segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

FGV: CRESCE O EMPREGO FORMAL


Cresce a formalização do trabalho no Brasil, diz estudo

De camelôs a donos de pequenas fábricas, microempresários estão regularizando sua situação

"Aos poucos a formalização avança no Brasil e reduz o universo dos trabalhadores informais que ganham a vida em casa ou nas ruas. É o que mostram dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo o pesquisador Marcelo Neri, do Centro de Pesquisas Sociais (CPS) da FGV, a parte da população na categoria empregador aumentou de 3.347.564 (2007) para 4.095.249 (2008), Em parte isso acontece pela pressão dos formalizados sobre os informais.

“Imagine o impacto do McDonald’’s na Rocinha na vida do vendedor de churrasquinho. Isso acontece em diferentes tipos de negócio”, analisa Neri.

Um dos empurrões para o crescimento das empresas formais foi a Lei do Microempreendedor Individual, em vigor desde junho. A previsão era que até dezembro se chegasse a 100 mil microempresários regularizados. Mas 2009 deve fechar com 110 mil, segundo previsão do Ministério do Desenvolvimento e do Sebrae. A adesão não foi maior porque nos primeiros meses o site para a regularização das empresas teve problemas.

EMPREENDEDORES

Outra peculiaridade de 2009 foi que pela primeira vez o número de empreendedores brasileiros por vocação superou os que procuraram ter o próprio negócio por necessidade, segundo pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM), que mede a taxa de empreendedorismo em vários países, inclusive no Brasil. A relação, que normalmente era de 50%, passou a ser de dois terços para aqueles com vocação contra um terço para os abrem um negócio por necessidade. O estudo é feito pelo Instituto Brasileiro da Qualidade e Produtividade (IBQP), com o apoio do Sebrae.

“Isso tem a ver com o aumento da escolaridade e com o contexto econômico, que permite um melhor planejamento dos negócios. Além disso, os brasileiros estão cada vez mais interessados em adquirir conhecimento antes de montar um negócio”, diz Ricardo Tortorella, superintendente do Sebrae de São Paulo.

Essas mudanças têm refletido também no índice de mortalidade das pequenas empresas. Há 10 anos, a cada 100 que abriam, 40 quebravam. Hoje a relação é de 27 para 100. Tortorella acredita que as micro e pequenas empresas foram as menos afetadas pela crise no último ano. Sem tradição exportadora, não sofreram com a retração no consumo internacional.

CHEGUEI LÁ

Aldir, empreendedor nato, deixou Itapipoca, no interior do Ceará, em 1992 com destino a São Paulo na esperança de retornar à cidade natal como um homem de negócios bem sucedido. Com nove anos ele já ajudava os pais que tinham uma banca de frutas na rua. Foi aí, como um ajudante de ambulante, que Aldir tomou gostou pelo trabalho nas ruas e viu a possibilidade daquele ser seu ganha-pão.

Hoje aos 36 anos, Francisco Aldir Pereira Teixeira espera voltar a Itapipoca com a mulher Francisca Ardilene Magalhães Teixeira, a Lena, em breve para rever a família e mostrar como a vida mudou nos 17 anos em que vive em São Paulo. Há cinco meses o casal abriu uma loja de bijuterias no centro da cidade. Pequena, mas tudo muito caprichado. Os dois revezam entre as compras e o atendimento à clientela, com a ajuda de duas funcionárias – registradas, segundo Aldir. Além disso, o ex-ambulante tem uma funcionária num pequeno box de bijuterias, também no centro, e dois funcionários que trabalham em sociedade nas ruas da cidade.

O começo, é claro, foi difícil. Quando chegou a São Paulo, Aldir trabalhou como garçom por seis meses. Ficou mais um período na cidade e teve mais algumas idas e vindas entre São Paulo e Itapipoca. Até que decidiu que precisaria insistir. No começo dividiu um pequeno quarto com outros quatro cearenses. Decidiu que seria ambulante e vendeu de tudo um pouco: bolsas, doces, cachorro-quente, óculos, cachecol e guarda-chuva. Ele nem se lembra de quantas vezes precisou fugir da fiscalização. “Tive muita sorte de conseguir escapar tantas vezes. Esse é o maior risco para os camelôs, perder a mercadoria para o rapa e ver todo o dinheiro investido ir embora”, conta.

