cristovam Buarque) e 50 segundos de “defesa”.

5. Só entravam no ar denúncias contra o governo, o que levou o repórter Carlos Dornelles a fazer um protesto público. Colegas se reuniram para pedir isonomia ao editor regional de São Paulo. Como resultado do protesto, fui encarregado de fazer uma reportagem sobre o escândalo das ambulâncias, que envolvia aliados do candidato ao governo paulista, José Serra. A reportagem nunca foi ao ar. Esse caso eu contei [ver transcrição abaixo].

6. Na semana do primeiro turno, a Globo bombou no ar as denúncias que envolviam o candidato do PT ao governo de Pernambuco, o ex-ministro da Saúde Humberto Costa, mas escondeu que aliados de José Serra estavam envolvidos no mesmo escândalo.

Aqui, a novidade: diante de tal descalabro, um colega chegou a ligar para o então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para denunciar que a Globo se empenhava em levar a eleição para o segundo turno.

E a Globo ajudou a levar, com a colaboração dos aloprados petistas, do delegado Edmilson Bruno e por causa da ausência do candidato Lula no debate final da emissora.

A diferença entre 2006 e 2010 é que naquela época éramos dez pessoas denunciando o descalabro, de dentro. Agora, alguns milhares já são capazes de perceber a manipulação apenas assistindo TV.

Curiosamente, em 2010, Ali Kamel não terceirizou o golpe. Pretende aplicá-lo apenas com a ajuda do mais alto escalão, no qual se inclui William Bonner.”

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17 de fevereiro de 2009:

O QUE EU PRETENDIA DIZER NA TV SOBRE AS AMBULÂNCIAS DE SERRA


por Luiz Carlos Azenha

“Tenho o costume de guardar os cadernos de anotação que uso durante as reportagens. Faço isso pelo gosto de, anos depois, relembrar episódios da carreira. Outro dia trombei com um caderno dos tempos da Globo de São Paulo. Mais especificamente, do período eleitoral de 2006.

Como vocês devem saber, naquele período vários profissionais da emissora chegaram a se reunir com o chefe local, um sujeito tosco e sonso, para reclamar da cobertura política. Era consenso entre esses profissionais, alguns dos quais continuam na emissora, que a Globo estava mobilizando recursos para investigar escândalos ligados ao governo Lula, enquanto suprimia informações que poderiam ser comprometedoras para o PSDB e, especificamente, José Serra.

Embora eu não tenha participado da reunião mencionada acima, coube a mim a tarefa de colocar em pé uma reportagem sobre o escândalo das ambulâncias. A Globo não pagou nem mesmo para que eu ou algum outro profissional fosse a Piracicaba para ouvir personagens ligados ao caso. A tarefa coube a uma produtora, que fez o trabalho por telefone. Levantamos as informações. A reportagem foi editada. E transmitida para o Rio de Janeiro. Os chefes paulistas aparentemente acreditavam que ela seria colocada no ar.

Foi parar na gaveta. Curiosamente, foi uma das raras ocasiões em que escrevi o texto em meu caderno de anotações, antes de registrá-lo no computador da redação.

No caderno, rascunhei o texto:

“O churrasco do fim-de-semana foi em comemoração aos 19 anos da Construtora Concivi. Só que o patrão Abel Pereira não apareceu na festa. Na casa dele, em Piracicaba, ninguém respondeu à campainha. Chamadas para o celular caem na caixa postal. Em outra construtora de Abel o funcionário diz que não sabe onde ele está.

Abel está desaparecido desde que seu nome foi citado por Luiz Antonio Vedoin, o dono da Planam. Vedoin disse que Abel era o encarregado de liberar recursos do orçamento para a compra de ambulâncias.

A Polícia Federal está examinando as anotações encontradas no dossiê preparado por Vedoin.

Nos papéis aparece a lista de prefeituras, o número das emendas dos parlamentares e o preço das ambulâncias.

Aparece também a anotação de 6,5% que segundo Vedoin era a propina paga a Abel Pereira depois que o dinheiro era liberado.

Segundo Vedoin, Abel garantia a liberação de recursos no Ministério da Saúde através do então secretário-executivo Barjas Negri.

Negri tornou-se Ministro da Saúde [governo FHC/PSDB/DEM] quando José Serra se afastou para concorrer à presidência em 2002. Hoje é prefeito de Piracicaba, onde o empresário Abel Pereira tocou 35 obras públicas nos últimos dois anos. A Câmara Municipal da cidade queria investigar as concorrências vencidas pelo empresário, mas a proposta foi derrotada pelos vereadores que apóiam o prefeito Barjas Negri.

O empresário Abel e o atual prefeito de Piracicaba ainda não foram ouvidos pela Polícia Federal. Segundo a CPI das Sanguessugas, a Planam forneceu 891 ambulâncias a municípios brasileiros. Setenta por cento delas foram entregues entre 2000 e 2002, período em que, segundo Vedoin, Abel Pereira atuava no Ministério da Saúde.”

Presumo que a informação crucial, que a Globo não topou transmitir ao público, estava na última frase: embora o escândalo tenha sido colocado inicialmente nas costas do governo Lula, 70% das ambulâncias superfaturadas foram entregues durante o período que a Globo eufemisticamente dizia ser o do “governo anterior”. Traduzindo, do PSDB, de Fernando Henrique Cardoso e de José Serra.”

FONTE: escrito por Luiz Carlos Azenha em seu portal “Viomundo” e republicado por Rodrigo Vianna no blog “Escrivinhador” http://www.rodrigovianna.com.br/outras-palavras/2006-como-a-globo-ajudou-a-levar-para-o-segundo-turno.html#more-2633.

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