terça-feira, 26 de abril de 2011

DOCUMENTOS REVELAM LIGAÇÕES ENTRE PETROLÍFERAS E GUERRA NO IRAQUE


“As mentiras de Tony Blair se rivalizam com as de George Bush. Documentos do governo [britânico] revelam que foram discutidos planos de exploração das reservas de petróleo do Iraque entre ministros do governo britânico e as maiores companhias petrolíferas mundiais no ano anterior ao da invasão do Iraque, em que a Grã-Bretanha desempenhou papel de destaque.

Por Paul Bignell

Os documentos, revelados pela primeira vez, levantam novas questões sobre o envolvimento da Grã-Bretanha na guerra, as quais dividiram o governo de Tony Blair e que apenas foi votado após as alegações de que "Saddam Hussein tinha armas de destruição massiva" [sic].

Minutas de uma série de encontros entre ministros e executivos de petrolíferas contradizem a negação de interesse das companhias petrolíferas e de governos ocidentais da época.

Os documentos não foram apresentados como prova no inquérito Chilcot em curso sobre o envolvimento do Reino Unido na guerra do Iraque. Em março de 2003, pouco antes de a Grã-Bretanha entrar em guerra, a Shell denunciou as informações sobre conversações na Downing Street relativamente ao petróleo do Iraque como “altamente inexatas”. A BP negou que tivesse qualquer “interesse estratégico” no Iraque, enquanto Tony Blair se referiu à “teoria da conspiração do petróleo” como “completamente absurda”.

Porém, documentos de outubro e novembro do ano anterior traçam um quadro bem diferente.

Cinco meses antes da invasão do Iraque em 2003, a baronesa Symons, então ministra do Comércio, disse à BP que o governo pensava que deveria ser concedida às empresas de energia britânicas uma parte das enormes reservas de petróleo e gás, como recompensa pelo empenho militar de Tony Blair nos planos americanos pela alteração do regime [iraquiano].

Os documentos mostram que Lady Symons concordou em fazer lobby junto do governo Bush a favor da BP, visto que a petrolífera temia ser “eliminada” dos acordos que Washington calmamente estabelecia entre os governos americano, francês e russo e as respectivas empresas de energia.

As minutas de um encontro com a BP, a Shell e a BG (anteriormente British Gas) em 31 de Outubro de 2002 referem: “A baronesa Symons concordou que seria difícil justificar que as companhias britânicas no Iraque perdessem dessa forma, quando o Reino Unido tinha sido, ele próprio, um claro apoiador do governo dos EUA ao longo da crise.”

O ministro prometeu, então, “dar conta às companhias, antes do Natal” relativamente aos esforços empreendidos.

O ‘Foreign Office’ convidou a BP, em 6 de novembro de 2002, para falar sobre as oportunidades no Iraque “após a mudança do regime”. As minutas referem: “O Iraque é o grande futuro no petróleo. A BP está desesperada para entrar e ansiosa que os acordos políticos possam recusar-lhe essa oportunidade.”

Depois de outro encontro, em outubro de 2002, o diretor do departamento do Médio Oriente no ‘Foreign Office’, Edward Chaplin, referiu: “A Shell e a BP não podiam tolerar não tomarem parte ativa no Iraque tendo em vista seu futuro a longo prazo… Estamos determinados a obter uma fatia aceitável da ação para as companhias do Reino Unido em um Iraque pós-Saddam.”

Enquanto a BP insistia em público que “não tinha interesse estratégico” no Iraque, dizia ao ‘Foreign Office’ que o Iraque era “mais importante do que tudo o que temos visto desde há muito”.

A BP estava preocupada com a possibilidade de Washington permitir que o contrato já existente entre a TotalFinaElf e Saddam Hussein se mantivesse após a invasão, o que faria do conglomerado francês a maior companhia petrolífera do mundo. A BP disse ao governo que pretendia assumir “riscos elevados” a fim de obter uma parte das reservas do Iraque, as segundas maiores do mundo.

Mais de mil documentos foram obtidos em cinco anos pelo especialista em petróleo Greg Muttitt. Eles revelam que houve, nos fins de 2002, pelo menos cinco reuniões entre civis, ministros e a BP e a Shell.

Os contratos há 20 anos assinados na sequência da invasão foram os maiores na história da indústria do petróleo. Cobriram metade das reservas do Iraque –60 mil milhões de barris de petróleo, comprados por companhias como a BP e a CNPC (China National Petroleum Company).

Na semana passada, o Iraque elevou a produção de petróleo ao nível mais elevado da última década, 2,7 milhões de barris por dia, valor especialmente importante neste momento dada a volatilidade da região e a queda da produção líbia. Muitos dos opositores da guerra suspeitaram que uma das principais ambições de Washington na invasão do Iraque foi garantir uma fonte de petróleo barata e abundante.

Muttitt, cujo livro “Fuel on Fire” será publicado na próxima semana, disse: “Antes da guerra, o governo insistiu longamente que não tinha qualquer interesse no petróleo do Iraque. Esses documentos fornecem a prova de que essa pretensão é mentira”.

Vemos que o petróleo constituía de fato uma das mais importantes considerações estratégicas do governo e que houve acordo secreto com companhias petrolíferas para lhes dar acesso a esse prêmio enorme.”

Lady Simons, de 59 anos, ocupou posteriormente o posto de consultora num banco comercial britânico que lucrou com os contratos de reconstrução do Iraque pós-guerra. No mês passado, ligou-se como consultora não-remunerada ao “National Economic Development Board” da Líbia depois de o Coronel Gaddafi começar a disparar contra os dissidentes. A BP e a Shell recusaram comentar.

NÃO ERA PELO PETRÓLEO? O QUE FOI DITO ANTES DA INVASÃO:

* Memorandum do Foreign Office, 13 de novembro de 2002, a seguir à reunião com a BP: “O Iraque é o grande futuro no petróleo. A BP está desesperada para entrar e ansiosa que os acordos políticos não lhe neguem a oportunidade de competir. O potencial a longo prazo é enorme…

* Tony Blair, 6 de fevereiro de 2003: “Deixem-me falar do assunto do petróleo porque… honestamente, a teoria da conspiração do petróleo é uma das mais absurdas quando a analisamos. O fato é que, se o petróleo do Iraque fosse a nossa preocupação, posso dizer que poderíamos, provavelmente, chegar amanhã a um acordo com Saddam em relação ao petróleo. Não é o petróleo que é a questão, são as ‘armas’…”

* BP, 12 de março de 2003: “Não temos qualquer interesse estratégico no Iraque. Se quem quer que chegue ao poder quiser envolvimento ocidental depois da guerra, caso haja guerra, o que sempre dissemos é que deverá ser a um mesmo nível de competitividade. Não forçamos de nenhuma forma o nosso envolvimento.”

* Lord Browne, então diretor executivo da BP, 12 de março de 2003: “Não é, nem na minha opinião, nem na da BP, uma guerra de petróleo. O Iraque é um produtor importante, mas deve decidir o que fazer com o seu patrimônio e o seu petróleo.”

* Shell, 12 de março de 2003, afirmou que as informações sobre ter discutido oportunidades para o petróleo com a ‘Downing Street’ eram “altamente inexatas”, acrescentado: “Nunca procuramos encontros com funcionários do governo britânico sobre a questão do Iraque. O assunto só surgiu durante as conversas nos encontros normais que temos de vez em quando com funcionários… Nunca pedimos ‘contratos’.”

FONTE: escrito por Paul Bignell do site português “ODiário.info”. Publicado originalmente no jornal britânico “The Independent” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=152616&id_secao=9) [imagem do Google adicionada por este blog].

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