Apesar das fugas da fiscalização, dos dias debaixo de chuva, do sol forte e de sofrer com o frio paulistano, Aldir persistiu. Quando chovia vendia guarda-chuva. No frio oferecia meia e cachecol. Assim conseguiu juntar dinheiro para alugar o box para vender bijuterias. Os negócios progrediram e ele montou a segunda loja. Hoje Aldir já fala em ter um terceiro ponto.

FALTA DE PREPARO

Mas nem todo mundo chega as mesmas conquistas que Aldir. Rosimeire Rodrigues, ex-moradora de rua, é camelô na rua São Bento, no centro de São Paulo, há dois anos. Vende chocolate e água. Quando surge algum produto da moda, como as pulseirinhas coloridas de borracha que virou febre entre as adolescentes, ela procura diversificar. Com o aumento da fiscalização da prefeitura e da polícia militar, ela já se acostumou com a rotina de fechar a caixa de chocolates, pegar o cavalete e se embrenhar no meio dos pedestres. É só ouvir “olha o rapa, olha o rapa” e ela desaparece.

Ela não tem ideia do que é capital de giro ou outros termos do mundo dos negócios. Sabe que precisa pagar o chocolate comprado em um atacado à vista, com dinheiro. Gasta por volta de R$ 27 na caixa grande, com 21 unidades. Vende um chocolate por R$ 2 e três por R$ 5. Rosemeire calcula que ganha por volta de R$ 100 por dia. Por enquanto, segundo ela, não sobrou dinheiro para luxos. Ela e o marido, que ajuda nos negócios, moram de aluguel.

Pela experiência de Alexandre Tadeu da Costa, Rosimeire teria de mudar o jeito de administrar os negócios se quisesse progredir como microempresária. Precisaria reinvestir os ganhos no negócio para crescer e com o tempo se formalizar. Foi o que o dono da Cacau Show fez.

PORTA EM PORTA

Costa virou empresário aos 17 anos. Inconformado por ter de trabalhar na família que se dividia entre vários negócios porta a porta, e ser tratado como “café-com-leite” por ser o caçula da família, ele decidiu partir para o próprio negócio. Pegou um catálogo de chocolates que a mãe guardava em casa e saiu pela vizinhança pegando encomendas para a Páscoa. Só esqueceu de checar na empresa se havia ovos de chocolate de todos os tamanhos.

Com a encomenda pela metade, teve a ideia de pegar US$ 500 emprestados com um tio e correu para um atacado que vendia chocolates. Conheceu Dona Cleuza, que se sensibilizou com o sufoco do jovem e se propôs a ajudá-lo a dar conta da encomenda. Os dois passaram mais de 24 horas na cozinha até conseguir atender a todos os pedidos. Assim surgiu a Cacau Show, a maior rede do ramo no Brasil, com 750 lojas e previsão de faturamento de RS$ 270 milhões em 2009 – 70% a mais do que em 2008.

“Sempre brinco que a minha faculdade foi a 25 de março. Tem gente com problema que se abate. Outros procuram uma saída. É assim que pode surgir um empreendedor. No sufoco, sem trabalho, ele compra a caixa de doce por R$ 10 e vende por R$ 20. O segredo é sempre reinvestir o ganho e pensar onde se quer chegar.”

Costa lembra que começar um negócio no Brasil não é fácil. Primeiro pela falta de capital para os informais. Além disso, a dificuldade em regularização da empresa. “Logo no início ouvi do Pedro Passos, da Natura, que seu eu quisesse ser grande, teria de ser formal. Foi o que fiz um ano depois de começar minha empresa.”

FONTE: reportagem de Paula Pacheco, publicada hoje (04/01) no "O Estado de São Paulo" e postada por Luis Favre em seu blog.

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